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Black Woman Who Left US For Russia To "Escape Racism" Beaten By New Neighbors
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Black Woman Who Left US For Russia To "Escape Racism" Beaten By New Neighbors
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Western governments claim to be models of democracy, and demonize their geopolitical adversaries as "authoritarian", but empirical evidence shows that the US...YouTube
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Uma postagem rápida sobre conteúdo que seria bom ter na comunidade NHINCQ+
Aviso: Este texto não é sobre isso ser todo o ativismo que precisa ser feito, ou sobre o que é necessário para tirar pessoas NHINCQ+ de situações precárias, e portanto não deve ser interpretado como tal. Também não é sobre chamar pessoas NHINCQ+ de preguiçosas por "não produzirem o suficiente". Cada pessoa sabe das próprias limitações.
Este texto é sobre o que pessoas que têm vontade de fazer mais conteúdo sobre a comunidade e não querem repetir o que já tem um monte de gente fazendo podem fazer. Sobre o que pessoas que, mesmo tendo como únicos recursos a internet, uma forma de produzir conteúdo e alguma experiência em fazer postagens em redes sociais, podem fazer.
Eu não vou cobrir questões como manter comunidades, fazer pesquisas, fazer artesanato ou socializar. Podem ser assuntos interessantes para outro dia, mas vai ser muita coisa se eu também focar nisso aqui.
Também gostaria de avisar que, embora existam pessoas que façam conteúdo para a internet e ganham dinheiro com isso (seja tal conteúdo textos, vídeos, podcasts, etc.), é muito pouco provável que você vá ganhar muito dinheiro produzindo conteúdo NHINCQ+ inclusivo/informativo. A maioria não quer saber de neolinguagem, de respeitar pessoas "de identidades estranhas", de aprender sobre a existência de mais de 2-4 orientações, etc.
Ou seja, se você precisa de dinheiro e acha que tem talento para fazer dinheiro pelo Twitch ou YouTube ou o que for, eu recomendo que ao menos você comece com assuntos que interessam mais pessoas.
Como "postagens", entenda-se qualquer coisa que pode ser postada na internet. Isso inclui textos como este, vídeos, áudios, histórias em quadrinhos, apresentações de slides, jogos, ou qualquer outra mídia que você preferir.
Conteúdo
Aqui estão algumas coisas que eu não vejo ninguém fazendo, ou, mesmo que haja alguém fazendo, acho que seria bom se houvessem mais pessoas fazendo:
- Listas de identidades NHINCQ+ extensas e com temas específicos. Os temas ajudam as pessoas a procurarem por uma postagem sobre o que estão questionando (ao invés de terem que pesquisar por listas gigantes que tem um monte de outras coisas misturadas), e sua extensão ajuda a trazer a ideia de que não é só uma ou outra opção que existe;
- Traduções de termos cunhados em outras línguas. É sério, tem muita coisa legal que demora pra eu conseguir achar/traduzir, e outras pessoas podem ter outros julgamentos sobre que identidades consideram legais/relevantes o suficiente para fazer;
- Conteúdo sobre experiências pessoais de identidades NHINCQ+ menos conhecidas;
- Conteúdo sobre experiências de pessoas que são NHINCQ+ e de mais de um grupo marginalizado (lésbica + intersexo, não-binárie + negre, homem trans + gay + assexual, bi + profissional do sexo, abro + mulher, aquileane + não-binárie, grisromântique + autista + gorde, etc.);
- Conteúdo sobre atrações além da romântica e da sexual serem importantes, tanto pela perspectiva de ter outras atrações sem ter estas, quanto pela perspectiva de não ter outras atrações e ter estas (além das muitas outras possibilidades);
- Postagens que reúnem várias perspectivas diferentes sobre como é ser de certa identidade NHINCQ+ (como What It's Like To Be ou mesmo Queer Undefined);
- Postagens similares às de jornais, que entrevistam pessoas por suas experiências mas que também dão a definição de termos e uma explicação mastigada sobre eles, só que feitas de forma inclusiva e respeitosa;
- Postagens que falam sobre tipos de discriminação que são mais específicos do que coisas que afetam praticamente toda a comunidade, ou grupos grandes dentro dela;
- Histórias NHINCQ+ que não se encaixam nos estereótipos respeitáveis de suas respectivas identidades (por exemplo, pessoas intersexo cuja variação intersexo não é relacionada com genitália, ou pessoas não-hétero que não possuem relacionamentos monogâmicos como seu objetivo de vida);
- Histórias com personagens que são de identidades NHINCQ+ menos conhecidas;
- Histórias que tratam a linguagem ideal para certas coisas como normal (como a utilização de artigo/pronome/final de palavra ao invés de pessoas não falarem sua linguagem, ou como tratar sáfica como um termo guarda-chuva comum ao invés de usar "lésbicas e mulheres bissexuais");
- Não é um tipo de conteúdo específico, mas é legal normalizar o uso de termos guarda-chuva que não são reducionistas, e também o uso de termos como exorsexismo, duaricismo, alossexismo, monossexismo, queermisia, heterossexismo, diadismo, etc. Estas palavras e outras precisam ser mais usadas; não dá pra chamar toda discriminação sofrida por pessoas NHINCQ+ de "homofobia e transfobia" ou mesmo de [identidade bem específica mesmo que a discriminação se aplique para casos mais gerais]misia pra sempre;
- Também não é um tipo de conteúdo específico, mas seria muito bom se pessoas treinassem usar algum conjunto neutro universal como linguagem neutra ao invés de usar o/ele/o (minha sugestão atual é usar e/elu/e, mas se quiser usar i/éli/i, i/ili/i, le/ile/e, le/élu/e, ê/elu/e, i/il/y ou outra coisa, vá em frente)!
O problema do alcance
Muito conteúdo NHINCQ+ inclusivo acaba só sendo repassado entre poucas pessoas. Motivos comuns para isso são julgamentos sobre o assunto ser desinteressante ou complexo demais.
Se você acha que consegue fazer conteúdo que não dê informações erradas em nome da simplicidade, mas que também seja acessível e interessante a quem é iniciante no assunto, você pode se concentrar nisso!
Algumas coisas que se encaixam nisso são:
- Histórias de ficção que sejam interessantes para quem não é das identidades inclusas, mas que ensinem alguma coisa sobre questões NHINCQ+;
- Postagens que tentam explicar conceitos básicos (ou talvez nem tão básicos) de forma mais mastigada, sejam eles relacionados com identidades ou com opressão;
- Postagens que envolvem histórias pessoais, mas que não contém muito vocabulário difícil de entender, e que assim aproximam pessoas que não conhecem o assunto de forma mais pessoal do que com postagens 100% informativas.
Formatos de conteúdo
Atualmente, grande parte da comunidade acaba se concentrando em redes sociais "onde todo mundo está". Embora estas sejam úteis para divulgar conteúdo, elas não são feitas para arquivar conteúdo mais permanente, e às vezes não são nem muito práticas em relação à leitura de todo o conteúdo (como textos no Twitter ou no Instagram).
Prefira publicar seu conteúdo mais importante em lugares que são menos misturados com coisas aleatórias (para ser mais fácil de achar), e que possuem sistemas que permitam que este conteúdo seja achado de forma relativamente fácil mesmo que bastante tempo tenha passado.
Por exemplo, se você posta uma sequência no Twitter, quanto mais tempo passar (e você postar mais), mais esta sequência vai ficar "enterrada" em seu perfil. E a função de busca não vai adiantar muito, porque mesmo que você use uma hashtag, dificilmente vai ser uma hashtag que foi usada poucas vezes.
Enquanto isso, quando você tem um blog (mesmo que seja um desses de graça fornecido pelo Dreamwidth, Tumblr, Blogger ou Wordpress), você geralmente tem categorias que vão servir para pessoas que querem procurar só em seu blog. Estas plataformas também facilitam que você tenha vários blogs, ou mesmo não parecem tão apropriadas para postar ou compartilhar qualquer pensamento passageiro ou meme como acontece em sites como Twitter e Facebook, o que também evita que tenha um monte de conteúdo aleatório até que visitantes consigam ler sobre informações importantes, caso você queira fazer esta separação.
Também tem a questão de pessoas diferentes preferirem acompanhar coisas de formas diferentes. Existem pouquíssimos blogs, canais de vídeo ou podcasts lusófonos inclusivos sobre questões NHINCQ+. Caso você se sinta à vontade, tente fazer coisas para estes formatos!
"Mas pra quê tudo isso?"
Muitas identidades/experiências são tratadas como teorias ou trollagem, e precisam ser humanizadas. Descrições de experiências ajudam mais do que só ter rótulos no perfil ou do que repassar definições.
Definições cruas também são importantes, para que pessoas possam achar algo que se identificam sem terem que questionar se são tanto daquela identidade quanto outras pessoas. Além disso, podem ser mais eficientes para quem só quer saber resumidamente o que algo significa.
De qualquer forma, muita gente sofre e/ou se isola por não existirem espaços inclusivos de suas identidades. Outras pessoas acabam tendo que esconder parte de suas identidades para não serem alvos de chacota em espaços "LGBT", que supostamente são seguros para cada pessoa viver a sua verdade.
Muita gente sofre a discriminação da sociedade em geral por não ser cis/hétero/perissexo e precisa passar por situações humilhantes ou desgastantes quando fala disso ou tenta usar recursos para pessoas "LGBT", por não ter as identidades certas.
Sentimentos de confusão e solidão que podem ocorrer quando alguém não tem vocabulário para descrever o que sente ou comunidade que entenda tais sentimentos também podem prejudicar a vida da pessoa.
Além de questões objetivamente negativas, tem a simples questão de pessoas de qualquer identidade merecerem a oportunidade de conhecer que rótulos podem usar e de saber que existem outras pessoas que passam pelas mesmas experiências.
Atração física e emocional
Como já coloquei em minha postagem sobre atração alternativa, me interessei pela ideia de que atrações (e, portanto, orientações) podem ser físicas ou emocionais.
Pelo que eu entendi, seria o seguinte:
Atrações físicas seriam as que são relacionadas com aparência e/ou com querer tocar a pessoa de certo modo. Ou seja, seriam centralizadas em volta de querer interagir com o corpo da outra pessoa.
Atração sexual (achar uma pessoa gostosa e/ou querer fazer sexo com ela) seria um tipo de atração física.
Atração sensual/sensorial (querer trocar carinho com alguém, podendo incluir nisso beijar e agarrar ou não, dependendo da pessoa) também.
E acredito que atração estética (achar uma pessoa bonita e gostar de olhar pra ela) também caberia aqui.
Enquanto isso, atrações emocionais seriam as relacionadas com querer proximidade emocional, interações faladas/escritas e/ou relacionamentos compromissados com alguém. Ou seja, seriam centralizadas em volta de querer interagir com a mente da outra pessoa.
Atração romântica, platônica e queerplatônica seriam assim atrações emocionais.
(A postagem sobre atração alternativa que mencionei também explica o que é atração platônica e queerplatônica, caso alguém tenha interesse em saber.)
O único problema que eu vejo em ver estas divisões como universais é que, assim como os tipos de atração em si, estas coisas não estão separadas para todo mundo.
Existe gente que vê coisas como beijar e andar de mãos dadas como parte de sua atração romântica, mesmo que sejam coisas físicas.
Atração alternativa é descrita como emocional, mas não vejo como não poderia ser uma mistura de atração sensual ou outra tipicamente física com platônica, queerplatônica ou outra tipicamente emocional.
Mas até aí também existe um problema em classificar atração romântica, sexual, etc. como separações universais que sempre funcionam da mesma forma.
Muitas pessoas não conseguem separar sua atração romântica da sexual. Para outras pessoas, talvez sua atração romântica e atração sexual contenham também elementos diferentes de atração sensual.
É legal ter modelos mais simplificados que separem na medida do possível todos os tipos de atração, mas é também necessária a informação de que essas separações e experiências não são universais.
Cada pessoa deve decidir por si quais tipos de atração consegue ou não sentir ou separar, quais são os tipos de atração que mais pesam em suas experiências, e quais rótulos de orientação vai usar baseando-se nisso. É também possível cunhar novas palavras para descrever tipos de atrações que não estejam sendo bem descritos pelos rótulos atuais.
No momento, não vejo mais dano em descrever atrações/orientações como físicas e/ou emocionais do que em dizer que atração sexual, romântica, platônica, estética, sensual/sensorial e alternativa são diferentes entre si. Estas categorias podem não ser úteis para todo mundo, mas para muita gente elas são.
Assim, ao invés de usar termos como "orientação sexual e/ou afetiva", podemos usar "orientações físicas e/ou emocionais relevantes". Caso haja a necessidade, exemplos de orientações diferentes podem ser dados (como assexual, gay, heterorromântique, bialternative, feminamórique, etc).
Dou esta sugestão porque, para algumas pessoas, é importante não dizer só orientação ou orientações. Porém, o uso de orientação sexual, de orientação sexual e romântica ou de orientação sexual e afetiva é excludente.
Talvez poucas pessoas, ou mesmo nenhuma pessoa, veja sua orientação estética ou de proteção como relevante a ponto de só se considerar heterodissidente por causa dela, ou a ponto de considerar que suas orientações destes tipos quebram as normas de atração da sociedade por si só.
Mas aroaces orientades consideram atrações além da sexual e da romântica relevante. Pessoas arromânticas de diversas orientações sexuais podem querer considerar sua atração queerplatônica ou alternativa relevante. Pessoas assexuais podem considerar atrações físicas além da sexual relevantes.
Não é o suficiente pensar que já são pessoas cuja orientação não pode ser descrita somente como hétero por serem assexuais/arromânticas, e que portanto outras orientações não precisam ser consideradas. Afinal, e quando se trata de incluir pessoas variorientadas em grupos baseados em ser lésbique, bi, gay, multi, sáfique, aquileane?
Ao dizer que alguém precisa ser bissexual para estar em um evento bi, isso exclui pessoas que não conseguem se considerar bissexuais, mesmo que historicamente a palavra não fosse restrita a uma orientação exclusivamente sexual. Os tempos mudam. Homossexual já também não é mais uma palavra sinônima de LGBTQIAPN+, mesmo que um dia tenha sido.
Talvez orientações físicas e/ou emocionais relevantes não seja uma explicação ou um termo guarda-chuva ideal, mas ainda é melhor do que as outras alternativas que tentam explicar melhor o que consiste em orientação.
Um guia introdutório para comunidades NHINCQ+ inclusivas
(NHINCQ+ é uma alternativa mais inclusiva a LGBTQIAPN+)
Este guia não está sendo feito para dizer que você precisa agir de certa maneira para conseguir se dar bem em um espaço inclusivo, ou que comunidades precisam ser assim para serem inclusivas.
Este guia tem apenas o objetivo de ensinar sobre alguns conceitos muito conhecidos dentro de várias comunidades inclusivas que giram em torno de justiça social (isto é, comunidades antiopressão), e de ajudar pessoas a interagir com pessoas cujas identidades e comunidades podem ser mais "fora do comum" pra quem está de fora.
Este guia não tem como ser muito resumido, porque é justamente para pessoas que não sabem por onde começar quando deram seu primeiro passo para fora de comunidades que tentam ficar mais dentro de certas normas sociais.
Por favor, avisem se houver algum conceito que não dê para entender nem dentro do contexto, nem procurando aqui e nem fazendo uma rápida pesquisa na internet; tentarei assim colocar alguma explicação ou algum link que explique o conceito.
Informações básicas sobre o funcionamento de opressões
Aviso de conteúdo: menções vagas a opressões, suicídio e violência (vagas porque tentei deixar isto leve, mas ainda mostrar qual é o ponto de ligar pra isso). Se você acha que já sabe o suficiente sobre isso e isso vai te deixar mal, pode passar para a próxima seção.
(Uma nota sobre vocabulário: pessoas marginalizadas são pessoas que são negras, indígenas, mulheres, gordas, gays, trans, autistas, cegas, profissionais do sexo, pobres, etc. Eu não uso o termo minoria porque, embora saiba que minoria neste contexto signifique minoria de poder e não necessariamente de número, termos como grupos marginalizados ou pessoas minorizadas mostram melhor que tais grupos/comunidades/pessoas não estão naturalmente fora de posições de poder, e sim são mantidos fora delas.)
Racismo, misoginia, cissexismo, capacitismo, etc. não são problemas individuais, ou restritos a grupos que querem intencionalmente machucar pessoas marginalizadas. São frutos de sistemas hierárquicos que querem manter certos grupos como normais e/ou ideais, e outros como anormais e/ou inferiores. Com a colonização e a globalização, acredito que a maioria da população mundial tenha sido exposta a esse tipo de ideal.
Isto é, qualquer tipo de opressão vai estar enraizado em boa parte das pessoas que você conheceu, conhece ou vai conhecer. E muita coisa é perpetuada de forma velada; de forma que deixam parecer que não é realmente preconceito/discriminação/opressão, e sim alguma outra questão, como "senso comum" (que é sim pautado nessa lógica opressiva), sorte/azar, mérito ou qualquer outra coisa.
Perpetua-se a ideia de que ódio a grupos marginalizados é só questão de alguém que vai lá e comete alguma violência. Assim é fácil passar a culpa para pessoas específicas, ao invés de todo um sistema.
Alguém não é violentamente racista, misógine, cissexista, heterossexista, etc. do nada. A pessoa possivelmente cresceu com sua família expressando nojo por certo grupo marginalizado, com mídia (programas de rádio, TV, etc.) fazendo piadas em cima de tal grupo marginalizado, com suas amizades usando termos que se referem a aquele grupo marginalizado como algo ruim. Daí a pessoa consegue um trabalho com pessoas que pensam de forma parecida, algume de sues colegas lhe passa conteúdo que fala sobre como tal grupo marginalizado vai destruir seu estilo de vida, a pessoa consome mais mídia com discursos de ódio, e a pessoa decide eventualmente extravasar raiva agredindo alguém, porque não pensa naquela pessoa marginalizada como humana e sabe que ninguém em seus círculos lhe odiaria se soubesse.
É por isso que é necessário quebrar a ilusão de que tá tudo bem desde que fique só entre amizades; de que tá tudo bem porque é só uma piada; de que tá tudo bem porque é só ignorância; de que tá tudo bem porque precisamos respeitar a "diversidade de opiniões"; de que tá tudo bem porque é só conteúdo fictício (mesmo que tal conteúdo esteja sendo consumido em massa a um ponto que muita gente acha que aquilo é uma reflexão fiel da vida real). Todas essas coisas colaboram para que ataques continuem.
E quando não é alguém cometendo violência, são pessoas tendo que viver em volta de outras que fazem piadas sobre algo que é integral às suas identidades, que sexualizam sua existência de forma inapropriada, que menosprezam suas habilidades, que fazem cara de nojo, que gritam coisas na rua, que riem quando essas pessoas pedem respeito, que são maltratadas quando precisam de algum serviço que requer comunicação com outras pessoas, etc. Não é porque essa violência não é física que não importa. E não é à toa que qualquer pessoa marginalizada tem mais chance de desenvolver depressão, alcoolismo ou similares, ou de cometer suicídio.
Ou seja: opressão, no contexto desta postagem e da maioria dos espaços que usam a palavra, se refere a opressão estrutural. Tem uma postagem mais completa sobre isso aqui, mas já aviso que ela contém mais exemplos de exclusão social, automutilação, e outras consequências de opressões.
Para que servem espaços antiopressão
Pelo que está na seção acima, é importante ter espaços que vão contra essas opressões, aonde é possível:
- Que pessoas marginalizadas tenham espaços que consigam não ter que lidar com esse tipo de coisa o tempo todo;
- Que pessoas marginalizadas e suas aliadas possam se conhecer e formar redes de apoio;
- Entender que certas coisas comuns no dia-a-dia contribuem com sistemas opressivos;
- Aprender a evitar fazer ou apoiar ações envolvendo retórica, vocabulário e/ou violência opressive;
- Organizar materiais e ações que ajudem outres pessoas e grupos a também parar de contribuir com opressão;
- Compartilhar experiências relacionadas com opressão e assim desenvolver vocabulário, (re)construção de identidades e culturas fora da norma e estratégias para lidar com sistemas opressivos;
- Organizar ações coletivas que consigam fazer um grande impacto na cultura e no sistema, almejando uma revolução que danifique ou destrua sistemas opressivos.
Obviamente, nem todo espaço vai conseguir fazer tudo isso; e nem é o objetivo de todo espaço fazer tudo isso, ainda mais quando são espaços pequenos.
Um grupo de amizades no WhatsApp pode tentar não perpetuar sistemas opressivos e ser uma rede de apoio para as pessoas marginalizadas do grupo, mas dificilmente vai partir para fazer ações de educação ou conseguir fazer uma revolução sozinho.
Uma rede social alternativa com pouca gente dificilmente vai criar um grupo coeso o suficiente para cunhar vocabulário que vai ser espalhado em outros lugares, e tem menos possibilidade ainda de construir uma cultura queer significativa ou acabar com o capitalismo.
Ambas essas comunidades podem ser pontos de partida para coisas maiores, e devem ser, se houver a oportunidade. Mas já aviso que muitas vezes isso não é viável, e que isso não significa que o grupo é totalmente inútil, superficial ou reformista.
Em geral, este guia estará tratando de comunidades que não têm mobilização suficiente para fazer ações maiores, porque tenho mais experiência com isso.
Lidando com intolerância
Aviso de conteúdo: menções a opressões, invalidação e assassinato.
Para resumir, pessoas que são abertamente machistas/racistas/cissexistas/heterossexistas/diadistas/capacitistas/etc. geralmente não são bem vindas em espaços antiopressão, a não ser que tais espaços não sejam realmente antiopressão.
Talvez, sim, estas pessoas possam algum dia aprender a não ser assim. Mas, se simplesmente deixarmos elas ficarem em nome da convivência ou da liberdade de expressão ou do aprendizado ou de qualquer outra desculpa do dia, pessoas marginalizadas (o público alvo, na falta de um termo melhor) não vão se sentir tão seguras e vão embora.
É estressante ter que lidar com quem invalida sua existência, e é perigoso ter que lidar com alguém que quer te matar.
Sugiro ler sobre o Paradoxo da Tolerância.
O que são microagressões e qual o motivo de você ter que ligar para elas
Aviso de conteúdo: microagressões de vários tipos ¯\_(ツ)_/¯
Eu fui ver se alguém conseguia resumir o que são microagressões, e achei esta definição:
São palavras ou atos que têm um componente agressivo, mas que de uma forma ou de outra encobrem ou deformam o conteúdo violento que transmitem.
(Fonte)
Também achei esta aqui:
As microagressões são um tipo de maus-tratos psicológicos baseados no desprezo persistente e cotidiano, em uma anulação na qual o outro faz uso das brincadeiras para roubar, pouco a pouco, a nossa autoestima. Estamos diante de um tipo de maus-tratos do qual nem sempre se fala, já que não é tão evidente, não deixa marcas e, às vezes, nem quem o pratica nem quem o recebe são conscientes de que estão diante de uma prática muito destrutiva.
(Fonte)
Ambas as fontes falam de microagressões num contexto mais geral. Porém, em espaços de justiça social, geralmente se fala de microagressões quando estas estão vinculadas a algum tipo de discriminação.
Algumas microagressões que podem acontecer nesse contexto são:
- Uma pessoa não conseguir explicar porque ela gosta menos de tal coisa, quando o motivo provavelmente tem a ver com o envolvimento de algum grupo marginalizado naquela coisa;
- Uma pessoa não quer/não gostaria de ter envolvimento social, romântico e/ou sexual com pessoas de certo grupo marginalizado (como se todas tivessem certa característica indesejada);
- Uma pessoa quer ter envolvimento social, romântico e/ou sexual apenas/preferencialmente com pessoas de certo grupo marginalizado da qual ela não faz parte (como se todas tivessem certas características desejáveis específicas);
- Piadas "inofensivas" excessivas/indesejadas sobre uma identidade;
- Piadas, retórica ou termos que igualam ser de um grupo marginalizado a ser algo ruim;
- Utilização de coisas criadas por pessoas marginalizadas de forma que deturpa e apaga o sentido original delas;
- Diminuição da importância de uma identidade;
- Diminuição do impacto de uma opressão ou de coisas que ocorrem por conta de opressão (inclusive em relação a microagressões);
- Comparação de opressões ou de coisas que ocorrem por conta de opressão para diminuir a discriminação que alguém ou algum grupo sofre ou sofreu.
Alguns exemplos disso são:
- O presidente é um idiota. Idiota significa "sem inteligência", e inteligência é uma construção social baseada no que uma cultura branca, neurotípica, patriarcal e mascunormativa valoriza. Usar uma palavra que significa "sem inteligência" como xingamento é dizer que pessoas fora dessa norma são piores de alguma forma;
- Pessoas pansexuais gostam de panelas? Pessoas com atração por muitos gêneros já sofrem com estereótipos baseados em promiscuidade e em "transar com tudo e qualquer coisa". Pessoas de qualquer identidade não-hétero já sofrem com ter que constantemente combater desinformação e presunções errôneas sobre o que suas identidades significam. Essa piada pouco original é só mais uma coisa na pilha;
- Não sei se vou confiar num jogo feito por uma mulher... contribui com a ideia de que mulheres são piores para realizar trabalhos técnicos ou que não são relacionados a cuidar do lar e de crianças, uma ideia extremamente misógina.
- Aposto que ele é misógino assim por ter pau pequeno. Isso é atribuir misoginia (novamente, um problema sistemático) a pessoas individuais, além de colocar a culpa disso em uma característica que qualquer pessoa pode ter independentemente do quanto for misógina, e de ressaltar o quanto uma característica comum a muitos homens trans e intersexo é digna de deboche, de nojo ou de mostrar o quanto essas pessoas são "menos homens" por isso. O gênero de uma pessoa não tem a ver com genitália ou com o quanto ela é diferenciada de outra genitália; estas são retóricas extremamente nocivas contra pessoas trans e intersexo.
- Eu queria namorar um japonês, eles são tão organizados, podiam me ajudar... é uma frase que contribui para as noções de que todas as pessoas japonesas são organizadas (ou seja, gera vergonha em cima das pessoas japonesas que não são por não preencherem esse suposto requisito básico e vergonha em cima das pessoas japonesas que são por contribuírem para esse estereótipo), e para a noção de que são subservientes e prontas para ajudar quem não tem essa habilidade (o estereótipo de asiátique submisse é extremamente nocivo e parte de contextos colonialistas).
"Mas são só coisas que todo mundo diz!" E é esse o ponto. Por serem microagressões, a primeira vista estas coisas parecem inofensivas; mas elas são constantes na vida de pessoas marginalizadas.
Mesmo "elogios" são ruins, quando reforçam estereótipos (ou porque você está dizendo que aquela pessoa é assim por ser de um grupo e não por seu próprio mérito, ou porque você está dizendo que aquela pessoa é diferente do grupo que em geral é inferior).
E mesmo que você não esteja atacando uma pessoa marginalizada diretamente, sua ação demonstra o quão pouco você considera suas questões válidas.
Uma boa dica para evitar "cair no lugar comum" e assim cometer microagressões é se expressar de forma mais literal, quando você não entende bem as conotações da forma figurada.
Ao invés de fazer uma piada usando o nome da identidade de alguém, você pode apenas perguntar o que a identidade significa. Ao invés de usar insultos vazios para ofender alguém, pense no que realmente a pessoa fez/a coisa é, e a descreva diretamente como inconsequente, imprudente, intolerante, nociva, prejudicial, ruim, desprezível, etc.
Obviamente, a questão não é só trocar palavras. A maioria das pessoas também precisa passar por um processo de reflexão sobre o quanto sistemas opressivos estão internalizados nela, e questionar o que foi empurrado como verdade por esses sistemas opressivos, quando prejudica grupos marginalizados e tem pouco fundo de verdade.
Estou falando de questões como categorização de atração sexual baseada em genitálias, categorização de personalidade/interesses baseada em raça/etnia/lugar onde nasceu, categorização de quais pessoas sabem do que estão falando ou não se baseando em se elas falam/escrevem "certo" ou possuem bom equipamento de áudio/vídeo, categorização de qual gênero a pessoa tem e de qual linguagem a pessoa usa baseada em sua aparência, etc.
Eu também recomendo que você evite falar de forma que, ainda que não seja ativamente relacionada com alguma discriminação, remeta a grupos que geralmente perpetuam discursos de ódio.
[Leituras recomendadas (aviso de conteúdo para um monte de discriminações): Get to Know the Memes of the Alt-Right and Never Miss a Dog-Whistle Again, The Far Right's Most Common Memes Explained For Normal People]
Calling out, calling in, postagens educativas vagas
Quando alguém comete uma ou mais microagressões, existem algumas formas de lidar com a pessoa que não são banimento imediato da comunidade ou ignorar o que a pessoa fez.
Ao contrário da questão de pessoas obviamente intolerantes, lidar com quem comete microagressões é complicado, porque é até possível que a pessoa queira corrigir seu comportamento caso perceba que esteja machuchando alguém ou defendendo sistemas opressivos. Mas também é possível que a pessoa insista em fazer algo porque não entende como aquilo pode machucar ou afastar alguém.
Esta seção mostra algumas das formas que comunidades podem lidar com esse tipo de situação.
Callout/call-out/call out é um termo que muita gente que navega bastante pela internet deve ter ouvido falar.
Basicamente se referem a listas explícitas do que alguém fez de problemático, preferencialmente com provas.
Estou colocando call-outs na categoria de "ferramentas intracomunidade" porque raramente vejo call-outs para pessoas que estão completamente fora de uma comunidade (embora eles também existam).
Eu diria que são o resultado de quando uma comunidade não tem como depender de moderação para remover elementos problemáticos; assim, o único jeito de "tirar" alguém de uma comunidade é depender do resto das pessoas bloqueando a pessoa.
Embora não seja impossível de aprender com call-outs, eles são vistos como uma experiência estressante e extrema demais para ser um incentivo ao aprendizado. Em geral, são um último recurso, ou algo desnecessário porque o grupo tem moderação que pode remover a pessoa antes de chegar a esse ponto.
Call-outs também são infames por poderem isolar pessoas mesmo com provas falsas ou por coisas pequenas. Por isso, é recomendável que só sejam feitos por questões sérias, como abuso ou evidência de conexão recente com grupos reacionários. Mesmo assim, muita coisa pode ser resolvida diretamente com a moderação.
Ou seja: em comunidades como Colorid.es e como o fórum e o Discord do Orientando, call-outs provavelmente mais atrapalham do que ajudam, não são recomendados, e podem ser contra as regras em alguns casos.
Ao invés de call-outs, é recomendável fazer call-ins, que ao invés de serem públicos e com o objetivo de fazer todo mundo saber sobre o que a pessoa fez de errado, são privados e com o objetivo de só deixar a própria pessoa saber o que ela fez de problemático.
Caso exista uma moderação ativa e confiável, é possível contatar a moderação (ou reportar diretamente a postagem) para fazer isso. Também é possível tentar falar com uma amizade da pessoa, se você tiver essa intimidade com a amizade mas não com a pessoa.
O problema de call-ins é que eles não são visíveis, justamente para evitar que pessoas tenham que escolher lados ou fiquem falando sobre isso. Então, para a moderação, para as pessoas afetadas e por outras pessoas que tomaram nota, pode ser impossível de ver que a pessoa foi avisada e está disposta a não cometer aquele erro no futuro.
Mesmo assim, pode-se dizer que quando a equipe responsável pela comunidade avisa alguém que seu comportamento está fora das regras do site, isso também é um call-in, mesmo que as regras quebradas não tenham a ver com discriminação.
Se você acha que não vale a pena denunciar, e também não tem intimidade com a pessoa, você pode mandar alguma mensagem pública que eduque sobre a questão.
Eu recomendo tomar cuidado com isso, porque se a mensagem for direta demais, pode ser desnecessariamente hostil, de forma que talvez seria melhor ter falado com a pessoa mesmo. Eu recomendo postar o aviso em outro dia, de forma que não mencione nenhum ocorrido.
Uma mensagem educativa geral precisa ser explicativa: ou seja, precisa dizer que ação problemática está sendo feita, como e por qual motivo tal ação é nociva, e o que pode ser feito no lugar de fazer tal ação (se tal ação for alguma coisa que foi bem intencionada e que poderia ser melhor, e não alguma coisa que só discrimina/incomoda).
A vantagem de uma mensagem pública é que muito mais gente pode ver e aprender. A desvantagem é que você não tem como saber se quem deveria ler e absorver as informações vai fazer isso.
De qualquer forma, é recomendável você denunciar a pessoa ou contatar a moderação quando alguém está cometendo (micro)agressões, caso a moderação tenha o objetivo de manter um espaço inclusivo.
Consumo de conteúdo problemático (também vale para produtos em geral, mas vou focar em mídia)
Midia é um dos assuntos mais fáceis de se falar. Mas, como vivemos sob vários sistemas opressivos, grande parte da mídia reproduz/colabora com estas opressões.
Isso pode ser por meio da própria mídia (por exemplo, um filme com certo grupo marginalizado sendo estereotipado), e/ou pelo meio da produção (por exemplo, pessoas que fizeram o filme já fizeram comentários discriminando contra grupos marginalizados).
As reações a pessoas que falam sobre como gostam desse tipo de conteúdo variam de comunidade para comunidade. Algumas comunidades não vão se importar desde que ninguém fique negando o quanto aquela mídia/quem a fez é nocive para certos grupos, outras nem deixam que pessoas que gostam de certas mídias entrem na comunidade.
Pessoalmente, acho que não há como todos os gostos de alguém serem completamente livres de perpetuar opressão ou de ter qualquer outro problema, mas também não vejo porque alguém comprometeria seu lugar numa comunidade só porque precisa expressar que gosta muito de consumir alguma coisa.
A ideia de que alguém vai ser taxade de {rótulo que expressa que a pessoa contribui ativamente com opressão} só por gostar de {mídia que contribui ativamente ou passivamente com tal opressão} é meio exagerada, mas sugiro prosseguir com cautela.
Aprendendo sobre opressões e discriminação
Infelizmente, eu não consigo resumir tudo o que aprendi por anos em uma lista de links para ler em um dia.
Além disso, linguagem e retórica vão evoluindo com o tempo, e podem diferir de comunidade para comunidade.
Considere acompanhar contas/páginas que falem sobre isso em seus métodos preferidos (RSS, redes sociais, barra de favoritos, etc.), mas evitando acompanhar somente as que são:
- Apenas/majoritariamente memes e postagens de poucas linhas (sim, isso pode ser legal para chamar a atenção de quem não sabe de nada, mas aprender sobre discussões mais profundas e com mais nuance também é importante);
- Apenas/majoritariamente chacota de retórica opressiva (novamente, isso pode ser legal, mas tem muita coisa importante que acaba não sendo discutida com esse formato);
- Curadas por aliades (não que elas não possam ser boas, mas tente centralizar vozes marginalizadas);
- Focadas em combater uma única opressão a ponto de ignorar que outras existem;
- Favoráveis a chacota de grupos que não são pró-opressão ou privilegiados só porque "são estranhos" e não são marginalizados por si só (isso significa que é só uma questão de tempo até acharem alvos marginalizados "aceitáveis");
- Apegadas a termos/argumentos que contribuem para sistemas opressivos (mesmo que o conteúdo seja bom para uma opressão específica).
Existem vários espaços que te permitem fazer perguntas, como Ajuda NHINCQ+ (especificamente sobre questões NHINCQ+) e Writing with color (especificamente sobre como escrever personagens racializades). Sugiro procurar por um espaço assim para fazer perguntas, caso você não tenha conseguido achar o que quer com pesquisas; não é muito legal você mandar esse tipo de pergunta pra pessoas marginalizadas aleatórias.
Evite depender de outras pessoas te avisando sobre algo ser microagressão ou retórica intolerante. Tente se informar de questões além das que colocam na sua frente, e se questionar sobre se certas atitudes suas realmente são inofensivas.
"Errei, e agora?"
Talvez você tenha falado algo que não sabia que era uma microagressão, ou tenha feito uma piada que para muita gente remete a um apito de cachorro reacionário. Talvez outra pessoa tenha percebido isso e tentado falar com você sobre isso. Aqui estão algumas dicas para lidar com isso:
- Se você concorda que o que fez é errado, não tente se justificar. Peça desculpas (sem exagerar) e pesquise mais sobre o assunto para não cometer o mesmo erro novamente;
- Se você não concorda que o que fez é errado, pense no motivo pelo qual você não acha que aquilo é errado antes de argumentar. Outras pessoas afetadas não terem falado com você sobre isso antes ou a sociedade em geral achar que o que você fez é aceitável não são bons motivos;
- Não faça com que a outra pessoa tenha que se dar o trabalho de pesquisar para você o motivo daquilo ser errado. Faça sua própria pesquisa antes de perguntar;
- Evite trazer pessoas que não fazem parte da situação para a discussão (e, se quiser fazer isso, confira com essas pessoas em uma situação privada primeiro se aceitam fazer parte dela).
Sobre identidades que você nunca viu
Agora começa a parte que se aplica especificamente a espaços NHINCQ+ inclusivos.
Nestes espaços, é comum você ver pessoas demonstrando que são de identidades que você achava que ninguém usava de verdade, ou das quais você nunca ouviu falar.
O mundo heterodissidente (de pessoas cuja orientação não pode ser precisamente descrita apenas como hétero) vai além de L/G/B.
E comunidades inclusivas vão conter pessoas que se sentem seguras para dizer que sua atração é fluida (por meio de rótulos como arofluxo, abrossexual ou outros), por mais de um gênero (por meio de rótulos como toren, polissexual, pan ou outros), condicional (por meio de rótulos como demi, lith, fray ou outros), inexistente (por meio de rótulos como omniarromântique, assexual estrite, claperromântique ou outros), fraca/vaga/ocasional (por meio de rótulos como gray-a, acevague, caligo ou outros), por pelo menos certo gênero (por meio de rótulos como dórique, trízique, aquileano, sáfica ou outros), e por assim vai.
O mundo cisdissidente vai além de pessoas trans binárias (ou seja, pessoas que se identificam somente como homens trans/transexuais/transgênero ou como mulheres trans/transexuais/transgênero) e de pessoas que só se definem como não-binárias.
Existem pessoas que não são contempladas pela cisnormatividade mesmo que se identifiquem totalmente com seu gênero designado (como pessoas utrinquegênero e ipsogênero), existem pessoas que não se dizem não-binárias mesmo que se encaixem na definição, entre outras. (Se você está falando de pessoas cisdissidentes ou não-cis num geral, estas pessoas precisam ser inclusas também.)
Também existem muitas pessoas que preferem usar rótulos mais específicos do que não-binárie. Por exemplo, uma pessoa gênero-vácuo é totalmente sem gênero e/ou tem vácuo no lugar do gênero; alguém que é nonvir tem uma identidade de gênero fortemente ligada com masculinidade mas completamente afastada do gênero homem; alguém que é gênero-fae muda de gênero de tempos em tempos mas sua identidade de gênero nunca muda para gêneros que são masculinos.
Cada rótulo possui suas particularidades, e tais particularidades podem afastar ou atrair pessoas para certos rótulos, mesmo que mais de um rótulo possa ser utilizado para a mesma situação.
Boa parte das pessoas que usa rótulos menos conhecidos também usa rótulos mais conhecidos em outras ocasiões. Mas isso não é algo que pessoas devem ser forçadas a fazer.
Em questão de pessoas intersexo... bem, é raro que pessoas não-perissexo se identifiquem com outra coisa, mesmo que algumas pessoas não gostem da conotação errônea de "entre os sexos" que intersexo dá. (Pessoas com cromossomos XXX ou XYY não estão "entre" os dois sexos aceitos pela sociedade eurocêntrica cristã, mas ainda são intersexo, por exemplo.)
De qualquer forma, o que você precisa ter em mente em relação a interagir com pessoas com identidades diferentes da sua é isso:
- Não é legal afirmar que certa identidade é inútil apenas porque existem outras parecidas (mesmo se houver uma exatamente igual, nomes alternativos não são necessariamente inúteis);
- Antes de sair falando que uma identidade é problemática, tente falar com outras pessoas sobre isso e ver muitas perspectivas sobre a questão, para ter certeza de que você não está apenas contribuindo com discriminação;
- Não sugira identidades "mais adequadas" para pessoas que não as requisitaram;
- Evite fazer perguntas como "por que você usa {rótulo 1} ao invés de {rótulo 2}?" Caso você realmente tenha esta dúvida, coloque ela de forma geral ("por que alguém usaria [...]") em um lugar que mais de uma pessoa possa responder, e coloque um aviso de conteúdo de possível invalidação para que isso não seja jogado na cara de pessoas frágeis cansadas desse tipo de pergunta;
- Evite fazer perguntas como "mas por que você se identifica como {rótulo}?" A não ser que alguém tenha dito explicitamente que não se importaria em responder, essa é uma questão que pode ser extremamente pessoal e complexa demais para responder a uma pessoa aleatória;
- Evite fazer perguntas sobre nomes de registro, genitália, funções corporais, transição hormonal ou outras questões pessoais, por mais que você tenha curiosidade de saber;
- Evite fazer piadas sobre ter uma identidade específica demais (ex.: "nossa eu devo ser celebsexual eu só tenho tesão por celebridades"), especialmente se você não usa identidades tão específicas quanto as da piada;
- Não presuma que pessoas não passaram por certos tipos de discriminação por terem identidades diferentes da sua. Pesquise e procure conhecer outras experiências;
- Não tente resumir ou reduzir a importância de certas identidades (ex: "pra mim, qualquer homem que gosta de homens é gay");
- Tente usar linguagem inclusiva quando sua postagem se aplica a vários grupos (ex: se você está falando sobre qualquer pessoa que sente atração por vários gêneros, use multi ao invés de bi). Vários termos pouco conhecidos podem te ajudar nisso, então sugiro que você pergunte sobre isso!
Ah é, se você usa LGBT ou LGBTs, eu sugiro mudar isso. Talvez você esteja acostumade com essas siglas serem o auge da inclusão, mas estas siglas foram e são usadas para excluir propositalmente pessoas intersexo, assexuais, arromânticas ou mesmo de outras identidades que "tecnicamente poderiam ser da sigla original", mas que "se fossem mesmo da comunidade mesmo só diriam que são bi ou trans ou lésbicas ou gays e pronto".
Isso não significa que você tem que usar NHINCQ+, queer ou algo igualmente abrangente e pouco aceito. Você também pode usar LGBT+, LGBTQ+, LGBTI+, LGBTQA+, LGBTQI+, LGBTQIA+, LGBTQIAP+, LGBTQIAPN+, QUILTBAG+, comunidade arco-íris ou outras variações disso.
Não existe lista completa de todas as identidades NHINCQ+, mas se você está procurando pelo que significa algo específico, pode tentar achar a resposta aqui, aqui, aqui, aqui, aqui ou aqui.
Você não precisa saber de todos os termos existentes ou usados, mas sugiro que tente manter a mente aberta e evitar excluir pessoas injustamente.
Sobre linguagem pessoal e neutra
Para os propósitos deste texto, vou definir linguagem pessoal como conjuntos de linguagem que pessoas usam para si, e linguagem neutra como conjuntos de linguagem usados para grupos com linguagem pessoal mista ou para pessoas cuja linguagem pessoal não foi determinada.
Por exemplo, a linguagem certa para se referir a uma pessoa chamada Maria é o artigo a, o pronome ela e o final de palavra a (a/ela/a). Então podemos dizer que a/ela/a é a linguagem pessoal da Maria.
Daí suponhamos que exista outra pessoa, que se chama Leandro, e que usa o/ele/o. Esta é a linguagem pessoal de Leandro. Maria deve se referir a Leandro usando o/ele/o, mesmo que a linguagem pessoal dela seja a/ela/a.
Agora, digamos que alguém queira se referir à Maria e ao Leandro ao mesmo tempo. Você pode usar "eles", mas isso significa dar prioridade à linguagem de Leandro, e isso tem base na ideia de que o/ele/o é uma linguagem mais importante por ser mais usada por homens. Você pode usar "elas", mas isso significa dar prioridade à linguagem de Maria; e como usar a/ela/a como linguagem neutra não é algo comum, é possível que te interpretem como alguém que não quer reconhecer que Leandro usa o/ele/o.
Na maioria dos lugares, ninguém vai estranhar se você se referir a estas duas pessoas como "eles". E não é proibido fazer isso em espaços inclusivos.
Porém, pense na seguinte questão: um grupo de 5 pessoas está fazendo panfletos sobre a identidade trans. Três são mulheres trans, e usam a/ela/a. Uma é um homem trans, que usa o/ele/o. Uma é uma pessoa não-binária transfeminina, que usa -/ila/e.
Se referir ao grupo como "eles" está centralizando a identidade de um homem acima da identidade de quatro não-homens, que, inclusive podem ter uma grande repulsa a serem tratades por uma linguagem vista pela sociedade como a associada ao seu gênero designado. Se referir ao grupo como "elas" pode fazer as duas pessoas que não usam a/ela/a se sentirem mal, porque homens trans já são acostumados com pessoas usando a/ela/a por invalidação, e pessoas que usam neolinguagem (o que inclui qualquer pronome diferente de ele e de ela e qualquer final de palavra ou artigo diferente de a e de o) também já estão acostumadas com serem invalidadas pelo meio de usar uma das linguagens padrão.
Ou, alternativamente, pense na seguinte questão: você quer se referir a um casal aonde uma das pessoas usa a/ila/a e a outra usa ze/elz/e. Usar tanto "eles" quanto "elas" já carrega uma grande associação com maldenominação.
Portanto, é preferível e recomendável que você use (ou ao menos treine usar) alguma linguagem que não remeta nem a o/ele/o e nem a a/ela/a. Os conjuntos e/elu/e e ê/elu/e são populares como neutros, mas também existem pessoas que propõem e/ile/e, le/elu/e ou i/ili/i.
Caso os exemplos não tenham sido suficientes para entender esta questão, aqui tem um resumo sobre o que são conjuntos de linguagem, e aqui tem uma página mais completa sobre neolinguagem e conceitos relacionados.
Mesmo que, no fim, você não queira usar algum conjunto que use neolinguagem como linguagem neutra, é extremamente importante que você ao menos aprenda a respeitar os conjuntos de linguagem pessoal alheios.
Enfim, minhas recomendações são as seguintes:
- Não presuma gênero ou linguagem com base em aparência ou atitude. Confira a linguagem pessoal no perfil da pessoa antes de se referir a tal pessoa com qualquer termo que remeta a alguma linguagem específica;
- Caso não haja informação sobre a linguagem de alguém em lugar nenhum, e não faça sentido perguntar, pode ser uma boa ideia usar linguagem neutra, desde que você não esteja usando a/ela/a, @/el@/@, o/ele/o ou similar como linguagem neutra;
- Caso você não saiba como usar certo conjunto de linguagem, você pode tentar usar este gerador, que dá uns exemplos. Se precisar saber algo mais específico, você pode perguntar, ou chutar e indicar que não tem certeza de como é a forma certa;
- Assim como em relação a identidades em si, não faça piadas ou presuma que sabe o quanto a vida de alguém é fácil pelo conjunto de linguagem pessoal que a pessoa escolheu.
Você também não deve presumir que a sua linguagem pessoal é óbvia para outras pessoas. Recomendo colocar sua linguagem no perfil. E caso alguém pergunte sobre sua linguagem, por favor responda adequadamente, ao invés de dar respostas indiretas que dependem de presunções cissexistas, exorsexistas, ou conformistas de gênero ou de linguagem para funcionar.
(Exemplos de respostas cissexistas, exorsexistas e/ou conformistas de gênero/linguagem para a pergunta "que conjunto de linguagem você usa" são: "olha minha foto e vê o que você acha", "eu sou mulher", "uso linguagem masculina", "uso pronome ele", "elu/delu" e "eu tenho um pau né". Todos estes exemplos dependem de presunções que excluem pessoas fora de certas normas.)
Espero que este guia tenha sido informativo!
Caso você tenha alguma dúvida, é só deixar um comentário!
The Far Right's Most Common Memes Explained For Normal People
So you can identify them when you see them out there online.Katie Notopoulos (BuzzFeed)
#capitalism #fascism #donaldtrump #usa #america #australia #gst #tax #tariffs #ausgov #auspol #tasgov #taspol #politas
abc.net.au/news/2025-07-22/aus…
ABC News
ABC News provides the latest news and headlines in Australia and around the world.Nassim Khadem (Australian Broadcasting Corporation)
Alguns termos relevantes em comunidades sobre justiça social
Eu estava escrevendo esta postagem e percebi que seria útil definir alguns termos usados no texto, e apontar que alguns comportamentos podem parecer inocentes quando são problemas recorrentes.
Como aquele texto já é bem longo e vários dos termos não eram tão relevantes, decidi colocar isto à parte.
Caso você tenha vindo de outro lugar, procurando por uma palavra específica, tente usar a função de busca de seu navegador (é por isso que cada termo está listado com múltiplas alternativas, quando é possível).
Termos traduzidos são priorizados quando disponíveis, mas há termos que simplesmente não possuem equivalentes fora da língua inglesa.
Definições de termos que descrevem opressão/discriminação (racismo, capacitismo, misoginia, etc.) ou coisas específicas dentro de certa opressão/discriminação (reducionismo de gênero, slut shaming, etc.) não estão disponíveis aqui. Caso você tenha interesse, Vitor Rubião tem umas listas disso aqui e aqui.
A
Aliades, aliados, aliadas, ally, allies
Aliades são pessoas que tentam auxiliar grupos marginalizados aos quais não pertencem, ajudando-os a combater sistemas opressivos e discriminação. Tem uma série de questionamentos envolvendo o termo, mas não vou entrar neles aqui.
Apitos de cachorro, apito de cachorro, dogwhistles
Apito de cachorro é algo que parece inofensivo, mas que sinaliza uma ideia maior para certos grupos. Assim, é possível espalhar retórica nociva compartilhando postagens que parecem inocentes ou legais.
Por exemplo, "cishet" originalmente se referia a pessoas cisgênero e hétero, mas nos últimos anos se tornou um sinônimo para pessoas assexuais/arromânticas/etc. que também sinaliza que não fazem parte de comunidades "LGBT+". Assim, alguém pode dizer "cishets não são LGBT", algo que "parece óbvio" e que assim é espalhado por pessoas que não sabem da associação cishets = pessoas a-espectrais, e, quando pessoas a-espectrais reclamam do alossexismo implícito, a pessoa que postou pode dizer "ué, estão admitindo que são cishets então?" e trazer mais gente pro seu lado.
Avisos de conteúdo e avisos de gatilho (content warning/trigger warning)
Avisos de conteúdo são avisos dados sobre o que algo contém. Cada comunidade tem suas regras sobre que tipo de conteúdo precisa de aviso ou não.
Algumas pessoas acham que avisos de conteúdo precisam ser a mesma coisa que avisos de gatilho, que são avisos dados para que alguém com certo trauma possa evitar certo assunto traumático, mas isso não é verdade.
Algumas pessoas podem não querer engajar com certo conteúdo em alguns contextos e em outros sim. Algumas pessoas podem não ter reações extremamente negativas a algo, mas ainda ter desgosto e querer um aviso antes de engajar com certos assuntos. Algumas pessoas podem sentir certo desconforto com certos assuntos sem ser algo extremamente ruim.
Avisos de conteúdo não censuram nada, apenas deixam pessoas poderem escolher se querem lidar com certos assuntos (no momento) ou não.
Por isso, também é importante não fazer piadas usando avisos de conteúdo como parte da piada (fazendo com que pessoas se preparem mentalmente para alguma coisa ruim quando é só uma piada ou um trocadilho).
Além disso, é importante ressaltar que avisos de gatilho não são necessariamente assuntos considerados pesados para a maioria das pessoas (como morte ou abuso). Gatilhos podem ser formados de diversas formas e por diversos motivos. Algumas pessoas podem precisar de avisos de gatilho para postagens que contém certos animais, certos tipos de comida, certas músicas, etc.
"Mas o que eu preciso avisar então?" Vai depender da comunidade e/ou das pessoas em volta. Algumas comunidades podem requerer aviso de conteúdo para falar sobre política, outras não. Algumas pessoas podem pedir para que outras pessoas avisem quando vão postar sobre certa banda, mas isso não significa que todo mundo no mundo precisa avisar quando vai postar sobre aquela banda.
C
Call-in, call in, callin, calling in
É falar com alguém de forma privada quando a pessoa fez algo que não devia.
Por exemplo, se alguém fez uma postagem dizendo que multi é um rótulo desnecessário porque é só usar bissexual, ao invés de mostrar como a pessoa é ignorante em público, você pode fazer um call-in, chamando a pessoa por um método privado e explicando porque a postagem dela prejudica pessoas multi que não são bissexuais.
Leitura recomendada: Calling In: A Quick Guide on When and How - Everyday Feminism
Call-out, call out, callout, calling out
É expor publicamente que uma pessoa fez algo que não devia.
Por exemplo, se uma pessoa fez uma postagem dizendo que multi é um rótulo desnecessário porque é só usar bissexual, ao invés de tentar conversar com a pessoa, você pode fazer um call-out, uma postagem pública expondo que a pessoa é anti-multi, que pode ou não explicar os motivos disso.
Enquanto call-ins geralmente são feitos para que a pessoa aprenda sem que outras a estejam julgando, call-outs geralmente são feitos para que a pessoa seja exposta como alguém que fez certa coisa e que portanto deveria ser bloqueada/excluída em massa.
Em comunidades onde há moderação ativa, call-outs não são necessários, em geral, e até são proibidos pelas regras de convivência de várias comunidades.
Concern trolling
Em geral, trollagem é associada com tentar enganar alguém por diversão, ou com xingar/fazer chacota com alguém constantemente sem ligar para as respostas da pessoa, ou fazendo chacota de tudo o que a pessoa diz.
Concern trolling, em geral, é algo mais refinado: é fingir que se preocupa com alguém, com algum grupo ou com alguma causa, mas ainda ter o objetivo de não prestar atenção no que tal pessoa/grupo/causa expressa ou está tentando mostrar.
É possível que alguém que esteja fazendo concern trolling nem perceba que está fazendo isso, porque simplesmente acha que já sabe de tudo sobre a situação e que seu ponto de vista é melhor.
Exemplos de concern trolling:
- Alguém falar para um grupo de ativismo gordo que se querem que pessoas parem de ser oprimidas por serem gordas, é só se esforçar para emagrecer;
- Alguém sugerindo para uma pessoa trans que talvez ela fosse mais feliz se fingisse ser cis a vida inteira;
- Alguém discutindo continuamente sobre ser muito difícil levar questões de justiça social a sério quando pessoas marginalizadas fazem chacota de grupos opressores ou demonstram sentimentos negativos em relação à sua marginalização.
D
Discriminação
Em contextos de justiça social, discriminação é o tratamento injusto de algo ou alguém baseado em um grupo que a pessoa pertence, ou algo que contribui para isso.
Geralmente, discriminação é baseada em algum tipo de opressão sistemática.
Dogpiling
É um monte de gente vir pra cima de uma pessoa só, de forma que não tem como a pessoa responder a todo mundo separadamente.
Dogpiling pode ou não:
- Ser algo planejado dentro de um grupo;
- Ser algo feito especificamente para tornar a caixa de e-mails/as notificações da pessoa/as respostas às postagens da pessoa inúteis;
- Ser composto da mesma mensagem sendo repetida inúmeras vezes.
Muitas vezes, call-outs encorajam dogpiling.
E
Eixo de opressão
São características que fazem com que alguém seja ou não seja privilegiade em certo aspecto.
Identidade de gênero é um eixo, modalidade de gênero é outro, raça é outro, orientação é outro, corporalidade é outro, poder aquisitivo é outro, neurotipo é outro, e assim por diante.
Vale lembrar que, mesmo que se chamem eixos, está mais para uma pirâmide com alguém no topo e com diferentes lados tendo diferentes problemas.
Por exemplo, uma pessoa neurotípica está no topo da "pirâmide" de neurotipos, mas pessoas autistas, plurais, com depressão e com transtorno obsessivo-compulsivo podem enfrentar lados diferentes de capacitismo anti-neurodivergente. Alguém também pode pertencer a mais de um desses neurotipos ao mesmo tempo, e enfrentar discriminações diferentes por cada uma dessas coisas (além de coisas extras por pertencerem a mais de um desses grupos ao mesmo tempo).
F
-fobia, -fóbique, -fóbico, -fóbica
Um sufixo muito utilizado para caracterizar opressão, discriminação, intolerância ou preconceito (como em homofobia, transfobia ou xenofobia).
Porém, algumas pessoas/comunidades estão tentando parar de usar tal sufixo, já que ele encoraja muita gente a pensar em intolerância como uma doença mental e simplifica o que são discriminações.
Mais uma leitura sobre isso: Discriminações não são fobias
G
Grupo marginalizado, grupo minorizado, grupo oprimido, identidade marginalizada, identidade oprimida, minoria
Todas estas terminologias se referem a grupos que sofrem sob opressões sistemáticas. Alguns sinais de que um grupo pode ser marginalizado são:
- É comum que pessoas sejam excluídas de grupos sociais (amizades, família, grupos dedicados a certos assuntos, etc.) por fazerem parte do grupo;
- É comum que pessoas sejam alvos de violência física, verbal e/ou sexual por fazerem parte do grupo;
- É comum que presumam que pessoas tenham certa característica ou personalidade não relacionada com o que significa ser do grupo apenas por fazerem parte daquele grupo;
- É comum que, por fazerem parte do grupo, pessoas sejam consideradas menos desejadas para terem certo(s) tipo(s) de relacionamento(s), preencherem certas vagas de emprego, receberem atenção em certos contextos, etc.;
- É comum que o vocabulário desenvolvido por pessoas dentro do grupo seja desvalorizado e considerado desnecessário por partir do contexto daquele grupo;
- É comum que as identidades, experiências e preocupações do grupo não sejam levadas a sério, como se só as opiniões de pessoas de fora do grupo fossem importantes e dignas de consideração.
(É comum aqui não significa que acontece sempre e com todas as pessoas do grupo, e sim que quando isso acontece é algo que não é somente uma exceção.)
Eu não gosto de usar o termo minoria porque, embora neste contexto signifique minoria de poder e não necessariamente de número, termos como grupos marginalizados ou pessoas minorizadas mostram melhor que tais grupos/comunidades/pessoas não estão naturalmente fora de posições de poder, e sim são mantidos fora delas. Porém, eu não diria que minoria é necessariamente um termo problemático.
Grupo privilegiado, maioria
É o grupo que não é marginalizado, e que portanto tem privilégio, por não sofrer sob uma opressão sistemática (ao menos em certo contexto).
Enquanto pessoas indígenas, negras, asiáticas e de diversos outros grupos étnicos/raciais são grupos marginalizados, pessoas brancas são um grupo privilegiado, por exemplo.
I
Identidade
É uma característica de uma pessoa. Em contextos de justiça social, geralmente se refere a características que fazem com que alguém seja de um grupo marginalizado ou privilegiado.
Ocasionalmente, há a ideia de que isso só se aplica para orientações, identidades de gênero e às vezes outras coisas que dependem de auto-identificação, mas coisas que dependem de características físicas ou que são consideradas "mais óbvias/imutáveis" também são identidades.
Intolerância, intolerante, bigotry
Em contextos de justiça social, alguém intolerante é alguém que não aceita que está cometendo alguma discriminação, ou que não acha que alguma discriminação é errada.
Também é possível usar -intolerância/-intolerante como substituição para -fobia/-fóbique, como em transintolerância ou transintolerante.
J
Justiça social, social justice, JS, SJ
A ideia de que todas as pessoas merecem acesso a direitos e deveres básicos, como alimentação, saúde, moradia, tratamento justo, etc.
M
Microagressões, micro-agressões
São pequenas ações, que podem ou não ser propositais, que acabam prejudicando alguém, especialmente em grande quantidade. Em espaços relacionados com justiça social, geralmente se fala de microagressões quando estas estão vinculadas a algum tipo de discriminação.
Algumas microagressões que podem acontecer nesse contexto são:
- Uma pessoa não conseguir explicar porque ela gosta menos de tal coisa, quando o motivo provavelmente tem a ver com o envolvimento de algum grupo marginalizado naquela coisa;
- Uma pessoa não quer/não gostaria de ter envolvimento social, romântico e/ou sexual com pessoas de certo grupo marginalizado (como se todas tivessem certa característica indesejada);
- Uma pessoa quer ter envolvimento social, romântico e/ou sexual apenas/preferencialmente com pessoas de certo grupo marginalizado da qual ela não faz parte (como se todas tivessem certas características desejáveis específicas);
- Piadas "inofensivas" excessivas/indesejadas sobre uma identidade;
- Piadas, retórica ou termos que igualam ser de um grupo marginalizado a ser algo ruim;
- Utilização de coisas criadas por pessoas marginalizadas de forma que deturpa e apaga o sentido original delas;
- Diminuição da importância de uma identidade;
- Diminuição do impacto de uma opressão ou de coisas que ocorrem por conta de opressão (inclusive em relação a microagressões);
- Comparação de opressões ou de coisas que ocorrem por conta de opressão para diminuir a discriminação que alguém ou algum grupo sofre ou sofreu.
-misia, -mísique
Uma forma comum de evitar o sufixo -fobia/-fóbique.
Então, por exemplo, uma lei que não permite que pessoas percebidas como do mesmo gênero troquem qualquer tipo de afeto em público é queermísica, e a discriminação contra pessoas de outras regiões ou de outros países pode ser chamada de xenomisia.
O
Objetificação
É tratar alguém ou algum grupo como objeto.
Pode se referir a tratar certo grupo como apenas uma força de trabalho, ou agir como se fosse dever de pessoas de certo grupo darem satisfação sexual a qualquer pessoa que assim desejar, entre outras possibilidades.
Muitas vezes, isso tem a ver com a utilização de estereótipos, como achar que todas as mulheres trans estão desesperadas para transar com homens cis, ou como achar que todas as pessoas a-espectrais precisem ter relacionamentos com pessoas que "as consertem".
Opressão reversa, discriminação reversa
Termos geralmente usados quando grupos marginalizados fazem generalizações sobre grupos privilegiados. Geralmente usam termos mais específicos que partem dos termos que se referem a cada opressão, como misandria, racismo reverso e heteromisia.
Em geral, isso não deve ser levado a sério.
Não importa o quanto alguém disser que odeia pessoas brancas/hétero/cis/neurotípicas/magras/etc., isso não tem o mesmo peso do sistema por trás, ao contrário de quando algo é feito contra um grupo oprimido. Geralmente, frases do tipo são usadas ou para chocar e chamar atenção para questões ligadas com opressão, ou para desabafar com outras pessoas do mesmo grupo marginalizado. E, mesmo que você não concorde em usar isso como tática, gastar sua energia reclamando disso ao invés de usar outras táticas é policiamento de tom.
Existem casos nos quais essas coisas são realmente usadas como uma cortina de fumaça para reclamar de grupos marginalizados dos quais alguém não gosta. Por exemplo, muitas postagens reclamando de "homens querendo entrar no banheiro feminino" na verdade estão tentando gerar ódio contra mulheres trans. E muitas postagens sobre "pessoas hétero invadindo a comunidade LGBT" são sobre pessoas trans, não-binárias, intersexo, cuja atração é fluida, do espectro assexual, do espectro arromântico, que sentem atração por mais de um gênero, ou de outros grupos que deveriam ser considerados parte da comunidade.
Também tem vezes que, mesmo não sendo postagens com xingamentos genéricos, são situações específicas usadas para excluir pessoas. Como uma mulher branca sendo racista e desviando de comentários de homens racializados sobre isso porque "são homens e portanto opressores", ou pessoas tentando impedir homens trans neurodivergentes de serem reconhecidos como homens trans porque "são só mulheres confusas por conta de seu neurotipo e de não se encaixarem em estereótipos misóginos".
Mas é importante notar que mesmo nestes casos, não são realmente grupos privilegiados que estão sendo prejudicados, e sim grupos marginalizados.
Opressão sistemática, opressão estrutural (ou só opressão)
Uma opressão estrutural é [...] uma submissão conseguida pela força e que é mantida através de um conjunto organizado, sistematicamente.
(Fonte)
É uma opressão mantida e perpetuada por um sistema presente em cada sociedade, com o objetivo de manter certos grupos com poder e privilégio e certos grupos sem.
P
Palavra estigmatizada, palavra com estigma
Palavra estigmatizada não é bem um sinônimo de slur ou de snarl (que, aliás, são termos de gravidades diferentes), mas meio que serve para o mesmo fim: falar que certa palavra ou que certo termo carrega algum estigma, geralmente ligado com opressão.
Geralmente, são palavras a serem evitadas, mas tem vezes que o problema é o contexto e não a palavra em si.
Palavras estigmatizadas usadas como xingamento podem ser ressignificadas, ou seja, serem usadas como palavras de significado positivo para as pessoas daquela comunidade, mas só cada pessoa daquela comunidade pode decidir se algo vai ser ressignificado ou não.
Por exemplo, pessoas neurodivergentes de neurodivergências categorizadas como transtornos de desenvolvimento podem se descrever e dar significados positivos a palavras como retardade e imbecil; já pessoas neurotípicas não têm o direito de decidirem que vão continuar usando essas palavras, mas com outros significados (ainda que positivos).
Policiamento de tom, tone policing
É quando reclamam do tom em que uma mensagem importante está sendo dita.
Por exemplo, quando uma mulher trans diz "pessoas cis estão nos matando" e uma pessoa cis se ofende com a generalização ao invés de considerar o que poderia fazer para impedir mais violência transmisógina de acontecer.
Política de identidade, política da identidade, política identitária, identity politics
Qualquer ideia política que considere que grupos identitários diferentes possuem demandas ou interesses em comum entre si que não são necessariamente compartilhados com o resto da população é relacionada com política de identidade.
Isso não significa que só grupos progressivos usem políticas de identidade ao seu favor. Cotas para quem estudou em escola pública são uma política identitária, mas segregação racial também é uma política identitária.
É possível usar este tipo de política de formas diferentes. Algumas pessoas só consideram que existem interesses políticos em comum, outras consideram que as experiências de certos grupos também. Algumas pessoas usam a falta de alguma experiência como prova de que a pessoa não é realmente de certo grupo. Algumas acreditam que só certas pessoas podem usar certos termos ou falar sobre certos assuntos.
Algumas das críticas contra políticas identitárias são válidas, mas outras estão basicamente ignorando a realidade. Isso é porque política identitária é um termo extremamente amplo, que cobre qualquer coisa relacionada a identidades/grupos sociais.
Privilégio
Em contextos de justiça social, privilégio se refere a não sofrer pessoalmente efeitos de certa opressão, ou de não sofrer tanto quanto um grupo marginalizado no mesmo eixo.
Por exemplo, um homem cis querendo se identificar como homem não passa por tantos questionamentos e riscos ao fazer isso do que um homem trans. Portanto, o homem cis tem privilégio; privilégio cis, neste caso.
Problemátique, problemática, problemático
Uma coisa problemática é alguma coisa que tem algum problema (por exemplo, um carro que estraga muito pode ser chamado de problemático). Em contextos de justiça social, geralmente isso se refere a alguém ou algo que contribui com opressão.
Porém, é recomendável só usar esta palavra em casos onde não há outra. "Essa pessoa é problemática" pode se referir tanto a "essa pessoa está inventando termos o tempo todo só para confundir pessoas, o que pode atrapalhar esforços de educação mas não necessariamente contribui com opressões" quanto a "essa pessoa é violentamente transmisógina, racista e capacitista". Isso faz com que seja muito difícil julgar o que alguém quer dizer quando só diz que algo ou alguém é problemátique.
R
Racializade, pessoa racializada
Um termo para todas as pessoas não-brancas, que inclui pessoas indígenas, negras, asiáticas e outras que não possuem acesso ao privilégio branco.
Reply guy
Um título geralmente dado a homens que acham que qualquer postagem pública (especialmente de mulheres) é um convite a um debate ou um pedido de ajuda; e que muitas vezes respondem com familiaridade demais e flertando. Por exemplo, uma mulher posta sobre ter dificuldade numa parte de um jogo, sem estar pedindo ajuda, e homens que ela nem conhece aparecem para dizer que esse é "o custo de jogar jogos de verdade", ou sugerindo que jogue um jogo mais simples, ou qualquer coisa assim.
Isso pode parecer inocente, mas geralmente carrega o julgamento de que "homens sabem melhor" (mesmo que nem tenham tanto experiência quanto a pessoa sendo respondida), e é potencialmente irritante e assustador, especialmente quando muitos homens não levam "pare com isso" ou um bloqueio como uma resposta séria e continuam a tentar interagir com a pessoa.
(Mais leituras sobre isso: Don't Be a 'Reply Guy' / The curse of the Twitter reply guy)
S
Sealioning
É quando alguém ou um grupo faz uma porção de perguntas só para incomodar/tirar o tempo de uma pessoa ou de um grupo, ao invés de realmente querer aprender.
The curse of the Twitter reply guy
The dudes who reply to women's tweets with frightening regularity.Chloe Bryan (Mashable)
America This Week, Live on Monday 7/21/2025
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O que são "microcomunidades"
Observações
- Aviso de conteúdo: Queermisia contra diversos grupos. Eu vou tentar não mencionar exemplos muito pesados, mas isso pode ser meio difícil.
- A maioria dos termos deste texto que podem não ser tão reconhecíveis estão com links que levam para suas definições.
Definição
Uma microcomunidade, ao menos em contextos queer/LGBTQIAPN+/NHINCQ+, pode ser definida como qualquer comunidade dentro da comunidade queer/LGBTQIAPN+/NHINCQ+ que não tenha visibilidade, respeito e peso dentro de uma comunidade mais geral que em teoria devesse incluir essas comunidades menores.
Microcomunidades muitas vezes são alvos de chacota dentro destas comunidades mais gerais, mas mesmo que não sejam, podem também estar sendo invisibilizadas ou desconsideradas de outras formas.
Microcomunidade é um termo que diz respeito apenas a pessoas que deveriam estar sendo contempladas por caber na definição da comunidade geral (ou de quem ela inclui ou deveria incluir) por si só.
Isso significa, que, por exemplo, se homens trans binários não estão se sentindo incluídos em um grupo sáfico, esses homens não podem dizer que são uma microcomunidade ali, porque o grupo não é para homens binários, trans ou não. Porém, se homens trans binários não estiverem sendo levados em consideração em comunidades que se dizem trans ou LGBTQIAPN+, talvez homens trans binários possam ser uma microcomunidade nesse contexto.
Mais sobre o uso deste termo será detalhado mais tarde.
Motivo e origem
Contexto: questões intracomunidade
Infelizmente, alguns grupos em comunidades NHINCQ+ só querem beneficiar a si mesmos, ou a si mesmos e a grupos considerados mais consagrados.
Algumas vezes, é uma questão de receio de ter que aprender coisas novas e de ter que refletir sobre certas retóricas não serem inclusivas.
(Exemplo: a inclusão de pessoas trans, intersexo e a-espectrais, entre outras, questiona a ideia de que "amor é amor" é um bom slogan para pedir igualdade para o tratamento da população NHINCQ+ em relação ao resto da sociedade. Daí, algumas pessoas preferem dizer que essas comunidades não importam ou não fazem parte da comunidade em geral, ao invés de mudar esse slogan para algo mais inclusivo e/ou de admitir que ele não é inclusivo.)
Outras vezes, é uma questão de manter certo poder, de almejar estar na classe dominante ao invés de manter solidariedade com quem está fora do sistema.
(Exemplo: algumas pessoas trans binárias mantém a ideia de que são assim como pessoas cis e hétero, só que com corpos diferentes. Assim, essas pessoas tentam ao máximo se encaixar nos estereótipos e nos corpos que as normas de gênero e que a hetero/cisnormatividade colocam como padrões, e aceitam ser maltratadas em troca de mais apoio do sistema.
Daí essas pessoas tentam manter seu suposto privilégio rejeitando o ativismo de pessoas trans que lutam para ser reconhecidas como tão válidas quanto pessoas cis independentemente de transição e de história de vida, ridicularizando pessoas trans que não preenchem estereótipos de gênero e difamando comunidades não-binárias o máximo possível. Algumas também expressam opiniões completamente heterossexistas e diadistas.)
E também pode ser uma questão de ser intolerante contra certo grupo mesmo; ou seja, de acreditar nas mentiras que sistemas opressivos usam para falar que gente de certos grupos não prestam, e de usá-las diretamente em seus argumentos, ou modificá-las para que fiquem com uma "cara de militância" antes disso.
(Exemplo: a ideia de que pessoas múlti não são confiáveis e podem sempre trair com alguém de outro gênero por serem promíscuas demais é algo que algumas pessoas que sofrem sob heterossexismo expressam contra pessoas múlti, mas é uma ideia heterossexista perpetuada contra não só pessoas multi, mas também contra pessoas que fogem do padrão hétero em geral.
A ideia de que uma mulher pan tem "risco de ir para o outro lado" pode ser usada como "justificativa" tanto por um namorado controlador que quer isolar sua parceira pan de suas amizades por ciúmes quanto por uma pessoa influente em uma organização "LGBT" tentando impedir uma mulher pan de conseguir um cargo importante nela. O namorado vai dizer que tem medo dela trair porque sente falta de mulheres, e a pessoa influente vai dizer que tem medo dela encontrar um homem hétero e "sair da militância", mas as duas atitudes têm base na mesma coisa e demonstram desconfiança em cima de uma mulher múlti.)
Contexto: "microrrótulo" e palavras similares
Nestes últimos anos (principalmente 2014 pra frente), houve tanto a cunhagem de várias palavras novas para descrever identidades, opressões e conceitos relacionados quanto uma onda reacionária contra estas palavras e as comunidades que as usam, tanto de pessoas NHINCQ+ quanto de pessoas de fora da comunidade.
Um dos termos depreciativos que foram cunhados principalmente para pessoas "LGBT" invalidarem outras identidades NHINCQ+ foi microlabel (microrrótulo). Outros termos utilizados da mesma maneira foram equivalentes da língua inglesa de neorrótulo, neoidentidade e microidentidade.
E, eventualmente, algumas pessoas atingidas por estes rótulos passaram a usá-los de maneira neutra ou positiva.
Em geral, eu não tenho problema com a ressignificação de rótulos. Tudo bem você pegar algo que usam pra te xingar e dizer "tá, sou isso mesmo, e daí?"
Só que, para mim, esses rótulos são... vazios. Eles só significam "identidades que eu não gosto e que portanto não considero parte da comunidade". Então me incomoda que estes termos estejam sendo utilizados como se fossem um conjunto de identidades coerente.
O prefixo "micro" faz referência a algo pequeno. O que seria um rótulo pequeno, uma identidade pequena?
Seria uma identidade usada por poucas pessoas? Porque a identidade assexual é muitas vezes considerada parte deste grupo, mas milhares de pessoas se identificam com ela, por mais que existam poucos espaços onde pessoas possam se descobrir e assim passar a se identificar como assexuais.
Seria uma identidade específica demais? Então como é que identidades como mulhessexual (atração sexual exclusiva por mulheres) são consideradas específicas demais, enquanto identidades como lésbica (atração de mulheres e de pessoas que se consideram de identidade parecida apenas por mulheres e pessoas que se consideram de identidade parecida) não são?
O prefixo "neo" faz referência a algo novo. Isso até pode fazer sentido para várias identidades, mas o rótulo não-binárie só passou a ser usado como "não ser completamente/somente/sempre homem nem completamente/somente/sempre mulher" por volta de 2010; antes disso, essas pessoas se encaixavam no guarda-chuva genderqueer ou utilizavam identidades específicas como neutrois e bigênero.
Então como é que não-binárie seria um termo ok, enquanto termos anteriores (como demissexual, que é de 2006, e arromântique, que tem evidência de que já existia em 2006) são "neoidentidades"?
Não estou dizendo que toda cunhagem precisa seguir de forma literal as raízes da palavra, e sim que não existe nada que realmente une essas identidades além de "são as identidades que algumas pessoas se esforçam para questionar a presença na comunidade em um dado momento".
Só que isso nunca é dito, então o que conta ou não conta como microrrótulo/neoidentidade/etc. me parece muito no ar. Então eu preferia ter uma palavra diferente; uma já cunhada para que as comunidades afetadas consigam usar em qualquer contexto, ao invés de uma controlada por quem está discriminando e que geralmente está partindo de um contexto específico.
Microcomunidade é uma palavra baseada em microrrótulo e microidentidade, mas vou explicar melhor aonde ela difere depois.
Contexto: outros termos usados para significar coisas parecidas
Gênero de bolso foi um termo criado anos antes de neorrótulo e afins para contemplar identidades de gênero utilizadas por uma ou por poucas pessoas.
Porém, é um termo que nunca foi muito usado, e que acho que não parece muito intuitivo.
MOGAI é uma sigla cunhada há anos para contemplar pessoas não-cis, não-hétero e intersexo, basicamente. Ela é usada como sinônimo de microrrótulo e afins ("essa gente MOGAI" = "essa gente que usa microrrótulos", basicamente). Porém, era pra ser uma alternativa mais inclusiva a LGBT(QIAPN+), então não acho legal contribuir para essa deturpação. Pessoas trans binárias, bi, gays e lésbicas estão sim inclusas em MOGAI, por definição.
Gêneros não-binários não-reconhecidos tem sua origem aqui, e obviamente só contempla identidades não-binárias.
Mais notas sobre a utilização de microcomunidade
Micro, mas comunidades
Microcomunidade sempre dá a ideia de que existe a possibilidade de uma comunidade, mesmo que só uma pessoa faça parte dela no momento. A ideia aqui é que quando se fala de microcomunidades, estamos falando de pessoas, e não apenas de definições.
Eu quero que isso chame atenção quando pessoas falam de "neoidentidades" como se fossem teorias abstratas: não são. Se você está tirando sarro das identidades urânica e netúnica, você está tirando sarro de pessoas não-hétero que usam esses termos para se descreverem. Se você está falando de como a identidade abro é inútil, quero que esteja bem explícito que você está chamando uma comunidade de pessoas não-hétero de inútil.
O uso do termo varia em relação às circunstâncias
Eu quero que pessoas possam usar microcomunidade em contextos como:
- Existe um grupo "LGBT" com muitas pessoas. Porém, mais da metade é de homens cis gays sem experiência nenhuma em lidar com pessoas NHINCQ+ de outras identidades. Eles também controlam a direção em geral, então podem decidir facilmente que não vão se dar o trabalho de fazer qualquer coisa para datas importantes das comunidades lésbica, trans, bi, assexual, arromântica, intersexo, não-binária, etc. Também fazem piadas misóginas, cissexistas, alossexistas, etc. o tempo todo. Pode-se dizer então que todas as comunidades que não são a de homens gays são microcomunidades, neste contexto.
- Existe um fórum para pessoas trans. Apesar de ter uma pessoa não-binária na moderação, retórica diadista e exorsexista é frequente. Pessoas não-binárias são supostamente bem vindas pelas regras, mas sugestões de opções de gênero fora homem, mulher e outro são ignoradas, a moderação não se importa com a maldenominação de pessoas que usam conjuntos com neolinguagem e nem com piadas por cima de quem usa e/elu/e ao invés de o/ele/o como linguagem neutra. Neste caso, pessoas trans não são uma microcomunidade, e pessoas não-binárias são.
Porém, na internet em geral, acredito que o uso mais geral seja em casos como:
- Uma pessoa omnissexual e poligênero decide abrir um servidor de chat para pessoas de microcomunidades NHINCQ+. A ideia é que pessoas possam falar das particularidades de suas identidades ali, mesmo que se sintam silenciadas em espaços NHINCQ+ gerais, e mesmo que não sintam que suas identidades estejam sendo acolhidas ou contempladas em grupos especificamente bi, assexuais, lésbicos, gays, pan, não-binários ou trans que acharam por aí. Neste caso, uma pessoa ômni pode não ter se sentido contemplada em espaços bi ou pan, e uma pessoa caligossexual pode não ter se sentido bem em um espaço assexual, mesmo que pessoas bi, pan e assexuais sejam muitas vezes colocadas de lado em comunidades maiores.
Isso pode criar uma contradição: se pessoas de comunidades consideradas microcomunidades em outros lugares se unem em um lugar e têm poder (dentro daquele grupo), já não são mais microcomunidades.
Porém, eu prefiro dizer que isso cria uma solidariedade entre pessoas que são consideradas de microcomunidades em várias situações diferentes.
Talvez um homem trans nunca tenha se sentido excluído de uma comunidade de homens trans, mas tenha sido silenciado e ignorado muitas vezes em comunidades com mais identidades envolvidas. Daí talvez ele queira estar numa comunidade para microcomunidades para desabafar e aprender sobre outras comunidades excluídas. Ou talvez ele não sinta necessidade disso, já que já se sente aceito em outras comunidades.
Eu não sou a favor de levantar portões contra pessoas com rótulos "comuns demais". Dependendo das circunstâncias, essas pessoas podem passar pelos mesmos problemas. Mas cada comunidade pode ter suas regras, de qualquer forma.
Intersecções
Talvez quem esteja lendo tenha percebido que tentei evitar o assunto. Talvez não.
Mas e aí, comunidades de pessoas trans neurodivergentes podem ser microcomunidades dentro de comunidades trans majoritariamente neurotípicas? Comunidades de lésbicas negras podem ser microcomunidades dentro de comunidades lésbicas majoritariamente não-negras?
Eu sinceramente não sei responder.
Por um lado, o termo microcomunidade surgiu de contexto e palavras que só são usades para identidades NHINCQ+.
Por outro, vejo como esse termo pode ser útil para outras comunidades silenciadas, até porque cabem na definição. Pessoas trans que são {identidade} sempre vai estar implicitamente dentro de pessoas trans.
E também existem vezes que essas intersecções possuem termos próprios. Como é que lésbicas podem ser uma microcomunidade em um grupo gay, mas mulheres múlti não podem ser uma microcomunidade em um grupo múlti? Como é que pessoas ultergênero podem ser uma microcomunidade em um grupo trans, mas pessoas intersexo e trans que não usam ultergênero não podem ser uma microcomunidade?
Mas voltando ao lado anterior, só por lésbica e ultergênero serem termos diferentes de mulher gay e de pessoa trans intersexo, isso já contribui para que o grupo maior as exclua. Eu não sei no caso de lésbicas, mas qualquer termo "novo" (como ultergênero) já traz mais desdém na cara de pessoas que não querem ser inclusivas do que a descrição do próprio termo.
Então eu acho que fica meio que a critério de cada pessoa, e meio a critério de como o termo vai sendo usado por aí. Só não levantem os portões à toa.
What makes love romantic or aromantic?
(Hi. I've been reading the AVEN forums for a number of months on and off; I think I'm asexual and probably aromantic.inquisitive (Asexual Visibility and Education Network)
Pensamentos sobre palavras, retóricas e intenção
Sinto que este texto está meio embaralhado demais pra servir como uma boa referência, mas espero poder expressar a importância de tirar certos termos do vocabulário quando pessoas marginalizadas dizem que eles machucam ou contém estigma.
Tipos de termos problemáticos
Algumas vezes, certos termos por si só são ofensivos, mesmo que o contexto do termo não seja. Tais termos podem ser ofensivos por trazerem conotações históricas de xingamentos, estigmas ou categorizações errôneas, ou por terem se tornado formas negativas de se referir a algo através dos tempos e terem eventualmente deixado de ser categorizações.
Por exemplo, se alguém se refere a pessoas que sentem atração pelo mesmo gênero como "praticantes do homossexualismo", mesmo que de forma positiva, ainda é possível que muita gente se sinta desconfortável.
Isso porque tal expressão dá a entender que orientações sexuais se referem apenas a práticas, faz referência ao uso da retórica de que heterodissidência é ou uma doença ou uma ideologia [1], e coloca todas as pessoas que sentem atração pelo mesmo gênero como "homossexuais", uma palavra que não se encaixa para pessoas que sentem atração por mais de um gênero e nem para as pessoas que só se identificam como lésbicas ou gays.
Em casos como este, é possível apenas trocar o termo utilizado para evitar o desconforto alheio.
Outras vezes, os termos são apenas um bônus dentro de uma retórica discriminatória. As razões para tais termos serem ofensivos podem ser as mesmas dos termos acima, mas há o problema adicional do contexto no qual estão inseridos.
Por exemplo, o pai de uma criança não a deixa assistir certo programa de TV por "conter homossexualismo". Neste caso, não importa se ele usasse palavras como "possui representação heterodissidente" ou "contém conteúdo LGBTQIAPN+" ou qualquer coisa do tipo; o problema é ele achar que isso de alguma forma é ruim para uma criança assistir.
De qualquer forma, existe também uma variação na intensidade do quanto cada termo é ofensivo. Ou seja, não é só porque um termo não é tão ruim quanto outro é que não é ofensivo.
Também existem termos que não vão ser ofensivos em determinadas situações, mas que vão ser em outras. Por exemplo, organismos assexuados (que não possuem diferenciação sexual dentro de sua espécie) existem, mas uma pessoa assexual não deve ser chamada de assexuada.
Sobre intenção
Algumas pessoas argumentariam que não há problema nenhum com o primeiro caso, só com o segundo.
O que eu digo em resposta é que o segundo caso é um problema pior do que o primeiro. Retórica sempre vai ser mais danosa do que o uso das "palavras erradas". Porém, não acho que isso signifique que nenhum esforço pode ser feito para que palavras com conotações opressivas saiam do vocabulário.
Pessoas que passaram por situações de abuso, violência ou apagamento por conta de certas palavras podem não se sentir confortáveis com certos termos em nenhum contexto.
Pessoas que sabem que certos termos não deveriam ser usados podem não se sentir seguras entre quem "não se importa com o termo certo porque o importante é entender a mensagem".
Pessoas que sabem das conotações negativas dos termos podem presumir que quem os usa não se importa em combater certo tipo de opressão/discriminação, ou até mesmo concorda com a conotação embutida no uso de tais termos.
Existe também a questão de palavras influenciarem que associações vão ser feitas com cada grupo. Por exemplo, o uso de palavras como homofobia, transfobia e xenofobia faz com que pessoas façam mais associações dessas discriminações com fobias que são neurodivergências, em comparação a discriminações como racismo e misoginia.
De qualquer forma, o uso de termos inadequados sempre lembra as pessoas que sabem que tais termos são inadequados de que certos tipos de opressão ainda são normalizados naquele espaço.
Sobre comunicação
Comunicação é um processo de troca de informações. Um lado precisa expressar algo que o outro lado vai entender.
Muitas vezes, comunicação não tem só a ver com a ideia do que está sendo dito. Uma série de sinais pode complementar a informação das palavras que estão sendo transmitidas. Muitas vezes, a expectativa de certos sinais pode arruinar a informação dada, ou fazer com que pessoas duvidem de sua veracidade, por mais que ela seja boa.
Isso pode afetar muita coisa, mas quero focar aqui em palavras. As palavras que alguém usa podem ser indicativas dos grupos sociais aonde a pessoa está inserida. Quando se trata de grupos marginalizados, é comum que pessoas que tenham mais contato com tais grupos saibam se referir a eles de forma menos ofensiva, enquanto pessoas sem contato nenhum podem nem saber que as palavras que usariam para se referirem a tais grupos são consideradas ofensivas ou inadequadas.
Quando uma pessoa usa "pessoas com probleminha" para se referir a pessoas neurodivergentes, isso dá a pessoas neurodivergentes um motivo para presumirem que esta pessoa possivelmente não as respeita como seres humanos. Talvez isso seja verdade, talvez não. Mas, justamente por capacitismo ser comum, se pessoas neurodivergentes quiserem se afastar e/ou não revelarem sua neurodivergência por essa pessoa, isso deve ser visto como um mecanismo de defesa, e não como "política da pureza" [2].
Sobre alcance
Quando alguém diz que certo termo é opressivo e não deve ser utilizado, o que a pessoa quer dizer é que, ou naquele contexto, ou em qualquer contexto, certo termo carrega um estigma relacionado a discriminação.
Para algumas pessoas, isso pode parecer valorização de linguagem politicamente correta acima da retórica. Porém, só porque certos atos discriminatórios são piores, não significa que outras coisas não contribuem com discriminação.
Quando é só a linguagem que está errada, é só isso que deveria melhorar.
Quando há mais coisas erradas, com certeza há mais coisas a criticar, mas isso não significa que nenhuma crítica pode ser feita à linguagem usada.
Às vezes, é mais fácil criticar palavras sendo usadas, porque geralmente não é necessária muita explicação ao redor disso.
Por exemplo, pode ser muito mais fácil escrever uma postagem dizendo "não usem [palavra] porque literalmente significa [coisa ruim associada a grupo marginalizado]" do que uma postagem que pede para que pessoas reflitam sobre hábitos mais profundos ou histórias sangrentas ou dados negativos de pesquisas.
Em boa parte dos casos, há menos necessidade de reflexão sobre mudanças no vocabulário do que sobre outras coisas, e há menos pesquisa envolvida em expressar o motivo de uma palavra ser ruim do que em expressar o motivo de outras coisas aparentemente inocentes serem ruins.
Porém, tem vezes que é muito difícil criticar palavras sendo usadas, porque tais palavras são consideradas presentes demais no vocabulário comum para mudar o hábito. Por exemplo, por mais que imbecil signifique "sem inteligência" ou "alguém com atraso mental", é comum justificarem o uso da palavra dizendo que em "suas opiniões", o termo só significa algo como ruim/chate/irritante.
É estressante o quanto é fácil ler e fazer postagens sobre o quanto certas palavras são ruins, só para ver pessoas defendendo arduamente o uso de palavras que poderiam ser substituídas com pouca dificuldade. E, sim, existem casos de pessoas que esquecem fácil de certas coisas ou que já possuem dificuldades em achar palavras, mas isso não se aplica na maior parte das defesas.
A eliminação de termos problemáticos por pessoas que podem escolher suas palavras com mais cuidado irá facilitar com que outras pessoas nem precisem refletir tanto sobre como vão substituir alguma palavra já "enraizada".
Sobre a utilização das "palavras certas" enquanto discriminação é perpetuada
Tanto pessoas bem intencionadas que não entendem que o que estão fazendo quanto pessoas mal intencionadas que acham que podem falar o que quiser desde que usem as palavras certas podem disfarçar retórica opressiva com linguagem geralmente usada em espaços antiopressão. E isso é um problema.
Por exemplo, perguntar se certa pessoa não-binária foi designada como homem ou como mulher para assim categorizar tal pessoa em certos estereótipos ainda é cissexista, mesmo que uma pergunta como "você nasceu homem ou mulher" seja ainda mais cissexista.
A conscientização sobre assuntos de forma mais profunda do que termos usados é importante. É importantíssimo saber que a medição de inteligência é opressiva, que sexos não deveriam ser associados a gêneros, que normas de gênero são socialmente construídas e não precisam ser obedecidas por pessoas de qualquer identidade de gênero, que opressões não acabaram século passado, que colonialismo ainda afeta mesmo povos que supostamente ficaram independentes de seus respectivos países colonizadores, que qualquer pessoa merece acesso a ar, saúde, alimentação e moradia independentemente de seu emprego ou da sua capacidade de produzir, que o capitalismo é inerentemente opressivo, etc.
Quando alguém não sabe disso, não é culpa de pessoas que pedem para parar de usar certas palavras e que supostamente não vão além disso (geralmente esse tipo de ativista superficial nem existe). Isso é culpa de uma sociedade que incentiva a reprodução de uma série de ideias opressivas, o que inclui tanto a retórica discriminatória como a normalização de palavras estigmatizadas.
Sobre ressignificação
Ressignificação significa que alguém, ou um grupo, como parte de um grupo marginalizado afetado por uma palavra estigmatizada, usa aquele termo para se descrever de forma positiva.
Por exemplo, quando alguém com atração por mais de um gênero usa bissex para si, esta pessoa está usando um termo usado para descrever mídia pornográfica que contém uma pessoa transando com pessoas de dois outros gêneros ao mesmo tempo como uma parte de sua identidade, ao invés de como um termo que promove a fetichização de identidades multi.
Isso não significa que bissex seja um termo adequado para se referir a qualquer pessoa que não se identifique especificamente com este termo.
Isso também não significa que pessoas bi possam usar bissex como xingamento contra outras pessoas bi (por serem, por exemplo, não-monogâmicas). Isso não é uma ressignificação, isso é apenas contribuir com o significado original da palavra.
Alguns termos foram mais amplamente ressignificados, como gay. Hoje em dia, a maioria não vê gay como um xingamento que perpetua estigma contra pessoas heterodissidentes, apenas como uma identidade. (Ainda assim, é possível que o termo seja usado como xingamento, mas neste caso ele só tem a conotação de associar heterodissidência com algo ruim por conta do contexto.)
Portanto, é importante também ver o contexto onde a palavra estigmatizada está sendo usada antes de, por exemplo, acusar a pessoa de estar perpetuando discriminação. Mesmo assim, o fato de uma pessoa ser afetada por uma palavra não lhe dá o direito de xingar outras com ela e dizer que tudo bem ela usar a palavra porque "está ressignificando" (se está usando como algo negativo, não está).
Links
- ativismo performático / palavras vs ações
- Synonyms and Bigoted Language
- Um guia introdutório para comunidades NHINCQ+ inclusivas
- Postagem com vários links para textos sobre termos e expressões opressives
Notas
[1] O sufixo -ismo é associado com ideologias (como marxismo ou liberalismo). Além disso, o termo homossexualismo era usado em literatura médica para categorizar pessoas heterodissidentes (ou ao menos parte delas).
[2] O termo política da pureza é usado para criticar grupos que tentam excluir qualquer outro que não seja puro o suficiente. É um termo versátil que já foi usado em várias situações diferentes, mas é comum usá-lo para comunidades que se dizem progressivas que atacam qualquer pessoa ou coisa que não seja
Vini :placaAltemenino: (@MemeLord@colorid.es)
Aviso de conteúdo: Expressões e palavras racistas, heterossexistas, capacitistas e afins (textos contém capacitismo/cissexismo/exorsexismo/homonormatividade casual, ironicamente)colorid.es
Quem ganha com a exclusão xenogênero?
(Eu vou focar aqui em questões xenogênero, mas diversas microcomunidades enfrentam problemas similares.)
Quando mencionam a existência de identidades xenogênero, é comum que a reação seja basicamente concern trolling:
- "Na verdade, acho que essas identidades são só isca de fascista pra desmoralizar a comunidade, e você está caindo nelas."
- "Isso é só confusão entre identidade de gênero e gostos/personalidade/modo de se vestir, pessoas não-cis de verdade não se identificariam assim."
- "Essas identidades só confundem as pessoas sobre o movimento; mesmo que sejam reais, é melhor que as pessoas só se digam não-binárias se querem ser levadas a sério."
Confesso que digitar essas coisas me dá tanto nojo quanto digitar argumentos anti-gays ou anti-trans espalhados por qualquer reaça.
E isso não é só porque eu sou pessoalmente afetade por eles, mas também porque silenciam um grupo diverso de pessoas. Essa retórica faz com que um tipo de diversidade interessante e pouco explorada, que deveria ter chance de ter uma voz e de falar de suas experiências, fique isolado em uns cantos em um estado contínuo de ter que suspeitar de qualquer negatividade e de qualquer pessoa que não faça parte desses círculos.
Não dá pra confiar em ninguém
Haviam dois grandes blogs LGBTQIAPN+ dedicados a falar sobre termos para identidades que eram populares. Um deles foi hackeado e deletado, e o outro teve infiltração de alguém com más intenções que resolveu resetar o blog para "não ser mais homomísico" (e começou a usar retórica de feministas radicais e a deixar de validar identidades não-hétero ou não-cis que não eram aprovadas pelo seu novo público monossexista e reducionista de gênero).
Originalmente, os dois blogs tinham certo cuidado com criticar identidades problemáticas e com tentar não aceitar identidades de trolls (a não ser que alguém quisesse ressignificá-las).
Depois disso, o próximo blog que ficou popular não quis ter esses cuidados. É um blog que cataloga qualquer tipo de identidade e que aceita qualquer tipo de envio de termo, sem julgamentos.
Isso criou uma ruptura. Algumas pessoas que aceitavam microcomunidades antes agora começaram a associá-las com a aceitação de termos trolls e problemáticos. Outras pessoas defenderam o blog e foram incentivadas por ele a cunharem identidades menos aceitáveis ainda (mesmo que a maioria não seja necessariamente problemática). Outras se afastaram de ambos estes grupos, aceitando microcomunidades mas tentando manter discernimento.
Independentemente do quanto este blog específico teve influência nisso, a ausência de blogs populares que poderiam ser apontados como recursos bons e a onda de ódio contra microcomunidades fez com que muitas pessoas deixassem de se identificar de forma tão livre em seus perfis pessoais, para evitar serem julgadas por isso.
Enquanto pessoas "ex-xenogênero" (assim como pessoas "ex-assexuais", "ex-MOGAI", entre outras) se sentiram livres para falar de seus relatos de como a liberdade de poder escolher entre identidades demais fez com que elas tivessem escolhido identidades de gênero específicas demais, sendo que depois perceberam que essas identidades eram "inúteis"/"pouco materiais"/"inexistentes"/erradas, pessoas xenogênero no máximo fazem postagens tentando justificar o motivo de xenogêneros existirem, em contas geralmente anônimas para esquivar do ódio inevitável.
Ou seja, temos poucas postagens pessoais de pessoas descrevendo como é ser xenogênero, porque depois de um certo ponto, valia mais a pena calar a boca sobre isso, ou fazer um blog novo pra falar sobre essas coisas mas sem dar informações que poderiam identificar a pessoa em outro lugar.
Isso acaba incentivando a comunidade a ficar no Tumblr e no Discord. No Tumblr, é fácil fazer um blog novo "anônimo", e mandar perguntas anônimas, e já ter contato com a comunidade. Discord também não revela seu endereço de e-mail ou qualquer coisa pra ninguém, então é só fazer um formulário de inscrição para o servidor e pronto! Mais um lugar para fazer amizades.
Mas isso tem consequências:
- Não é possível apontar uma comunidade que tenha nomes e rostos, porque até seu blog preferido pode sumir do nada sem deixar contato;
- Como coloquei acima, relatos pessoais são poucos, e a maior produção da comunidade acaba sendo bandeiras e termos, independentemente de serem coisas com as quais quem as cunha se identifica ou de serem só uma ideia que alguém teve;
- A comunidade não consegue se expandir para lugares que requerem identidades mais fixas e/ou sem uma microcomunidade já estabelecida, porque mesmo espaços não-binários gerais podem reagir com ódio e intolerância.
O ciclo
Com a comunidade isolada, anônima e cansada de ter que se defender, é fácil que trolls realmente finjam ser parte dela.
E é provável que ninguém realmente da comunidade queira tentar ser um exemplo positivo e se expor à intolerância e ignorância, depois do dano ter sido feito.
Isso perpetua a ideia de que todo mundo que se identifica com "termos estranhos" seja troll.
E daí pessoas xenogênero não se sentem seguras em sair do seu canto ou em falar de suas experiências.
Ainda mais quando é fácil achar ódio: é só procurar por termos xenogênero em redes sociais. Stargender. Gendercute. Caelgender. Colorgender. Arithmagender. Cadensgender As vozes defendendo estas identidades ou se identificando com elas vão ser anônimas, enquanto quem faz chacota ou discurso de ódio não tem porque se esconder: sua opinião está dentro da norma.
Assim também é difícil se descobrir xenogênero, ou pensar nessa possibilidade. Quase todo o conteúdo sobre essas identidades é negativo. O pouco conteúdo positivo ainda geralmente é envolto de chacota, intolerância e críticas. E isso impede a comunidade de crescer e se diversificar.
Pode ser mais fácil ignorar essa identificação, ou reduzir a identidade a algo mais aceitável. Ser gênero-fluido ou demimenino ou pessoa não-binária transfeminina já é difícil, pra quê complicar?
Daí, se alguém aparece pra defender, dá pra usar o seguinte argumento: ninguém que se identificaria com isso de verdade teria coragem de admitir, e, portanto, quem usa ou defende estes termos é troll e não merece reconhecimento na comunidade.
O ciclo precisa ser quebrado.
Como quebrar o ciclo?
Histórias xenogênero precisam ser contadas e espalhadas, caso venham de fontes confiáveis.
Ambientes trans e não-binários precisam ser mais positivos para pessoas xenogênero. Façam postagens de positividade e de informação sobre identidades xenogênero, não só sobre identidades trans e não-binárias "mais fáceis de aceitar".
Menos críticas e ceticismo, mesmo que "bem intencionado", por favor. Já temos o suficiente.
A inclusão precisa ser feita com respeito. Não adianta chegar em uma comunidade não-binária e perguntar se alguém ali é gênero-fofo e poderia responder umas perguntas.
Se você é ou convive com pessoas xenogênero, tente (se) perguntar sobre a possibilidade de comunidades/grupos/blogs fora do Tumblr e de chats.
Se você escreve contos ou poemas, faz jogos, etc., tente pesquisar o pouco que há sobre experiências xenogênero, e adicionar representação xenogênero na arte.
E a possibilidade de trolls?
Sempre vão haver trolls fingindo ser estereótipos.
Ao aceitar pessoas xenogênero, a efetividade de trolls vai ser menor; não vão conseguir dividir uma comunidade pela intolerância a algo novo.
Comunidades baseadas em identidades precisam aprender que a exclusão deve ser feita com base nas ações das pessoas, e não com base em usar "termos estranhos".
Aprender a considerar experiências diferentes das suas e acolher pessoas que precisam deveria valer o risco.
Ao excluir pessoas xenogênero, quem ganham são as pessoas que usam a tática da desinformação a favor de enfraquecer comunidades, colocando-as em alerta de uma ameaça que na verdade é um grupo que sofre com questões parecidas.
Ao gastar sua energia fazendo chacota de pessoas xenogênero e falando que são trolls e pessoas que caem em trollagem arruinando a comunidade, isso é mais energia gasta de pessoas que vão tentar discutir com você sobre isso. Inclusão radical faz com que toda esta energia possa ser usada para que a vida de todo mundo seja melhor, não só das pessoas mais próximas de serem levadas a sério.
Sobre maldenominação e impactos na saúde mental
Eu tenho quase certeza que tenho algum tipo de transtorno do humor. Provavelmente sou ciclotímique.
Esta é uma exploração relativamente recente, mas que faz sentido em relação aos meus sentimentos e comportamentos de muitos anos, ao menos desde a adolescência.
Talvez eu queira remédios para isso em algum momento. Mesmo assim, é algo que eu duvido que seria um processo simples. Não tenho vontade de me desgastar com isso no momento.
E este texto, afinal, é sobre isso: sobre o desgaste que é ser uma pessoa não-binária fortemente afetada por circunstâncias externas.
Eu geralmente me apresento usando apenas um conjunto de linguagem, ou, no máximo, dois. Digo que minha linguagem é ze/eld/e, -/eld/e, ou que podem usar ambos os conjuntos -/eld/e e ze/elz/e.
Também aceitaria ed/eld/', -/elx/x, -/éli/e e outros conjuntos que misturam estes. Mas entendo: a maioria só vai usar um conjunto mesmo, e ter escolhas demais pode acabar fazendo com que "desistam dessa neolinguagem" e passem a me maldenominar ou a evitar qualquer linguagem específica com a pouca naturalidade de quem não está nada acostumade com isso.
Enfim, só falo sobre a linguagem que uso quando estou falando com pessoas que acho que deveriam ter contato com a neolinguagem, ou que acho que vão passar tempo comigo o suficiente para deverem saber como se referir a mim da forma certa.
Isso já é um compromisso injusto. Muitas pessoas podem ir a quaisquer lugares sem ter ninguém nunca errando sua linguagem. E se alguém falar que usa o/ele/o ou a/ela/a, é bem mais provável que isso seja respeitado (mesmo que não tivesse sido anteriormente) do que conjuntos como i/éli/i, -/elu/e ou os que eu uso.
Provavelmente muita gente acha que a culpa é nossa: fomos nós que escolhemos não nos sentir bem com a linguagem que foi atribuída a nós sem consentimento. Mas eu não diria que é uma escolha; a diferença é que agora tenho palavras para usar para dizer que estou desconfortável com certa linguagem sendo aplicada a mim, e que existe um jeito de eu não me sentir mal, mesmo que ele seja difícil para pessoas que odeiam descobrir que seu vocabulário "normal" na verdade é impróprio e ofensivo.
Existem soluções para quem não quer me maldenominar e nem aumentar o próprio vocabulário. Essas pessoas podem começar não falando de mim e nem comigo. Ou, caso haja a necessidade de falar comigo, existem formas de fazer isso sem atribuir uma linguagem que me faz mal a mim.
Talvez isso possa parecer radical: ah não, eu estou dizendo que a maior parte da população não deveria interagir comigo!!! Bem, na verdade, eu iria preferir que a maioria da população aprendesse que linguagem pessoal é importante e variável. E não é como se não existissem pessoas binárias, cis ou até mesmo cis + hétero + sem conexão com comunidades NHINCQ+/LGBTQIAPN+ que soubessem como usar a linguagem certa pra mim.
Mas, honestamente, eu não me sinto confortável ao redor de gente que se recusa a mudar seu vocabulário opressivo. E, sendo autista, e tendo a maior parte dos meus interesses em volta de questões NHINCQ+... eu realmente não sei por qual motivo acharia interessante fazer amizade com alguém que "não gosta dessas coisas de gêneros não-binários e neolinguagem"?
A questão é que, possibilidades reduzidas de conhecer pessoas à parte, acho que existe essa impressão de que pessoas como eu "vivemos numa bolha". Como se tivéssemos a oportunidade de viver só entre pessoas que usam a linguagem correta para nós.
Bem, detesto quebrar a fantasia que a bolha de quem pensa que pessoas não-binárias são mega privilegiadas tem, mas a vida não é assim, ao menos não pra mim.
Eu moro em um prédio. Se acontece alguma coisa relacionada a isso, como avisarem que tenho que buscar uma ata da reunião de condomínio, ou reclamarem que estou fazendo alguma coisa fora das regras do prédio, já me maldenominam, porque pessoas privilegiadas acham mais educado se referir a todo mundo como senhor ou como senhora (e daí obrigam as pessoas que estão empregando a fazer isso).
Se eu for comprar alguma coisa, é bem possível que também me maldenominem. Se alguém na rua quiser me chamar a atenção, também. Se algume parente vier falar comigo por telefone ou chat (o que é raro o suficiente para eu não considerar falar sobre minha linguagem), também.
E também ir num salão de beleza, ou num posto de saúde/hospital, ou numa academia aonde há gente atendendo, ou num hotel, ou nume restaurante/lancheria/bar.
Se eu fizer algum curso, vou me preparar para a humilhação de dizer minha linguagem e de não ser respeitade por ninguém, ou de não dizer minha linguagem e pessoas se surpreenderem e reagirem mal quando eu corrigi-las ou pedir para parar de usar certas palavras ou pedir para não presumirem meu gênero.
Se eu for em uma roda de conversa, se tiver muita sorte pode ter alguma obrigação em declarar conjuntos de linguagem (ou pelo menos só os pronomes). Mesmo assim, a maioria das pessoas não tenta lembrar ou checar a linguagem alheia, e lá vai a maldenominação, mesmo que eu esteja com "ELD" ou com "ZE/ELD/E" gigantes em ume adesivo, crachá ou placa.
Se eu estiver junto com amigues de amigues/parceires, é comum me chamarem em separado para declarar como acham minha linguagem difícil e podem errar no início. O que também é uma bosta, porque só está chamando a atenção para o quanto "eu estou complicando as coisas".
Eu garanto que cada uma dessas coisas dói. Que cada uma dessas coisas pesa.
E, enquanto parte da minha vida é produtiva e tenta fazer o máximo possível, a outra é ideação suicida, improdutividade e/ou choro infinito sobre como minha situação é inevitável independentemente de quantos textos e explicações eu faça.
Então não deveria ser tão absurdo assim eu querer evitar essas situações de maldenominação. Menos maldenominação = qualidade de vida melhor.
Eu estou falando isso por mim, obviamente, sobre uma forma de eu conseguir lidar com meu transtorno de humor, mesmo que ele seja ativado por coisas negativas e mesmo quando uma coisa negativa acontece muito frequentemente comigo por ela ser vista como normal.
Mas eu não acho que meu caso deveria ser o único considerado válido. Eu acho que pessoas que usam quaisquer conjuntos devessem ser respeitadas independentemente do quanto sofrem quando são maldenominadas.
Quando eu comecei a usar neolinguagem pra mim, achei que não seria tão complicado: afinal, na maior parte dos casos, é só trocar uma letra!
Mas, não, parece que precisa sempre haver um conflito desgastante e outras pessoas em volta aderindo até que a maioria considere que respeitar minha linguagem possa ser uma opção.
Eu não gosto de escrever coisas pessoais, especialmente quando dão munição para quem quer me machucar. Mas acho que este texto é importante, por dois motivos.
- Pessoas cujos conjuntos de linguagem pessoal diferem de o/ele/o e de a/ela/a: vocês não estão sozinhes. Existem pessoas como vocês, que precisam viver no dia-a-dia e não só em grupos onde suas linguagens são respeitadas. Vocês merecem que seus conjuntos sejam aceitos tanto quanto pessoas que usam conjuntos padrão.
- Pessoas que tratam a/ela/a e o/ele/o como as únicas linguagens existentes: parem de pensar que vocês são as únicas pessoas que "merecem ser exceção" para aprender a usar conjuntos fora do padrão. Parem de pensar que neolinguagem é uma brincadeira e que só trolls usam "pronomes estranhos". Somos pessoas também.
Se você realmente gosta das pessoas ao seu redor que usam conjuntos de linguagem que parecem difíceis para você, faça o esforço ou leve a sério o fato de que você está contribuindo para crises depressivas, automutilação e ideações suicidas dessas pessoas. A sociedade em geral é responsável, mas você também está contribuindo.
O apoio superficial às pessoas não-binárias
Nota: Estou cansade demais para adicionar links. Se você não sabe o que é certo termo, use a função de pesquisa do navegador para procurar pelo termo aqui ou aqui.
Uma série de questões me incomoda faz tempo, e inclusive já falei dessas coisas em momentos e lugares separados. Mas acho que todas essas questões são conectadas a dois problemas específicos (que também se complementam), e por isto estou aqui fazendo este texto que conecta tudo.
Com o aumento da visibilidade de pessoas não-binárias nos últimos tempos, houve não só um aumento na quantidade de pessoas se identificando como não-binárias, como também nas pessoas que tentam incluir pessoas não-binárias em seus trabalhos, mesmo que de formas pequenas. Eu entendo que para um grupo tão abandonado como pessoas não-binárias, qualquer representação ou inclusão possa virar motivo para comemoração, mas há duas raízes principais que acredito que sejam a causa de muitos problemas:
- A exaltação da figura não-binária "justificável"
Existe uma exigência em vários graus de que exista um motivo para pessoas ou personagens serem não-bináries. Isso não é algo novo: desde gamers querendo justificativas para personagens principais serem mulheres ou negres até pessoas queermísicas procurando motivos para alguém real ser multi, lésbica, trans ou de outras identidades NHINCQ+, é um problema de pelo menos muitas décadas. Mas não significa que não possa ser apontado mesmo quando pessoas não-binárias ou supostes aliades fazem isso.
Muites personagens não-bináries são não-bináries por essencialmente "não terem sexo" ou "serem fusões de homem com mulher". Não me venham com "alô Steven Universe, hehehe", porque tem muitos outros lugares onde isso ocorre. Os poucos papeis não-binários de séries que precisam de atories reais geralmente são preenchidos por pessoas consideradas "fisicamente andróginas". Muitas matérias sobre pessoas não-binárias entram em detalhes sobre a corporalidade intersexo de tais pessoas, sendo que, ainda que pessoas não-binárias possam sentir que são não-binárias apenas por serem intersexo, focar nisso é um desserviço a pessoas binárias intersexo e a pessoas não-binárias perissexo.
Especialmente na ficção, parece que há uma tentativa de construir uma narrativa de "personagens não-bináries cis"; não há nenhuma pessoa trans binária na história, mas há personagens que são não-bináries por motivos que não seriam possíveis por pessoas não-binárias reais. Tais personagens também geralmente possuem suas identidades e seus conjuntos de linguagem respeitades por todo mundo.
Não é como se todas as mídias que retratassem pessoas não-binárias precisassem ter personagens não-bináries humanes, que não sejam fusões e/ou altersexo, e que sofressem discriminação; mas há uma ausência de mídia popular que possa ensinar pessoas binárias a tratarem/entenderem melhor pessoas não-binárias.
- O apoio a um trinário de gênero
A maioria das pessoas - e isso inclui muita gente não-binária - quer que pessoas não-binárias tenham os mesmos direitos básicos de pessoas binárias, mas não querem ter o "trabalho" de realmente reconhecer uma diversidade de vivências não-binárias.
São as pessoas que falam que rótulos como homem não-binárie e mulher não-binárie não fazem sentido, ainda que não se importem com explicações que digam que pessoas não-binárias "estejam em qualquer ponto no espectro de gênero entre homem e mulher". São as pessoas que só conseguem descrever pessoas não-binárias como "aquelas que não gostam de rótulos", ou como "sem gênero nenhum", ou como "entre homem e mulher". São as pessoas que apoiam a existência de um conjunto como le/elu/e ou ê/elu/e e que querem que vire oficial, mas que tiram sarro de ou criticam fortemente qualquer outra forma de neolinguagem.
(Também podem ser as pessoas que apoiam e se referem a pessoas não-binárias com a linguagem correta, mas que não ousariam usar -/elu/e ou similar para se referir a grupos que contém pessoas binárias, preferindo usar @/el@/@, x/elx/x ou "todes, todas e todos" ou outra coisa que seja mais aceita entre gente binária.)
São as pessoas que "acham problemático" se alguém se disser não-binárie por causa de trauma, neurodivergência, intersexualidade, raça, orientação ou outras experiências, porque querem que todas as pessoas não-binárias só se identifiquem assim porque "nasceram não-binárias". São as pessoas que falam que os rótulos que ajudam pessoas a localizar as próprias identidades de gênero de formas menos genéricas são nocivos para a comunidade. São as pessoas que se recusam a não categorizar pessoas que não são homens e nem mulheres de alguma forma que não seja não-binárie, mesmo que isso não faça sentido dentro da cultura de tais pessoas.
Isso tudo porque querem que não-binárie seja apenas mais uma categoria ao lado (ou no meio) de homem e de mulher, sem nenhuma sobreposição ou complicação ou diversificação. Querem aceitação não-binária, mas só num trinário de gênero restrito que também atrapalha muita gente não-binária.
Acho que já deu pra entender porque considero que estes problemas existem, mas quero elaborar mais sobre o motivo desses problemas serem problemas. Porque muita gente passa pano demais pra essas coisas, afinal, novamente, representação e inclusão não-binária é rara. E tudo bem considerar isso um progresso a um exorsexismo ou apagamento total, mas também não dá pra ignorar que ainda existem problemas aí.
Não-binaridade não é uma teoria ou hipótese; é a experiência vivida de muita gente. E há uma quantidade imensa de pessoas intolerantes ou ignorantes em relação à não-binaridade, o que causa inúmeros problemas pra nós.
Por isso, é importante ter mídia que normalize pessoas não-binárias com as mais diversas experiências: pessoas não-binárias racializadas, gordas, que usam o/ele/o, que usam a/ela/a, que usam -/-/-, que são perissexo, que são intersexo, que fazem transição corporal, que não fazem transição corporal, que foram designadas com gêneros diferentes ao nascimento, que usam diversos rótulos além de não-binárie, que usam neolinguagem em seus conjuntos, que usam mais de um conjunto, que decidem mudar de nome, que possuem nomes tipicamente "de homem" ou "de mulher", que inventam seu próprio nome ou usam um nome "estranho" para que não haja gênero associado com ele, que possuem as mais diversas expressões de gênero, e afins. E, por mais que outras possibilidades também sejam interessantes e possam ser boas representações, precisamos sim ter personagens não-bináries que sejam humanes e que sejam abertamente não-bináries na história. A ausência disso faz com que muitas pessoas nem tenham um ponto de partida quando alguém diz que é não-binárie, o que dificulta a comunicação e aceitação.
Também é importante espalhar que não-binaridade não é uma coisa só. Existem pessoas gênero-fluido, ambigênero, aporagênero, xenogênero, neurogênero, gênero-orientação, gênero-cinza, agênero, gênero neutro e afins, e isso tudo pode coexistir. Rótulos mais específicos fazem parte das identidades de várias pessoas não-binárias, e tentar censurá-los também é rejeitar partes das identidades de pessoas não-binárias, por mais que "de resto esteja tudo bem ser não-binárie".
Se existem pessoas sem gênero que usam a/ela/a e demimulheres que usam o/ele/o, também não faz sentido insistir em categorizar a/ela/a como conjunto feminino e o/ele/o como conjunto masculino. E, visto que um trinário de conjuntos de linguagem ignora as necessidades e expressões identitárias de muitas pessoas não-binárias, insistir que neolinguagem precise ser restrita a um conjunto só também machuca e invalida muita gente não-binária. Não somos de um gênero só, de uma expressão de gênero só ou de uma corporalidade ou corporalidade desejada só, então não há porque nos tratar como se só merecêssemos uma linguagem só (muito menos uma que também seria usada para pessoas de linguagem indefinida, como se não pudéssemos ter identidades próprias separadas da indefinição).
Orientações voltadas a pessoas não-binárias também precisam ser divulgadas. Muita gente parece ter a noção de que identidades não-binárias "não contam para atração", e de que pessoas atraídas por pessoas não-binárias sem serem atraídas pelos dois gêneros binários só podem usar identidades como gay, lésbica e hétero. Isso é apagamento, não importa o quanto você acha que a pessoa binária só pode se atrair por pessoas não-binárias que "pareçam tal gênero". Pessoas toren e trixen são multi, e também podem dizer que são bi e/ou poli se quiserem.
E muita gente acha que pessoas não-binárias são "sempre bi ou pan ou assexuais/arromânticas" porque "não conseguem diferenciar entre gêneros" ou "não ligam pra gênero". Isso novamente é um reducionismo da variedade de experiências não-binárias ao que pessoas binárias quer que nós sejamos; uma massa só que não gosta de rótulos ou que só é não-binária por não entender gênero (ou, em certos casos, por não sentir atração por ninguém). Existem pessoas não-binárias viramóricas, feminamóricas, cetero/medisso e/ou que preferem certo gênero a outros. Existem muitas pessoas não-binárias multi e/ou a-espectrais, inclusive pessoas que ligam isso com sua não-binaridade de alguma forma, mas, novamente, isso não vale pra todo mundo.
Como pessoa não-binária, vejo muita gente só usando alguma linguagem que não seja o/ele/o como neutra quando têm certeza ou certa suposição de que existem pessoas não-binárias na audiência, e eu não acho isso muito legal. Geralmente essas pessoas tropeçam bastante (como em "es pessoes" ou "todes os alunos"), e, além de passarem vexame, também demonstram que só ligam para fazer mudanças no vocabulário quando podem performar para uma audiência que aprecie isso, e não se esforçam para normalizar isso entre pessoas binárias. Também existe a presunção de que pessoas não-binárias só existem em espaços "LGBT", espaços ativistas e/ou alternativos com maioria jovem ou redes sociais, e não em outros ambientes.
Como administradore de espaços como Orientando.org e Colorid.es, também percebo a quantidade de gente que se interessa nestes projetos e que quer se socializar nestes lugares, até que percebe que neles há alguma exigência de respeitar conjuntos diferentes de a/ela/a e de o/ele/o, e de respeitar identidades diferentes de lésbica, gay, bi, trans, e talvez intersexo e/ou assexual. Porque daí é "coisa demais", é "estranho", é "desconfortável", é "anti-LGBTs de verdade", é "militância demais", porque aparentemente respeito à diversidade só conta se a pessoa já conhecia tal diversidade antes e não precisaria se preocupar em conhecer vivências novas.
Independentemente de você ser não-binárie ou não, pense se seu apoio à causa não-binária acaba ou freia quando você tem que botar conforto não-binário acima do conforto binário. Quando vivemos em uma sociedade exorsexista, falar de exorsexismo casual vai ser desconfortável para quem quer ser "livre de preconceito" e "à favor da diversidade" (e isso vale para diversas outras questões também).
Conceitos e termos sobre opressão e discriminação
Nota: esta lista pode ser atualizada à medida que questões de opressão e discriminação são desenvolvidas e novos termos são cunhados. Há vários sistemas que seguem uma ideologia de exclusão e segre…Alternative
Eu também ignorei essas coisas no começo
Aviso de conteúdo: Eu não vou dizer disso da forma que geralmente digo, mas o que tem aqui não deixa de ser reducionismo e discriminação contra identidades NHINCQ+ menos conhecidas. Também falo bastante sobre linguagem obsoleta e experiências no Tumblr.
Ah é, e os links no texto são para explicar a terminologia utilizada, para ajudar pessoas que não sabem tanto sobre vocabulário NHINCQ+.
Quando eu tinha uns, sei lá, 13 ou 14 anos, estava na moda usar trans* como um termo inclusivo de pessoas trans. A justificativa, na época, era que trans cobria pessoas transgênero, transexuais, bigênero, agênero, sem gênero, genderqueer, gênero-fluido e afins (a palavra não-binárie ou não era popular ou não existia na época).
Hoje em dia, considera-se que estas pessoas, e outras pessoas não-cis, ou se consideram trans sem precisar de um asterisco, ou não querem ser inclusas em um asterisco e sim em outra palavra. Mas era comum achar isso o ápice da inclusão até o meio desta década.
Enfim, o ponto não é esse. O ponto é que, eu nunca tinha visto aquelas palavras antes, ainda que tivesse uma vaga noção do que eram homens e mulheres trans.
Eu não lembro se a postagem que mostrou estes termos tinha termos traduzidos ou não. De qualquer forma, lembro que tentei pesquisar por cada termo, e minhas buscas não me trouxeram quase nada de útil.
Porém, eu consegui achar definições para alguns dos termos. A única que me lembro o que achei sobre é bigênero, e a identidade estava definida como algo do tipo "alguém que acorda alguns dias se sentindo homem e em outros se sentindo mulher, e que pode usar roupas diferentes para sinalizar isso". Acho que a definição tinha alguns parágrafos, mas basicamente reduzia alguém bigênero a alguém gênero-navalha homem/mulher, como se a pessoa não pudesse ter dois gêneros ao mesmo tempo, ou ter gêneros que não fossem binários.
Não lembro se cheguei a descobrir sobre pessoas completamente fora do binário naquele dia. Porém, vale pensar que esse conhecimento só foi absorvido por mim como curiosidade, e não como realidade.
Eu não cheguei a pensar nos tipos de desrespeito que uma pessoa que fosse mulher em certos dias e homem em outros pudesse passar. Ou na possibilidade de pessoas ao meu redor quererem tratamento diferente a cada dia.
Eu também soube por esta época que a linguagem inclusiva tinha trocado de @/el@/@ para x/elx/x, para incluir pessoas que não são homens ou mulheres. Mas nunca cheguei a pensar: que linguagem estas pessoas usariam normalmente, então? E se vejo todas as pessoas como homem ou como mulher e atribuo o/ele/o ou a/ela/a, respectivamente, como eu poderia respeitar pessoas cuja linguagem e/ou cujo gênero não é binário?
Se você não entende o que é x/elx/x ou o/ele/o ou afins, clique aqui.
Eu entendo que só saber de coisas assim não vai necessariamente mudar a vida de qualquer pessoa. Mas eu já tinha informações suficientes para pensar em como eu era/poderia estar sendo cissexista, e que talvez eu devesse ir atrás de informações sobre como não ser assim.
Eu me descobri assexual quando tinha uns 16 ou 17 anos. Foi numa daquelas postagens de Tumblr com esta imagem (estou colocando este link porque também explica alguns dos problemas com a imagem, mas assim como o uso do termo trans*, isso não é importante no momento).
Quando eu vi tal imagem, pela primeira vez me senti representade em alguma identidade. Já que eu não conseguia ver as poucas instâncias de atração romântica que tive na adolescência como reais, por conta da falta de atração sexual, a única forma que eu conseguia me entender era como alguém que não sentia atração por ninguém. E a ideia que tentavam tanto empurrar na escola de que eu sentia atração exclusivamente pelo gênero o qual achavam que eu era por eu não ser ou demonstrar ser hétero simplesmente não fazia sentido pra mim.
Eu tinha uma orientação sexual agora. Depois, meu entendimento das minhas atrações mudaria bastante, mas, com as informações que eu tinha, assexual era um rótulo completamente preciso.
Mesmo assim, no máximo eu achava que era uma pena que eu não tinha ninguém para falar sobre isso de forma presencial, ou que eu não tivesse tido esta informação em momentos que eu precisava ter me afirmado como alguma coisa para que não inventassem mentiras sobre mim.
Eu não tinha pensado em como, mesmo sabendo da existência da sigla LGBT, ela era obviamente limitada, visto que o gráfico que passei contém várias orientações que não estão em tal sigla.
Eu não tinha pensado em pesquisar espaços LGBT na minha área, já que eu havia sofrido bullying heterossexista e não era hétero.
Eu não tinha pensado nem em perguntar para pessoas heterodissidentes que eu conhecia se sabiam de algum espaço assim.
Novamente, eu entendo que nem todo mundo que passa por essas coisas vai querer "ligar pra isso", buscando uma comunidade ou lutando para que a próxima geração não tenha que lidar com desconhecimento, confusão e discriminação.
Mas a possibilidade nem passou pela minha cabeça naquela época.
Alguns anos depois, eu fui usar o Tumblr para interagir com um lado mais feminista da fandom de My Little Pony, porque o fórum que eu frequentava estava cada vez mais hostil a essas ideias.
Como fiz uma conta nova, quis ir atrás de blogs feministas para seguir também. E, com isso, também tive mais contato com questões LGBTQIAP+ (esta é realmente a sigla que boa parte usava na época!), o que também me incentivou a pesquisar mais sobre o assunto. Acabei seguindo uns blogs assexuais também; eu me identificava somente como demissexual, mas sabia que esta identidade era parte do espectro assexual.
Grande parte das feministas que eu seguia eram bissexuais, o que me fez aprender bastante sobre monossexismo, exclusão multi e afins. Também aprendi bastante sobre pessoas trans e um pouco sobre pessoas não-binárias; como deu pra ver, o meu envolvimento com essas questões tinha sido extremamente superficial até o momento.
Eventualmente, me deparei com o blog pride-flags-for-us, que, na época (ele foi deletado e refeito eventualmente), era um paraíso da inclusão. Esse tipo de blog tinha que ter padrões para ser levado a sério, então ideias suspeitas demais, capacitistas ou cissexistas eram recusadas. O blog também não publicava bandeiras de grupos de fora da comunidade, então era apenas uma coleção imensa de identidades marginalizadas, onde a maioria não tinha nenhuma visibilidade.
Minha reação inicial ao ver o blog não foi de nojo ou de insegurança, mas também não foi de felicidade ou de pertencimento.
Eu achava legal que pessoas não estavam se limitando às poucas identidades mais conhecidas, mas ao mesmo tempo... aquilo parecia ser um recurso para pessoas que estavam questionando, não para mim. Eu estava segure em relação à minha orientação sexual, pensava que minha orientação romântica seria ou hétero ou bi, e, mesmo que considerasse a possibilidade de talvez não ser cis devido às infinitas formas de não pertencer ao binário de gênero, estava relativamente confortável em minha cisgeneridade.
Fechei o blog, sem o seguir ou divulgar.
Eu poderia ter pensado no quanto estas identidades eram esculachadas e invisibilizadas, e em como eu poderia ajudar a combater isso.
Eu poderia ter pensado no quanto estas informações potencialmente importantes não estavam nem acessíveis a quem não sabia inglês.
Eu poderia ter pensado no quanto precisávamos divulgar mais identidades a-espectrais além de demi e gris, no quanto pode ser difícil entender o próprio gênero sendo que é difícil achar informações sobre identidades não-binárias que não sejam relacionadas ao binário de gênero, à neutralidade ou à ausência de gênero, ou no quanto a maioria das pessoas ainda não conhece nenhuma ou quase nenhuma orientação que inclua pessoas não-binárias de forma explícita (como viramórique, trixen ou cetero/medisso, embora a maioria destes citados nem existisse na época).
Mas eu simplesmente não percebi a maior parte destes problemas, além de não ver aquilo como problema meu. Eu via discriminação como um problema que eu não queria ajudar a perpetuar, mas eu também não quis ter um papel ativo em combater tal discriminação.
Quando meu blog de My Little Pony começou a ter gente seguindo e interagindo, eu criei um hábito de checar os blogs dessas pessoas.
Era comum que as pessoas não-binárias com rótulos mais "obscuros" (os quais geralmente eram neurogêneros ou xenogêneros) tivessem entre 13 e 17 anos. O que fazia sentido pra mim, que já sabia de noções básicas de discriminação contra pessoas não-binárias e contra rótulos "diferentes", e assim concluí que estas pessoas esconderiam ou sua não-binaridade ou ao menos seus rótulos mais específicos quando tivessem uma necessidade maior de serem respeitadas.
(Este é obviamente um pensamento bem pessimista e desrespeitoso. Assim como ser gay ou bi não deveria ser algo visto como uma fase ou como uma coisa a ser escondida, ser gênero-estrela ou autigênero também deveria ser aceitável em qualquer idade.)
Enfim, uma vez eu notei uma pessoa nova me seguindo, e vi que a pessoa era xungênero e verangênero. Imaginei que fosse outre adolescente. Mas vi mais sobre o perfil da pessoa, e descobri que ela era mais velha que eu.
Novamente, não é legal que esta tenha sido minha reação, mas isso me chocou. Isso abria novas possibilidades para mim, porque não só mostrava que eu poderia usar rótulos pouco reconhecidos sem ser um sinal de infantilidade, como também confirmava que o combate a discriminação contra identidades incomuns é algo que vale para qualquer idade, não só para adolescentes que estão se descobrindo e que depois vão se contentar com rótulos mais discretos.
Alguns meses depois, minha namorada se abriu como trans. Ela passou um bom tempo não tendo muita certeza de sua identidade de gênero, e foi a partir daí que eu comecei a ter que pesquisar sobre quais são os rótulos existentes que poderiam servir, para ajudá-la.
Depois disso, comecei a questionar minha própria identidade de gênero, e novamente tive que fazer mais pesquisas.
Eventualmente, percebi que deveria estar trazendo estas informações para outras pessoas, para que pudessem pesquisar ou entender sem eu ter que explicar ou traduzir sozinhe todas as vezes.
E foi daí que vieram publicações, sites, comunidades, blogs, contas e outras coisas que fiz e faço até hoje.
Decidi me abrir sobre isso por dois motivos. Um deles é eu ter pensado sobre o quanto esses artigos de jornais/revistas virtuais mal pensados sobre ser não-binárie, variorientade, assexual, etc. (que me recuso a passar links) realmente afetam a percepção das pessoas sobre esses grupos.
É sempre bom ter informações adequadas para referenciar, e é sempre ruim ter informações que estereotipam ou excluem pessoas dos grupos que pertencem.
Porém, será mesmo que há uma grande quantidade de pessoas que vai ver essas coisas como causas novas para lutar, possibilidades de ser ou possibilidades de outras pessoas serem?
Ou será que vai acontecer que nem aconteceu comigo, de ignorar praticamente todas as informações que não se aplicavam a mim ou a pessoas que eu conhecia?
Esses artigos geralmente não falam de discriminação como algo que pode ser passivo, e também não induzem pessoas a incluir a possibilidade de mais vivências em seu dia-a-dia. Geralmente só colocam essas identidades como curiosidades raras que a maioria das pessoas não precisa se preocupar com as ramificações.
Podem ser um ponto de entrada para quem se identifica com aquilo, ou algo a ser vagamente lembrado para quem faz questão de odiar a maior quantidade de grupos possível. Mas não são o fim do mundo, afinal, quem quer saber sobre mais informações vai pesquisar até achar fontes melhores. E a maioria nem vai querer saber sobre mais informações, só vai ignorar e esquecer o assunto.
A outra coisa que pensei é no quanto a maioria das pessoas não espalha o conteúdo que eu faço, ou que outras pessoas fazem sobre assuntos similares.
Será que é porque, para pessoas que passivamente leem o que escrevo, pessoas não-binárias, xenogênero, variorientadas, do espectro assexual, do espectro arromântico, etc., são só curiosidades que não afetam suas vidas a não ser que queiram interagir comigo ou com uma ou outra pessoa?
É por isso que as pessoas ignoram o quanto usar artigo/pronome/final de palavra é importante? Ou que a palavra exorsexismo é mais adequada do que binarismo de gênero para falar da discriminação contra pessoas que não se encaixam no binário homem x mulher? Ou que orientação é uma palavra mais inclusiva do que sexualidade ou orientação sexual? Ou que não é nada legal ser maldenominade porque a maioria pensa que pode atribuir gênero e linguagem com base na aparência?
É por isso que sempre me elogiam muito pelo quanto eu fiz de conteúdo para a comunidade e pelo quanto ensinei a elus, enquanto a maioria das postagens daqui só recebe compartilhamentos (raros) das mesmas pessoas? Enquanto eu não vejo mais praticamente ninguém tentando trazer termos que ainda não possuem traduções em português, ou tentando fazer conteúdo NHINCQ+ que seja original e inclusivo? Enquanto esta caixa de perguntas, que deveria ser um recurso útil e interativo, praticamente não é usada?
Não acho que ninguém tem a obrigação de se dedicar constantemente a uma causa, seja a sua, seja alheia. Eu diria que a única obrigação é se informar a ponto de não discriminar e de evitar contribuir com opressões.
O que trago aqui é uma reflexão sobre minha própria inatividade no passado, com a esperança de que alguém que só esteja precisando de um empurrão para fazer algo passe a fazer.
Se você quer isto, aqui está uma sugestão de por onde começar: Uma postagem rápida sobre conteúdo que seria bom ter na comunidade NHINCQ+
queerascat
valeria-lagrimas: queerascat: litwickweer: lgbtq-plus-ask-blog: Made by @queerascat No. No no no. This won’t do. This needs to stop being spread. Stop re-defining identities to exclude people.queerascat (Queer As Cat)
Exorsexismo
Há alguns anos, eu criei este tópico para falar de exorsexismo, que na época era um conceito mais novo do que é hoje. Ainda considero um recurso bem completo, mas acho legal ter mais lugares falando de conceitos como este.
Exorsexismo é a opressão e discriminação contra pessoas que não são somente, completamente e sempre homens ou somente, completamente, e sempre mulheres. Ou seja, exorsexismo afeta:
- Pessoas que não são nem homens e nem mulheres, seja por não ter gênero, seja por ter um ou mais gêneros diferentes destes;
- Pessoas que são bigênero homem/mulher (ou ambigênero, ou gênero-fluido, ou similar que tenham estes gêneros);
- Pessoas que são parcialmente homens ou mulheres, como homens-vagues, mulheres-cinza, demimeninos, quivermeninas, etc.;
- Homens e mulheres não-bináries, agênero, sem gênero, etc.;
- Pessoas transfemininas e transmasculinas não-binárias, ou que não se reinvindicam como mulheres e homens bináries;
- Pessoas de gêneros indefinidos (como pessoas pomogênero);
- Pessoas que consideram que certo fator externo é parte do seu gênero e que por isso seu gênero não é binário (isso inclui várias pessoas neurogênero, intergênero, gênero-orientação, egogênero, etc.);
- Pessoas cujas identidades de gênero são ou eram aceitas dentro de sua sociedade, mas que diferem de homem e de mulher e que portanto são apagadas, demonizadas e afins em sociedades brancas eurocêntricas cristãs;
- Travestis que não se consideram 100% homens ou 100% mulheres;
- Qualquer outra pessoa que poderia se denominar não-binária caso quisesse.
Talvez também afete pessoas de sociedades aonde existem concepções diferentes de homem e de mulher em relação à sociedade branca eurocêntrica cristã, mas não sei sobre o assunto o suficiente para opinar, e só li um único texto sobre o assunto que também não trazia uma conclusão.
Enfim, tudo isso pode ser óbvio quando se diz que exorsexismo é a opressão contra pessoas não-binárias, mas existem grupos afetados por exorsexismo que não se consideram não-binários, assim como existem pessoas que não têm certeza se contam como não-binárias ou como afetadas por exorsexismo por serem homens e mulheres, ou parcialmente/quase homens, ou parcialmente/quase mulheres. Mas a sociedade exorsexista não inclui pessoas que às vezes são homens e às vezes são mulheres, ou que possuem algum gênero parecido com o binário mas que não é binário.
Exemplos de exorsexismo
Algumas pessoas acreditam que exorsexismo pode ser resumido como "apagamento não-binário". Além do problema de categorizar pessoas que não querem ser chamadas de não-binárias como não-binárias, exorsexismo vai além de apagamento.
Sim, um exemplo de exorsexismo é o apagamento. É o uso de "homens e mulheres" como se isso estivesse incluindo todo mundo. É a ausência de personagens não-bináries na ficção. É a insistência da mídia de só fazer algum único artigo quando alguma celebridade se abre como não-binária, e nunca mais mencionar o fato ou repensar o uso da linguagem usada para se referir a essa pessoa.
Mas também existem outros fatores.
Quando as possibilidades de gênero são alguma variação de "homem ou mulher", de "homem, mulher ou prefiro não dizer" ou de "homem, mulher e outro", isso não dá espaço para pessoas se afirmarem como suas próprias identidades de gênero se elas não são binárias.
Quando alguém é gênero-fluido mas não consegue a possibilidade de mudar seu gênero e/ou nome de tempos em tempos em registros de todos os tipos (ou de colocar que é gênero-fluido), isso é um limite que afeta pessoas gênero-fluido que não afeta outras pessoas.
Quando alguém diz que "só existe homem e mulher, o resto é transtorno mental", é um ataque a pessoas que não são homens ou mulheres, além de ser um ataque capacitista porque usa a existência de transtornos mentais como algo ruim que invalida experiências pessoais.
Quando só existem banheiros para homens e mulheres, pessoas que não são de um desses gêneros não estão sendo contempladas. Quando dizem que outras pessoas podem usar qualquer um desses banheiros, isso não considera o quanto de medo alguém pode ter de assustar mulheres ou de apanhar de homens, assim como não considera a disforia que alguém pode ter em entrar em um banheiro de uma identidade de gênero diferente da sua.
Quando símbolos para coisas que são para todas as pessoas são uma combinação de símbolos de homens e de mulheres, talvez isso seja apagamento, mas talvez seja uma exclusão proposital mesmo.
Quando há tantas coisas na sociedade que possuem medidas separadas para homens e para mulheres, isso também é algo que prejudica a aceitação e inclusão de pessoas que não são homens ou mulheres.
Quando pessoas que possuem identidades de gênero parecidas com mulher ou com homem precisam se reduzir a um gênero binário porque pessoas em volta não entendem/aceitam algo mais complexo, isso também é exorsexismo.
Quando pessoas só conseguem colocar em palavras como é seu gênero comparando com uma metáfora, porque ele não pode ser simplesmente descrito como homem, mulher, masculino, feminino, neutro, entre essas coisas ou como algo separado disso, é comum que pessoas binárias (e até pessoas não-binárias que querem se mostrar "superiores" a isso) façam chacota, espalhem capturas de tela de pessoas explicando esses gêneros para ridicularizá-los e afins.
Quando acham muito bonito quando alguém descreve seu gênero com uma metáfora poética, mas ridicularizam ou rejeitam quem usa algum termo específico para resumir tal metáfora, isso é prejudicar a expressão de pessoas cujas identidades de gênero não são binárias.
Quando reduzem não-binaridade a uma questão de expressão de gênero, de não entender que ninguém é completamente um estereótipo de homem ou de mulher, ou a uma questão de "querer ser diferente" ou de "estar na moda", isso também é exorsexismo.
Quando a língua possui dois "gêneros gramaticais" e um deles é associado com homens e outro com mulheres, isso é exorsexismo estrutural. Quando as pessoas que concordam que deveria existir um "gênero gramatical neutro" dizem que só pode existir um, e que ele é tanto para pessoas não-binárias quanto para grupos com pessoas que usam conjuntos de linguagem diferentes quanto para quando não se sabe o conjunto de linguagem de alguém, isso é exorsexista; pessoas não-binárias precisam abrir mão de ter conjuntos de linguagem que as representem separadamente mesmo que não queiram usar algo neutro ou associado com gêneros binários, enquanto pessoas binárias podem ter os seus separados e normalizados.
Exorsexismo faz parte do cissexismo (opressão/discriminação contra pessoas que não são cis), mas existem questões que afetam pessoas não-binárias e que não afetam pessoas trans/ipso/ulter/etc. binárias, ou afetam mas em menor quantidade. (Caso você não tenha entendido vários dos termos deste parágrafo e queira entender, clique aqui.)
Mas e as pessoas trans binárias?
Algumas pessoas acham que se pessoas que não são binárias possuem um termo para sua opressão, isso é dizer que pessoas trans binárias sejam praticamente iguais a pessoas cis, no sentido de ter privilégio binário.
Pessoas trans (e outras pessoas cisdissidentes) binárias realmente não são atingidas diretamente por muitas das agressões e por muitos dos apagamentos que pessoas que não são binárias sofrem.
Porém, pessoas trans (e outras pessoas cisdissidentes) binárias também passam por um problema específico delas dentro do cissexismo, que é uma exigência exagerada para que se encaixem nas normas do seu gênero para provarem que são realmente dele.
Pessoas que se reinvindicam não-binárias são invalidadas; dizem que isso não existe, que ou você é mulher ou homem. Mas pessoas cisdissidentes que se reinvindicam como binárias também são questionadas; afinal, se são "homens de verdade" ou "mulheres de verdade", por que fazem isso, passam por aquilo ou possuem certos aspectos corporais? Se um homem ipso mostra aspectos corporais ou comportamentais considerados femininos numa sociedade eurocêntrica, é "meio mulher" ou "mulherzinha", mas se uma pessoa com as mesmas características se reinvindicar como mulher trans ou ulter "ainda é homem".
Dentro da não-binaridade, a maioria das identidades não possui papéis ou estereótipos de gênero fixos. Se alguém é mulher não-binárie, a obrigação de "ser mais mulher" pode não ter tanto peso, porque a pessoa não é exatamente uma mulher binária.
Existem até pessoas que são não-binárias porque não conseguem se ver como pessoas trans binárias pela questão de serem trans. Isso não é necessariamente insegurança ou cissexismo internalizado; é apenas a experiência dessas pessoas de alienação da ideia de serem de um gênero binário com o qual não foram designadas.
Também é possível falar de exortransmisoginia; assim como transmisoginia é misoginia e transmisia experienciadas por mulheres trans e pessoas de identidades/experiências similares, exortransmisoginia é o exorsexismo e a transmisoginia experienciades por mulheres trans não-bináries e pessoas de identidades/experiências similares.
Mas e mulheres e discussões sobre opressão de gênero?
Acredito que pessoas que não sejam binárias sejam marginalizadas tanto pelas suas identidades não serem aceitas na cultura dominante, quanto por terem sido designadas gêneros diferentes dentro dessa cultura dominante.
Ou seja, sim, pessoas que não são somente, completamente e sempre homens também sofrem com o que se chama de sexismo, ainda que não sejam somente, completamente e sempre mulheres.
Não acho que o termo misoginia seja obsoleto ou problemático, visto que existe discriminação e opressão direcionada a mulheres. Mas, quando se fala de homens tendo privilégio, acho errado agir como se mulheres fossem as únicas pessoas afetadas. Algumas coisas poderiam ser chamadas de patriarcais ou parte do privilégio de homens, ao invés de apenas misóginas ou parte da opressão contra mulheres.
(Também não gosto muito de usar termos como "privilégio masculino" ou "opressão feminina", visto que pessoas de qualquer identidade de gênero podem ser masculinas ou femininas, mas consigo entender que dentro do contexto tal termo se refere aos privilégios de homens e opressões contra mulheres.)
Também existe exormisoginia, ou seja, a misoginia e o exorsexismo que afetam mulheres não-bináries e outras pessoas de identidades ou experiências similares. Um exemplo disso é colocar mulheres não-bináries como "meninas confusas" que só "acham que são não-binárias" (exorsexismo) porque "são fúteis e querem entrar na modinha"/"não possuem capacidade de entender o que é gênero" (misoginia).
De onde veio este termo? Tem algum outro termo?
O termo exorsexismo veio da operação XOR em programação, que retorna "verdadeiro" se um valor é uma coisa e não outra entre dois valores, e "falso" se preencher os dois valores, nenhum valor ou um valor diferente dos especificados. Ele foi mudado de exorismo porque poderia confundir pessoas disléxicas por parecer demais com exorcismo.
Foi cunhado em 2016 por Vergess no Tumblr. Postagens originais podem ser vistas aqui e aqui. Exorsexismo foi a palavra que acabou "pegando" mais, entre estas.
Uma alternativa que também não recebeu críticas, que acredito não ter sido usada por ninguém, é polarsexismo, que também remete à ideia de dois pontos diferentes acima do resto.
Algumas pessoas não gostam de usar exorsexismo porque o significado da palavra não é intuitivo, mas a maioria das pessoas não sabe da maioria das composições de qualquer palavra; é só uma questão de ensinar. A maioria também não sabe de onde vem perissexo, cisgênero, ou ornitorrinco, e não é uma exigência saber algo de programação para entender o que é exorsexismo assim como não é exigência saber grego ou latim para entender essas palavras.
Muitas pessoas gostam de usar binarismo. Embora a situação tenha mudado - hoje em dia, resultados de buscas por binarismo indicam binarismo de gênero e não coisas sobre computadores - ainda acho importante ter um termo próprio para indicar esta opressão que atinge identidades de gênero diferentes de 100% homem e de 100% mulher.
Afinal, o termo, inclusive como "binarismo de gênero", também é usado para falar de binarismo sexual (diadismo, opressão/discriminação contra pessoas intersexo), etnobinarismo (a intersecção entre exorsexismo e racismo, mais especificamente em contextos culturais com gêneros diferentes de homem e de mulher que sofreram e sofrem grande repressão por conta do colonialismo), binarismo de gêneros gramaticais (ou seja, línguas divididas entre equivalentes de a/ela/a e o/ele/o sem deixar forma neutra ou possibilidades abertas), binarismo de papéis de gênero (que pode ser algo criticando estereótipos de gênero ou falando de pessoas - inclusive binárias - que não seguem normas de gênero), e afins. Para não confundir ninguém, acho que um termo à parte é importante.
Algumas pessoas usam enebemisia ou similar, sendo "enebê" uma pronúncia de NB, sigla que significa não-binárie. Porém, ainda que seja comum ver "enby" na língua inglesa, eu praticamente nunca vejo gente usando enebê ou similar, fazendo com que o termo precise de explicação, assim como exorsexismo. Exorsexismo também é um termo mais inclusivo, por haverem pessoas fora do binário homem/mulher que não se identificam como não-binárias.
Tipos mais específicos de exorsexismo
Observação: Exorsexismo por si só é um assunto pouco falado, então essas coisas possuem menos material ainda...
Monogenerismo: A ideia de que ter um gênero (e um gênero apenas) é a norma. A ideia de que alguém "não pode só não ter gênero" é monogenerista; a falta de medidas que possibilitam ou facilitam alguém de indicar que é de gêneros diferentes (e que pode usar nomes/conjuntos de linguagem diferentes) em períodos diferentes é monogenerista.
Reducionismo de gênero: A ideia de que mesmo quem não é homem ou mulher binárie pode ser categorizade como "basicamente homem" ou "basicamente mulher". Geralmente isso é feito para que certas pessoas possam ser colocadas como "homens opressores" por terem expressão de gênero masculina e/ou por terem sido designadas homens ao nascimento, ou para invalidar orientações caracterizadas por atração de ou por pessoas não-binárias, afinal se todo mundo é "meio homem" ou "meio mulher", todo mundo que tem atração deveria poder se dizer hétero, gay, lésbica ou bi (no sentido de terem atração pelas "duas categorias").
Desgenerização: Isso é algo que não afeta só pessoas não-binárias, e sim diversos grupos marginalizados (incluindo pessoas cisdissidentes binárias). Mas existe desgenerização contra pessoas que não são binárias, que é quando reduzem qualquer uma dessas identidades de gênero a "não ter gênero" ou a "não definir gênero" apenas porque não são identidades binárias.
Também existem discussões sobre a possibilidade de surgimento de um termo relacionado à discriminação contra pessoas xenogênero.
De qualquer forma, é sempre possível falar separadamente de discriminação contra pessoas sem gênero, contra pessoas poligênero, contra pessoas gênero-fluido, contra pessoas neurogênero, contra a ideia de que identidades de gênero podem ser algo além de masculinas, femininas ou neutras, etc.
E, como já mencionado, é possível falar de intersecções entre exorsexismo e alguma outra coisa. Exormisoginia e etnobinarismo são termos já utilizados, mas também dá para formar e usar termos como exorcapacitismo, exordiadismo e afins.
Considerações finais
Exorsexismo é um negócio sério. Não temos estatísticas próprias por conta de nossas identidades não serem levadas a sério. Não temos grande visibilidade dentro de comunidades LGBTQIAPN+ (ou mesmo trans), e assim mesmo espaços que deveriam nos acolher nos excluem e agridem.
Mesmo dentro de comunidades não-binárias (que são poucas e pequenas), não é incomum ver pessoas que querem se assimilar às normas, ou que não são bem informadas quanto a questões de justiça social, então pessoas não-binárias racializadas, neurodivergentes, intersexo, que não querem ter que escolher entre linguagem "masculina, feminina ou neutra", que não querem ter que lidar com ódio à neolinguagem, que não querem ver ódio contra identidades não-binárias mais específicas, e afins, acabam não tendo espaços que sejam seguros para si.
Por favor, que mais pessoas ajudem a normalizar a terminologia que comunidades não-binárias inclusivas usam. Que mais pessoas incluam pessoas não-binárias quando se referem a grupos de pessoas que podem conter tais pessoas, e que mais pessoas evitem maldenominar pessoas que podem ser não-binárias e não usar um conjunto de linguagem "óbvio".
Leituras para quem quiser aprender mais
- Tópico sobre exorsexismo
- O que é exorsexismo
- Mitos e verdades sobre pessoas não-binárias {1} {2}
- Duplo vínculo aplicado a identidades não-binárias
- O que você pode fazer para não alienar pessoas não-binárias
- Dicas para pronomes e identidades de gênero
- Libertação x Cissexismo
- A culpa des excluídes
- Conceito: Reducionismo de gênero
- Questões diamóricas
- O apoio superficial a pessoas não-binárias
- Sobre maldenominação e impactos na saúde mental
- Eu também ignorei essas coisas no começo
- Quem ganha com a exclusão xenogênero?
- Genderfeels
- Minha experiência com a neolinguagem
- Digam suas linguagens pessoais
- Os argumentos contra a neolinguagem
- Sobre a matéria da BBC
- A favor dos xenogêneros
- Pensamentos sobre palavras, retóricas e intenção
- O que são "microcomunidades"
- Tudo, ou pelo menos muita coisa, sobre linguagem pessoal
Os argumentos contra a neolinguagem
Aviso de conteúdo: discursos antineolinguagem, cissexismo e exorsexismo, elitismo, capacitismo, contém ironias, contém links externos. O título é uma pegadinha. Vocês jamais me verão argumentando c…Alternative
Explicando a controvérsia ao redor das orientações gine e andro
Avisos de conteúdo
Cissexismo, descrições de genitálias e estereótipos de gênero. Principalmente quando são relacionades com atração.
Além disso, o objetivo deste texto é falar sobre as críticas contra as orientações gine e andro. Caso você não use definições problemáticas para estas identidades e já esteja ciente das críticas, você provavelmente não vai se sentir mal lendo o texto, mas há a possibilidade de invalidação.
Definições
Gine (às vezes gino) e andro podem não estar entre as orientações mais conhecidas, mas ainda são mais presentes do que a maioria, especialmente em comunidades não-binárias.
Eu já vi quatro significados principais para cada uma destas orientações, embora muitas definições usem mais de um destes significados de uma vez só:
Andro | Gine |
---|---|
Atração por homens (e talvez também por pessoas que consideram suas identidades próximas disso). | Atração por mulheres (e talvez também por pessoas que consideram suas identidades próximas disso). |
Atração por pessoas (que se identificam como) masculinas. | Atração por pessoas (que se identificam como) femininas. |
Atração por pessoas com características físicas e/ou de expressão de gênero consideradas masculinas pela sociedade. | Atração por pessoas com características físicas e/ou de expressão de gênero consideradas femininas pela sociedade. |
Atração por pessoas com pênis. | Atração por pessoas com vagina. |
Algumas das fontes onde estas definições podem ser encontradas: {x} {x} {x} {x} {x} {} {x} {x} {x} {x} {x} {x}
Porém, tem uma fonte que eu não sei se algum dia vou achar novamente.
Atrações por genitálias são problemáticas
Quando eu era adolescente, por acaso achei um site que falava sobre o que eram pessoas trans (binárias). Lembro que, ao final do texto, havia uma preocupação com como funcionariam as orientações de pessoas cis, já que pessoas trans existem.
O que sugeriram era que usassem androssexual caso a atração sexual fosse por pessoas com pênis e ginessexual caso a atração sexual fosse por pessoas com vagina, independentemente do gênero.
Caso alguém não saiba o que há de errado nisso:
- Não há como ter certeza da genitália de alguém sem que a pessoa tire a roupa, e geralmente atração sexual é formada antes disso;
- Só porque uma pessoa tem certa genitália, não significa que a pessoa vai querer ou poder usá-la de certa maneira, ou seja, genitália não tem a ver com prática sexual;
- Várias genitálias saem do padrão do que é uma "vulva normal" ou um "pênis normal", e esta divisão geralmente ignora estas possibilidades;
- Geralmente, quem está procurando por uma desculpa para dizer "pra mim só importa a genitália" é alguém que quer invalidar as identidades de gênero de pessoas não-cis.
Enfim, anos mais tarde, também soube de pessoas falando que gine/andro eram orientações que foram inventadas por e para pessoas não-binárias para falar de atração por pessoas binárias (sem genitálias envolvidas), e que só depois foram ressignificadas por FREPTs (feministas radicais exterminadoras de pessoas trans) para justificar sua fixação em genitálias.
Porém, o site que eu tinha visto era a favor de pessoas trans, não contra, e também parecia existir antes desta ressignificação.
(Eu queria poder passar fontes de onde li sobre a história da ressignificação, mas não achei nos blogs que frequento e buscas sobre isso só dão em um monte de gente tentando deslegitimar pessoas não-binárias em geral como transmísicas por conta de "apoiar identidades problemáticas".)
Forçar rótulos em cima de pessoas também é problemático
Independentemente do quanto a maioria rejeita a definição de gine/andro relacionada diretamente com genitálias, a rejeição da definição "atração por características externas femininas/masculinas" não é tão alta assim.
Noutro dia, alguém postou no servidor de Discord do Orientando uma lista que definia androssexual como "atração por homens ou por estereótipos ligados à masculinidade", e ginessexual como "atração por mulheres ou por estereótipos ligados à feminilidade".
As definições num vídeo de Bryanna Nasck que foi linkado ali em cima também são iguais, e Bryanna ainda elabora sobre como tais estereótipos seriam ligados ao tom da voz, à presença de maquiagem, ao tamanho do peito, à presença de barba, à presença de músculos.
A maioria destas coisas não podem ser facilmente controladas; ou seja, pessoas podem facilmente cair em tais estereótipos sem se identificarem de forma masculina/feminina ou próxima ao gênero binário alvo da atração da pessoa gine/andro.
Pense na seguinte situação: um homem trans tem peitos grandes demais para escondê-los totalmente com binder. Ele também não tem barba cheia suficiente para ele achar que vale a pena deixar crescer. A voz dele sempre foi fina, e a terapia hormonal não ajudou muito nisso, pelo menos por enquanto. Ele também não tem tempo ou vontade de crescer músculos. Ele não se vê como feminino, mas também não se esforça pra ser um estereótipo de machão. Seria justo que uma pessoa ginessexual quisesse um relacionamento com ele por preencher "estereótipos ligados à feminilidade"?
Este é um exemplo extremo, mas, de qualquer forma, ninguém merece ter sua identidade ou expressão de gênero julgada. Uma pessoa agênero que gosta de usar vestidos não tem que "aceitar que preenche estereótipos femininos". Uma mulher trans que recém se descobriu não tem que "aceitar que preenche estereótipos masculinos".
Você não consegue ter atração por uma pessoa porque a vê como masculina/feminina demais, ou porque não a vê como masculina/feminina o suficiente? Ou tem atração por pessoas porque as vê como masculinas/femininas, independentemente de como se identificam? Problema é seu, cale a boca e não use sua atração (ou a ausência dela) para invalidar pessoas. A mesma coisa vale para qualquer outra atração ou preferência problemática.
Masculinidade =/= ser homem, feminilidade =/= ser mulher
Eu não tenho problema com orientações definidas de formas similares a "atração por pessoas masculinas" ou "atração por pessoas femininas" por si só. Assim como não acho problemático alguém ter atração por homens ou por mulheres, ou ter mais ou menos atração por um destes gêneros.
Desde que, obviamente, identidades sejam respeitadas.
Mas eu sinceramente acho isso difícil de fazer quando você está igualando duas coisas diferentes que muita gente vê como parecidas.
A maioria das definições de gine/andro que incluem feminilidade/masculinidade colocam isso junto de atração por mulheres/por homens.
Tipo, atração por mulheres. Atração por mulheres deveria incluir mulheres independentemente de sua expressão de gênero. Talvez a pessoa não precise literalmente ter atração por todas as mulheres, e é possível que a pessoa tenha preferência por certos tipos de corpo e por certas expressões de gênero (sendo isso algo empurrado pela sociedade ou não), mas acho difícil alguém que diga ter atração por mulheres só ter atração por mulheres cuja expressão de gênero é feminina.
Aliás, se a atração "por mulheres e pessoas femininas" na verdade é "por mulheres femininas e outras pessoas femininas", isso não dá a entender que só mulheres femininas são mulheres, ou que a feminilidade só é natural em mulheres?
Alternativamente, você junta todos os tipos de mulheres com outras pessoas que se identificam como femininas. Pessoas não-binárias de diversas identidades de gênero, que podem ou não ser próximas a mulher ou a homem. Homens femininos.
Hmmm, será que faz sentido juntar esses dois tipos de atração diferentes, mas frequentemente colocadas como a mesma coisa, numa orientação só?
Também percebi que várias definições de orientações especificam "atração somente por homens e pessoas masculinas" ou "atração somente por mulheres e pessoas femininas". Nunca vi "atração somente por homens e pessoas femininas" ou "atração somente por pessoas não-binárias e pessoas masculinas".
Sendo que orientações definidas como "atração somente por pessoas que não são femininas" ou "atração somente por mulheres e pessoas não-binárias" existem; mas estas não misturam identidade de gênero com qualidades/elementos/expressões de gênero (como feminilidade e masculinidade).
Eu não descarto a possibilidade de alguém realmente ter atração somente por homens e pessoas masculinas, ou somente por mulheres e pessoas femininas, mas acredito que boa parte das pessoas na verdade só tem atração por um destes grupos (e talvez por pessoas que se identifiquem vagamente como um deles), e colocam o outro pra parecer algo, sei lá, mais formal ou inclusivo.
Também tem muita gente que acha que pessoas não-binárias que se identificam como mulheres de alguma forma precisam ser femininas ou precisam fazer parte do "espectro feminino de gênero", quando na verdade é possível ser parcialmente mulher ou ter gênero relacionado a mulher sem se identificar em nada com feminilidade. O mesmo vale para a relação entre homens e masculinidade.
Existe gente que se identifica como gine/andro e que não é problemática?
Sim.
Mesmo as definições de "atração somente por mulheres e por pessoas femininas" e "atração somente por homens e por pessoas masculinas" não são necessariamente problemáticas.
E atração só por homens/mulheres, atração só por homens/mulheres e por pessoas que se identificam de forma adjacente a ser homem/mulher de alguma forma, ou atração só por pessoas masculinas/femininas não são problemáticas, desde que a pessoa respeite as identidades alheias, assim como qualquer pessoa que seja gay, hétero, lésbica, proquu, proqua, viramórica, feminamórica, etc. deveria fazer.
Porém, com o tanto de definições problemáticas e estigmas, eu não culpo quem queira se afastar destes termos.
Alternativas
Vários termos já foram feitos como alternativas a gine/andro. Aqui estão alguns deles:
Orientações e termos juvélicos que denotam atração por gêneros binários (gerais ou apenas para pessoas NB)
Feminamórique/Femina-: Alguém não-binárie atraíde somente por mulheres.
Viramórique/Vir-: Alguém não-binárie atraíde somente por homens.
Home-/Ma-: Alguém atraíde somente por homens.
Mulhe-/Woma-: Alguém atraíde somente por mulheres.
Dórique: Alguém não-binárie atraíde por homens, exclusivamente ou não.
Trízique: Alguém não-binárie atraíde por mulheres, exclusivamente ou não.
Femárique/Femínique: Alguém LGBTQIAPN+ que sente atração por mulheres, exclusivamente ou não.
Mascíque/Mascúlique: Alguém LGBTQIAPN+ que sente atração por homens, exclusivamente ou não.
Orientações que denotam atração por um gênero binário + identidades não-binárias
Mártique: Alguém não-binárie que sente atração somente por homens e por pessoas solarianas (pessoas não-binárias cujo alinhamento de gênero é homem).
Venúsique: Alguém não-binárie que sente atração somente por mulheres e por pessoas lunarianas (pessoas não-binárias cujo alinhamento de gênero é mulher).
Netúnique: Alguém que sente atração por mulheres, pessoas sem gênero, e pessoas não-binárias que não são masculinas ou alinhadas com o gênero homem.
Urânique: Alguém que sente atração por homens, pessoas sem gênero, e pessoas não-binárias que não são femininas ou alinhadas com o gênero mulher.
Toren-: Alguém que sente atração somente por homens e por pessoas não-binárias.
Trixen-: Alguém que sente atração somente por mulheres e por pessoas não-binárias.
Toren e trixen são termos feitos para serem bem abrangentes. Alguém que sente atração por homens e por pessoas não-binárias que se identificam como homens de alguma forma pode se dizer toren. Alguém que tem atração por literalmente qualquer pessoa que não se identifique como mulher binária também pode ser toren.
Orientações que denotam atração por alinhamentos relevantes ou por masculinidade/feminilidade
Fin-/Fem-: Atração somente por pessoas femininas.
Min-/Masc-/Mascu-: Atração somente por pessoas masculinas.
Nofin-/Nãofem-: Atração somente por pessoas que não são femininas.
Nomin-/Nãomasc-: Atração somente por pessoas que não são masculinas.
Liv-: Alguém não-binárie alinhade com feminilidade que sente atração apenas por pessoas não-binárias alinhadas com masculinidade.
Luv-: Alguém não-binárie alinhade com masculinidade que sente atração apenas por pessoas não-binárias alinhadas com feminilidade.
Lunárique: Alguém que tem atração somente por pessoas lunarianas.
Solárique: Alguém que tem atração somente por pessoas solarianas.
Proqua-: Uma pessoa feminina atraída somente por outras pessoas femininas.
Proquu-: Uma pessoa masculina atraída somente por outras pessoas masculinas.
Termos terminados com - são prefixos (por exemplo, com proqua- você pode fazer proquassexual, proquarromântique, etc).
Mas e gay, lésbique e hétero?
Com certeza, estas são orientações mais conhecidas.
Porém, hétero é uma orientação inadequada para pessoas não-binárias. Se você quer usar, use, mas não acho que faz muito sentido, já que você ainda sofre sob a noção de que "um verdadeiro relacionamento é entre um homem e uma mulher", onde nem mesmo homens e mulheres NB são incluses.
Lésbique pode funcionar se você for mulher, alinhade com este gênero, ou de alguma outra forma se identificar com mulher e com mulheridade, e sentir atração apenas por pessoas não-binárias que se encaixam nesta descrição ou por mulheres. Mas muita gente não-binária atraída por mulheres não quer usar um rótulo majoritariamente usado por mulheres.
Gay também pode funcionar em certas circunstâncias; por exemplo, se você for ume homem NB, e disser que é gay, muita gente vai entender que você gosta de homens. Mas se você só disser que é agênero, fica difícil de saber se você tem atração só por pessoas no espectro agênero, só por pessoas não-binárias, ou se só está usando gay pra não dizer que é hétero.
Há outras situações de pessoas não-binárias que são lésbicas ou gays, mas também acho importante falar que existem alternativas sem uma conotação de "atração apenas por identidades de gênero iguais ou parecidas".
Também existem muitos outros termos deixados de lado nestas listas, porque a intenção aqui é só mostrar algumas das possibilidades existentes.
Mas eu, pessoa gine/andro, deveria mudar meu rótulo pra um desses, ou para outro no qual me encaixo?
A decisão é sua. Você quer brigar para ressignificar novamente essas orientações "queimadas" e provar que nem todo mundo que as usa é cissexista, ou prefere não correr o risco de olhares suspeitos ou de acusações injustas?
Eu sou o tipo de pessoa que não vê porque brigar por um rótulo quando há vários outros com reputações e/ou comunidades melhores, e que são tão precisos quanto. Mas não vou julgar quem não está fazendo nada de errado.
Hi, do you know of a term for someone who is exclusively attracted to people with penises regardless of their gender or presentation? And what is its opposite term?
Hi, do you know of a term for someone who is exclusively attracted to people with penises regardless of their gender or presentation? And what is its opposite term? TW FOR GENITAL MENTION I guess you...xeno-aligned (Tumblr)
Alinhamento de gênero e como essa terminologia se tornou inadequada
Uma postagem marcante na discussão sobre alinhamento de gênero definiu a ideia desta forma:
Por conta da forma que [identidades não-binárias] se cruzam com o binário de gênero, há vezes que é útil nos categorizarmos como pessoas com experiências comuns com homens ou com mulheres. Se existe uma sobreposição muito grande, como quando alguém é exclusivamente percebide como homem/mulher e então está sujeite a problemas sociais que afetam tais classes, pode haver valor em "nos alinharmos" com essas classes, para ter discussões significativas sobre como opressão funciona.Há valor em poder dizer "sou negativamente afetade por esse conjunto específico de preconceitos de gênero, mesmo que eu não seja deste gênero".
Esse era o propósito inicial de termos como "alinhade com homem" e de "alinhade com mulher". Identificar sobreposições fortes em pressões externas e experiências, ou identificar sobreposições de identidade pessoal com as experiências de outro gênero.
Os exemplos dados foram de ume proxvir racializade poder ter uma narrativa similar a de um homem racializado quanto a racismo específico contra homens, e de ume ambonec com TEPT complexo viste como mulher poder ser sujeite a um monte de misoginia médica em relação à sua diagnose e ao seu tratamento da mesma forma que uma mulher cis seria.
Esta mesma postagem também fala de como esses termos foram cooptados para significar "basicamente binárie" ou até mesmo "basicamente cis", e sugere então termos novos para que pessoas não tenham que se associar com essas ideias.
Tais termos são lunariane ("alguém que tem similaridades em identidade ou experiência com mulheres"), solariane ("alguém que tem similaridades em identidade ou experiência com homens") e estelariane ("alguém que não possui alinhamento forte com o binário de gênero, ou que rejeita tal alinhamento").
Acho interessante que esta postagem fala de alinhamento quase que exclusivamente como uma questão de uma pessoa ser injustamente colocada na mesma categoria que um gênero binário e sofrer algum tipo de opressão por isso.
Não acho que todas as pessoas usavam alinhamento só por isso, também. Mesmo as pessoas que não usavam esse tipo de identidade por conta de opressão baseada em gênero ou para serem exorsexistas (apagando as identidades individuais de pessoas não-binárias para dizer "mas você na verdade é homem/mulher" sem dizer isso de forma explícita) às vezes queriam expressar conexão com algum gênero binário por conta de expressão de gênero, sentimento interno ou transição desejada, motivos pelos quais algumas pessoas também usam termos como homem/mulher não-binárie, transmasculine e transfeminine.
Eu não sei dizer se isso seria um problema para o propósito de descrever opressão por gênero. Eu diria que não. Em ambos os casos, alinhamento seria uma forma de uma pessoa não-binária dizer que tem algum tipo de experiência/sentimento/vivência em comum com alguém de algum gênero binário, caso queira sinalizar algo do tipo.
Mas, mesmo nos círculos com a melhor das intenções, isso deu errado.
Problema 1: Misturar alinhamento de gênero com definições/categorizações de identidades de gênero
Logo quando os termos estelariane, lunariane e solariane foram cunhados, pessoas já aparentemente não pegaram a ideia disso ser algo opcional e pessoal, e começaram a associar certas identidades com certos alinhamentos.
Postagens apareciam colocando zenina, juxera, demimulher, libramulher e mulher-fluxo como identidades lunarianas, por exemplo.
Algumas pessoas também começaram a cunhar termos e, ao invés de dizer que eram associados com tal gênero, diziam que eram alinhados com tal gênero.
Eu entendo que alguém que sente alguma similaridade com a identidade mulher pode se identificar como lunariane. Mas se o exemplo original de uma pessoa alinhada com o gênero mulher na postagem que cunhou lunariane é de ume ambonec, dizer que gêneros específicos são de alinhamentos específicos não pode acabar deixando pessoas que não possuem gêneros relacionados aos binários desconfortáveis demais para usar termos como lunariane ou solariane por conta da opressão que sofrem?
Isso também é presumir sobre as identidades/vivências das pessoas. E se alguém for demimulher, mas for uma pessoa transmasculina que só se identifica como parcialmente mulher por isso fazer parte do seu gênero e não vê isso como uma parte relevante da sua identidade a ponto de ser seu alinhamento? E se algume juxera achar mais relevante a confusão que as pessoas têm com seu gênero por conta de sua expressão genderfuck do que a proximidade do seu gênero com mulher?
Cunhar termos com base em alinhamentos não é um problema tão grande, porque se alguém se identificar com o resto do termo mas não se ver como alinhade com algo, é só não usar. Ainda assim, não vejo porque não seria melhor deixar o gênero só relacionado com algo, e então deixar pessoas decidirem seus próprios alinhamentos de gênero separadamente.
Pessoas também começaram a perguntar, em blogs de ajuda, por "gêneros alinhados com tal coisa". Sendo que, se alinhamento de gênero não é associado com gênero, qualquer identidade de gênero pode ter qualquer alinhamento. Ume ambonec pode ser lunariane, uma pessoa agênero pode ser solariana, ume zenina pode ser estelariane, etc. Eu entendo que provavelmente o que querem dizer é que querem saber mais sobre gêneros associados/parecidos com certo gênero, mas isso não ajuda pessoas cujas identidades de gênero não deixam seus alinhamentos "óbvios" a se sentirem seguras em compartilhar/ir atrás de comunidades para tal alinhamento.
Um exemplo de como isso é ruim: Ume maverique é viste como homem e participou de espaços para homens por um longo tempo, antes de se perceber não-binárie. Tal maverique não se sente confortável com pessoas presumindo que elu é homem, mas isso de qualquer forma acontece com frequência e afeta suas experiências de vida. Solariane poderia ser um rótulo confortável para elu, porém grande parte das coisas disponíveis para pessoas solarianas presume que a maioria delas é de algum gênero parecido com homem, ou que são parcialmente homens, ou que são homens parte do tempo. Alguém que está tentando se afastar da ideia de que "na verdade é homem" vai se sentir confortável adotando esse alinhamento de gênero?
Problema 2: Misturar alinhamento com gêneros binários com feminilidade/masculinidade
Como já falei em outro texto, feminilidade e masculinidade são termos usados de duas formas que, ainda que façam sentido com suas definições básicas, são bem distintas na prática:
- Ser uma pessoa feminina ou masculina significa se dizer ao menos "meio mulher" ou "meio homem", respectivamente;
- Ser uma pessoa feminina ou masculina significa aderir a arquétipos relacionados a estereótipos de gêneros binários.
O que acontece é que, muitas vezes, pessoas passaram a usar "alinhamento com feminilidade/masculinidade" ao invés de "alinhamento com mulher/homem". Talvez isso seja por acharem que, por exemplo, alinhamento com feminilidade seja uma forma mais abrangente de falar de alinhamentos relacionadas com ser mulher, ao invés de ser um alinhamento estrito com ser mulher.
Mas isso acaba alienando as pessoas que rejeitam a ideia de que feminilidade/masculinidade precisa ter a ver com estar perto de um gênero binário (1), e que são mais acostumadas com a ideia de que ser uma pessoa feminina/masculina tem só a ver com se identificar com certos arquétipos/estereótipos, independentemente do gênero (2).
Um exemplo: Imaginem ume femil - uma pessoa cujo gênero é mulher, mas com 0% de feminilidade e ao menos alguma identificação com masculinidade - que passou boa parte da vida se identificando como bofinho. Que sempre foi criticade por não ser feminine, e que enfrenta violência por ser viste como "mulher que se veste de homem". Essa pessoa tem um gênero relacionado com mulher, e passa por questões enfrentadas por mulheres binárias, então faz sentido dizer que possui um alinhamento de gênero com mulher. Mas será que alguém assim se identificaria com um alinhamento com feminilidade?
Esse exemplo pode ser fictício, mas a pessoa que cunhou femil e melle é melle e já falou que não consegue usar o sistema de alinhamento de gênero por conta das pessoas juntarem feminilidade com ser mulher e masculinidade com ser homem, ainda que seja uma pessoa que se vê como alguém que tem alinhamento com ser homem e com feminilidade, mas não com ser mulher ou com masculinidade.
Problema 3: A obrigação de alinhamento
Isso não é algo tão presente em círculos mais inclusivos, e nunca cheguei a ver isso na lusosfera, mas acho que é uma questão importante pra apontar, já que é relacionada com o assunto.
Para não ignorar a existência de pessoas não-binárias que se identificam com termos vistos como binários, e também não ignorar que pessoas que usam os termos vistos como binários não querem que tais termos sejam deturpados, é comum haverem definições como:
Lésbica: Uma mulher ou pessoa alinhada com o gênero mulher que sente atração somente por mulheres ou por pessoas alinhadas com o gênero mulher.
Eu não acho que essa definição é necessariamente problemática, porque pela maior parte ela está certa. E não acho que adicionar todas as exceções possíveis a definições é um processo muito útil, já que sempre vão haver mais delas.
Mas, tipo assim, já não tem um monte de casos lá em cima no texto sobre um monte de casos onde pessoas não são (completamente, sempre, etc.) mulheres e não se sentem/talvez não se sintam confortáveis se dizendo lunarianas/alinhadas com o gênero mulher?
Fora que, se é comum que pessoas relacionem pessoa alinhada com o gênero mulher com pessoa com identidade de gênero relacionada com ser mulher, isso não poderia causar problemas para lunarianes que são agênero, maveriques, ou de outras identidades que não possuem mulher no nome ou na definição?
Ou pior: Como pessoas vão se sentir confortáveis adotando ou mantendo essa identidade se, mesmo que sintam alguma conexão ou relação forte com ser mulher, não possuem identidade de gênero com mulher no nome ou na definição, e não se sentem confortáveis se dizendo lunarianes/alinhades com o gênero mulher por conta das questões listadas acima?
Os problemas que isso causa não são apenas teóricos: existem pessoas que se afastam de espaços para homens com atração por homens/mulheres com atração por mulheres por medo de invadir mesmo que se identifiquem com os termos usados, e existem pessoas tratadas como "invasoras" por não se identificarem com os termos de identidade e/ou alinhamento de gênero "certos" para que possam ser aceitas em tais espaços.
Existem sim termos como feminamórique e viramórique, mas muita gente gosta de ter um termo "que a maioria entende" como identidade, e as comunidades femínicas, mascúlicas, feminamóricas, viramóricas, dóricas e trízicas não são muitas nem grandes.
Problema 4: Falta de comunicação entre "desalinhades" e pessoas com alinhamentos não-tradicionais
Não é à toa que foquei muito mais em alinhamentos com homem e com mulher neste texto; são os alinhamentos mais discutidos e destacados.
Mas até mesmo estelariane foi um termo cunhado junto a lunariane e solariane. Se lunariane significa que a pessoa tem alinhamento com ser mulher, e solariane significa que a pessoa tem alinhamento com ser homem, estelariane aponta, pra mim, um alinhamento com não-binaridade.
Isso pode parecer desnecessário: pra quê ter um alinhamento com não-binaridade, se a pessoa já é não-binária?
Eu acredito que a intenção tenha sido de oferecer um termo que explicitamente diz "não, eu não me vejo como alguém próxime de um gênero binário, ou como alguém mais próxime de um gênero binário do que do outro". Que diz "não importa a minha identidade de gênero ou como as pessoas me veem, eu não me sinto confortável em dizer que tenho experiências em comum com um dos gêneros binários".
Que diz "não, eu não tenho um alinhamento binário". Então, é, um alinhamento com qualquer coisa que não seja binária.
Eu acredito que a ideia tenha sido que estes três termos fossem absolutos; ou você se identifica como alguém que tem algo em comum com algum gênero binário, ou não (seja por ter coisas em comum com ambos, seja por não não ter nada em comum com ambos, seja por rejeitar a ideia de ter algo em comum com um ou outro).
Mas, é, quando a comunidade gosta de termos e começa a usá-los, buracos começam a aparecer.
Surgiram alinhamentos que são combinações desses três termos; surgiram alinhamentos que são parcialmente cada um desses três termos; surgiu o termo singulariane para quem não tem alinhamento nenhum.
Muita gente também começou a ver estelariane como um alinhamento com neutralidade.
Mais tarde, também surgiu xênique, um termo para quem tem alinhamento com um ou mais xenogêneros. Também surgiram termos mais específicos para conceitos xenogênero específicos (como alinhamentos com luz, com animais, com cristais, etc).
Mas, o que importa aqui, é que parte da comunidade ignorou todo esse desenvolvimento, e agiu como se só houvessem pessoas alinhadas com mulheres, com homens, ou sem alinhamento.
Eu não acho que há algo de errado em falar que existem pessoas sem alinhamento de gênero. Porém, em muitos textos, era como se não ter alinhamento de gênero fosse sinônimo com não ter um alinhamento de gênero puramente binário. Por exemplo, a falta de espaços para pessoas que não são mulheres ou homens ou alinhadas com esses gêneros não é uma questão que só é relevante para quem não tem alinhamento, quando pessoas estelarianas, xênicas ou eclipsianas (que são lunarianas e solarianas) também enfrentam problemas com essas divisões.
Quando alguns termos e espaços surgiram para pessoas sem alinhamento de gênero, algumas pessoas tiveram que perguntar se a ideia era para pessoas sem alinhamento ou sem alinhamento binário, especialmente quando eram coisas acompanhadas por alternativas que eram apenas para pessoas com alinhamentos binários.
Mas e então, o que fazer?
Eu sinceramente não sei se há como "consertar" todas as impressões erradas sobre os sistemas de alinhamento de gênero. Ao menos não tão cedo e se cada pessoa continuar usando esses termos de forma diferente.
Não acho que é um problema que alinhamentos de gênero ainda existam. Mas pessoas precisam certamente parar de fazer presunções baseadas em conhecimentos limitados (como gêneros relacionados com mulher = gêneros femininos = "gêneros lunarianos" ou pessoas que não são alinhadas com homem ou com mulher = pessoas sem alinhamento), se querem parar de machucar ou afastar pessoas de termos que acham úteis.
Acho que estelariane e xênique me contemplam bastante, mas não são termos que faço questão de usar.
O sistema alibinário foi feito para poder ter termos que falam de questões diferentes sem elas serem divididas por que tipo de identidade de gênero a pessoa tem, mas ele não fala sobre questões de gênero enfrentadas especificamente por homens e pessoas solarianas ou por mulheres e pessoas lunarianas, ou qualquer equivalente disso.
A ideia de elementos de gênero foi cunhada para que pessoas possam expressar alguma relação com tais elementos independentemente de gênero, mas eles não possuem nenhum propósito político (de falar de questões específicas enfrentadas por certos grupos).
Também existem os termos proxmenina e proxmenino (e, sim, como qualquer outra identidade com esse tipo de nome, dá pra usar proxmulher, proxguri e afins). Eles podem servir como alinhamento, mas eu não sei o quanto os termos seriam confundidos com identidades de gênero, e/ou o quanto teriam o problema 1 descrito lá em cima.
Eu não sei se chamaria esses conceitos de alternativas, porque eles podem existir independentes de alinhamento de gênero. Mas se alguém quer apenas complementar sua identidade com outras coisas que a descrevem, esses sistemas podem ser usados. De qualquer forma, eu não acho que pessoas que usem o conceito de alinhamento de gênero precisem parar.
Também acho que a concepção do conceito foi importante para que pessoas pudessem se dar conta de como não é só porque uma pessoa é não-binária, ou mesmo porque tem um gênero completamente alheio a homem/mulher, que uma pessoa não pode "se alinhar" por ver que tem experiências em comum com pessoas binárias. E a cunhagem de alinhamentos parciais, mistos ou com identidades não-binárias também indica que pessoas podem sentir esse tipo de conexão com identidades fora do binário também.
O que mais quero que aconteça é que pessoas confiem mais nas experiências alheias sem precisar de rótulos. Alguém que é não-binárie e que quer usar um rótulo como aquileane deveria poder fazer isso sem ter que explicitar que é homem não-binárie, solariane, proxmenino, transmasculine ou qualquer outra coisa assim. Também seria legal confiar que, por exemplo, alguém bigênero homem/mulher não está invadindo ou traindo qualquer comunidade caso queira participar tanto de espaços de mulheres quanto de espaços de homens. Deixem que cada pessoa se descubra ou se identifique com o que achar melhor, ainda que "não faça sentido" para pessoas binárias.
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Atração arromântica
Em primeiro lugar, eu tenho que avisar que talvez quem leia esse texto saia sem entender nada. Descrever experiências com atração pode ser complexo, e convenhamos, eu não sou exatamente a melhor pessoa pra explicar os próprios sentimentos.
Mas é isso que o título do texto está dizendo. Eu me sinto atraída arromanticamente pelas pessoas.
1 Tentando explicar
Eu sempre lutei pra entender se eu sinto atração romântica ou não. Já me identifiquei como alorromântica, como arromântica ou como alguém do espectro aro que sente atração romântica em algum grau ou intensidade (ex: demi, gris, arofluxo e etc). Uma maré de confusões. Mas ultimamente, cada vez mais eu ando notando que eu não sinto atração romântica por ninguém, por mais que exista períodos de tempo onde minha mente insiste que eu sinta (o que acontece mais vezes do que eu gostaria). É isto, eu sou arromântico. Minha arromanticidade está aqui e ela é tão palpável quanto o chão sob os meus pés.
1.2 A atração emocional oculta que eu não conseguia desvendar
Existe uma atração que sinto, que eu nunca consegui classificar direito. Antes achava que era atração romântica, mas depois cheguei a interpretá-la como atração queerplatônica ou alternativa. Quer dizer, eu acho que talvez ela ainda possa ser considerada como alternativa, mas sei lá.
Depois de pensar bastante sobre o que diabos essa atração é, o único consenso que eu alcancei foi de que: Eu só posso categorizar ela como arromântica.
— Como caracterizar essa atração? Aqui alguns pontos:
• Ela é totalmente separada de aspectos relacionados à atração romântica. Se a atração romântica está de um lado, ela está de outro. É como se fossem opostas.
• É o gênero-nulo das atrações. Ela é caracterizada por dar tangibilidade à intangibilidade dela. Ao invés de eu sentir uma ausência no lugar de atração romântica, eu sinto algo concreto que só pode ser descrito como minha própria arromanticidade.
• Ela é caracterizada pelo desejo de estar com alguém arromanticamente. Sem conotações românticas. É priorizar a arromanticidade nos relacionamentos, ao ponto deles estarem intrinsecamente ligados um ao outro.
• Ela é complexa como o gato de Schrodinger, mas não é a mesma coisa que ser schrodiromântique.
E é isto. Eu não sei se faz sentido, mas quando eu paro pra analisar essa atração, a única coisa que eu consigo associar a ela é minha arromanticidade. Não há como descrevê-la de outra forma.
Agora eu finalmente entendo o porquê de eu me sentir desconfortável em me identificar como [insira uma orientação aqui] –queerplatônique, –alternative e etc. Porque essa atração que eu sinto não é nenhuma delas.
Quando eu falar que sou [insira uma orientação aqui] –arromântica daqui pra frente, é porque estou rotulando minha orientação a partir desse conceito.
(Edit: 21/12) 1.3 Adentrando mais no assunto
- Qual a diferença dessa atração pra atração queerplatônica? Por que não só nomear ela como queerplatônica?
Novamente, eu não me sinto confortável em considerá-la queerplatônica ou como qualquer outra atração emocional não-romântica. Porque pra mim não faz sentido. Eu pessoalmente vejo atrações como estando em planos diferentes. Rotular ela como queerplatônica seria considerá-la em outro plano, e pra mim, essa atração pertence ao mesmo plano da minha falta de atração romântica. Como eu disse anteriormente: Eu só consigo descrevê-la como arromântica.
Em segundo lugar, eu me sinto desconfortável com o termo "queerplatônique" por causa da associação com platonicidade. Claro, há pessoas aplatônicas que usam o termo e o não o associam com atração platônica. Mas ainda assim, é algo que me incomoda.
- Mas descrever falta de atração como uma atração não é contraditório?
É. Eu criei esse termo pra ser paradoxal mesmo, porque minha própria atração é um paradoxo pra mim. E também porque eu não consigo desatrelar minha conexão emocional com as pessoas da minha arromanticidade. É simplesmente impossível.
- Não é um termo muito confuso?
Eu admito que não é um conceito perfeito. Talvez eu não tenha formulado direito. Talvez eu esteja me baseando demais nas minhas experiências, mas o importante é que isso é o que faz mais sentido pra mim no momento. E eu acredito que também pode ser muito útil pra pessoas com experiências iguais as minhas.
Considerações finais
Considere isso como um post de cunhagem. Talvez eu não seja a primeira pessoa a propor isso, mas pelo menos fica aí o meu registro sobre minhas experiências.
Espero que eu tenha feito algum sentido.
Muito obrigado pela sua atenção!
Eu sou lésbica e sinto atração por homens
Explicações prévias:
— No texto, eu usarei "ê(s) lésbique(s)" e "a(s) pessoa(s) lésbica(s)" ao invés de me referir a todo mundo que se identifica com a identidade com a/ela/a. Sobre o modelo a/p/f.
— Usarei o sufixo "-misia" ao invés de "-fobia" para descrever descriminações. O sufixo "-misia" se refere a ódio. Então vai ficar assim: lesbofobia = lesbomisia; lesbofóbique = lesbomísique. O motivo para essa troca se deve ao fato de que descrever descriminações como fobias é capacitista. Mais sobre o assunto.
É isso que o título diz. Antes de um "mas–" ou um "como–" ou até mesmo olhos flamejando de raiva, respirem fundo por alguns minutos e continuem lendo. Aí depois vocês podem tomar as suas conclusões.
Isso é uma tentativa de produzir um texto relativamente informativo sobre experiências de pessoas lésbicas que sentem atração por múltiplos gêneros (lésbiques multi), e não apenas daquelas que sentem atração por homens, como o título indica. Ao final, irei falar sobre minhas próprias experiências. Ou bem, tentarei entendê-las durante a minha escrita, para poder traduzi-las para vocês.
Vamos lá.
Definindo a experiência lésbica multi
Uma pessoa que se identifica como lésbica multi se identifica com ambos os rótulos "lésbique" e "multi". Ume lésbique multi pode ter escolhido se identificar assim por vários motivos.
Alguns deles são:
• Por possuir uma experiência variorientada. Ex: Fulane sente atração sexual por vários gêneros, e se identifica como polissexual. Mas apenas sente atração romântica por mulheres, então rotula sua orientação romântica como lésbica. A pessoa se sente confortável em se identificar como lésbica multi.
• Por possuir uma orientação flexível. Ex: Alguém que na maior parte do tempo sente atração por mulheres, mas que as vezes sente atração por outros gêneros.
• Por possuir uma orientação fluida. Ex: Alguém abro que flui para a orientação lésbica na maior parte do tempo e que se sente mais confortável em reinvindicá-la como sua identidade principal.
• Alguém lésbique que sente atração por mulheres e pessoas não-binárias que possuem uma conexão com mulheridade. Ou alguém lésbique que sente atração por mulheres e por pessoas não-binárias em geral.
° Eu sei que a definição da identidade lésbica é atualmente flexibilizada para incluir atração por pessoas não-binárias também. Mas isso não deixa de ser uma experiência multi. Há pessoas que por exemplo reinvindicam "lésbique multi" por quererem dar uma maior ênfase em sua atração por pessoas não-binárias. Experiências não-binárias não são adjacentes ao gênero mulher.
• Por ser uma pessoa multi cuja atração por mulheres (ou por mulheres e pessoas não-binárias com uma conexão com mulheridade/outras definições) é maior.
• Por considerar o uso histórico da identidade lésbica. Antigamente, ela era usada por qualquer mulher que sentisse atração por mulheres. Mas após o separatismo lésbico, mulheres multi foram forçadas a abandonarem a sua identificação anterior e construir suas próprias comunidades. Há pessoas que reivindicam ambas as identificações se baseando nesse contexto histórico.
E etc.
Perguntas e respostas
1. Mas se identificar como lésbique multi não é lesbomísico? Não é implicar que tode lésbique sente atração por múltiplos gêneros?
A resposta curta para as duas perguntas é: Não.
A resposta longa é: Pessoas lésbicas multi não querem obrigar todo mundo a se identificarem com suas experiências. E um rótulo pode ter múltiplos significados, sem ignorar ou apagar as experiências de ninguém. Reconhecer lésbica como uma identidade guarda-chuva não é a mesma coisa que dizer que tode lésbique tem que se atrair por múltiplos gêneros. Ou bem, reformulando, já que isso interessa a maioria das pessoas que vem perguntar com má intenção: Se reconhecer como lésbique multi não é a mesma coisa que dizer que toda pessoa lésbica tem que se atrair por homens.
° Também não quer dizer que toda pessoa multi com x experiência é praticamente lésbica. Se identificar com um rótulo é algo extremamente pessoal e não deveria ser forçado sobre ninguém.
2. Mas isso não abre espaço para homens cis acharem que isso é uma bandeira verde para darem em cima de toda pessoa lésbica que veem pela frente?
Acontece que homens cis não precisam de bandeira verde para serem lesbomísicos. Lésbiques multi existindo ou não, eles vão continuar assediando pessoas lésbicas. Nós vivemos em um mundo misógino e heterossexista. Nós vivemos em um mundo dominados por eles. Eles já tem carta branca pra nos machucar.
Que tal não culpar pessoas multi por esse fato?
3. Por que essas pessoas não se identificam de outra forma? É realmente necessário reinvindicarem a identidade lésbica?
As pessoas deveriam ser livres pra se identificarem como quiserem. Se elas acham que se identificarem como lésbicas faz sentido para suas experiências, qual é o mal nisso?
Novamente, isso não quer dizer que toda pessoa lésbica sente atração por múltiplos gêneros. Sério, não há nenhuma generalização quando se trata de identificações pessoais. A forma como nós nos identificamos apenas interessa a nós mesmes.
4. "Lésbique multi" não é algo que provém do lesbianismo político? O termo não é usado por radfems?
Na verdade, isso é uma concepção completamente errônea. Até porque eu duvido que qualquer pessoa "adepta" do lesbianismo político tenha qualquer intenção de reivindicar uma identidade multi ou até mesmo dar qualquer impressão de que esteja confortável em se relacionar romanticamente/sexualmente com homens. Embora haja a possibilidade de ume lésbique multi se identificar assim porque, apesar de ser uma pessoa multi que sente atração por homens, prefere se relacionar exclusivamente com mulheres (ou com mulheres e pessoas não-binárias com uma conexão com a mulheridade/outras definições), ainda não é algo que se trata de recusar a atração por homens devido a uma política relacionada ao feminismo radical.
E sobre a segunda pergunta....radfems odeiam a gente tanto quanto exclusionistas odeiam. Eu realmente queria checar esse mundo onde experiências de pessoas multi são respeitadas/levadas em consideração por feministas radicais. Aonde fica esse universo?
° Lembrete de que se identificar como "lésbique multi" é considerar ambas as identidades relevantes no processo de identificação. Se fosse o contrário, essas pessoas se identificariam apenas como lésbicas ou como multi.
5. E ês lésbiques monossexuais ou ês que não sentem atração atração por homens?
Ainda continuam sendo lésbiques. Sério, a gente pode coexistir. Ao invés de brigarmos entre nós, deveríamos redirecionar toda a nossa raiva para quem realmente merece (as pessoas que estão constantemente procurando uma forma de acabar com a nossa existência). Eu entendo o desconforto com as pessoas implicando que vocês sentem uma atração que, por toda a sua vida, a sociedade tentou impor em cima de vocês. Eu entendo a raiva, a frustração, o desconforto....eu entendo tudo. Eu passei pela mesma coisa também. Eu fui a pessoa designada mulher ao nascimento que sempre, quando falava que nunca iria se casar com um homem, era respondida com escárnio, com desprezo, com descrença. Como se toda a nossa existência fosse ligada a sentir atração por homens (e ai de quem transgredir isso). Mas é sério, nós não queremos obrigar vocês a se identificarem com as nossas experiências. Nós apenas estamos nos identificando com o que faz mais sentido para nós.
Minhas experiências
O primeiro rótulo queer com o qual me identifiquei foi "lésbique". Eu descobri o que ser uma pessoa lésbica significava em um episódio do Casos de Família (sem comentários). Meus olhos brilharam. Toda a minha inadequação de repente fez sentido, e mais tarde, eu logo iria descobrir uma comunidade para chamar de "minha".
Eh, depois de crescer e depois dos milhares questionamentos de identidade, aquele brilho todo sumiu. Mas minha conexão com a identidade lésbica ainda continua firme, vívida e inflexível.
Eu poderia escrever um ensaio de 70 páginas explicando sobre minhas orientações, mas eu acho que ninguém se interessaria em ler várias páginas das minhas eternas confusões. Mas enfim, atualmente (acho sempre bom reiterar isso, porque vai que né), eu me identifico como uma pessoa que está no espectro assexual e que rotula a vaga atração sexual que sente como bissexual. Eu sou uma pessoa lésbica-arromântica, e sinto atração estética por pessoas de vários gêneros.
O motivo de eu rotular minha atração arromântica como lésbica é de que eu só me sinto confortável em me relacionar emocionalmente com mulheres e com pessoas não-binárias (eu também rótulo essa atração como trixen, então eu meio que sou lésbica multi em vários sentidos?). E tipo, eu só consigo me sentir atraída por homens sexualmente/esteticamente mesmo.
• Parte de um texto que eu escrevi quando me identificava como lésbica bi (eu tinha quatorze na época e não me identifico 100% com essas experiências agora).
Eu passei um longo tempo incomodada em me identificar como bi porque minha atração (romântica e sexual) por mulheres era bem maior, e voltei a me identificar como lésbica. Eu descobri que pra ser bi você não precisa ter a mesma frequência de atração por todos os gêneros aos quais você se atrai uns anos mais tarde e voltei a me identificar como bi novamente (uma maré de identificações ksksks). Enfim, mas meio que algo ainda me incomodava, por mais que eu amasse a minha comunidade e me sentisse orgulhosa pela minha identidade, eu ainda possuia uma conexão muito grande com a comunidade lésbica, porque eu meio que cresci me identificando como lésbica e tinha um carinho muito grande pela identidade.
Mesmo sendo uma mulher bi (que é sáfica), minhas experiências de atração não são tão diferentes das experiências de uma mulher lésbica, então, quando eu descobri que eu poderia me identificar com os dois termos eu meio que fiquei, emocionada?Enfim, eu uso os dois termos agora, por que? Porque minha conexão com a identidade lésbica e as experiências da comunidade são muito importantes pra mim, e me identifico como bi ao mesmo tempo porque mesmo que a minha atração por outros gêneros não seja frequente, eu ainda considero essas atrações uma parte importante da minha vida. É por isso que eu sou uma lésbica bi.
Enfim, é isto.
Considerações finais
É interessante avisar a algumas pessoas que, para mim, ser lésbica não é nenhum jogo ou algo super divertido. Eu já sofri lesbomisia, tudo bem? Eu vivo neste planeta, vejo como as pessoas dessa comunidade são tratadas. Não é um passatempo. É a minha vida. É a vida de outras pessoas. Só porque eu acho homens sexualmente atraentes ou esteticamente agradáveis, isso não quer dizer que tudo isso é automaticamente inválido.
E minha identidade multi é tão importante quanto. Vocês podem tentar arrancar essas identidades das minhas mãos, mas elas estão tão intrisecamente ligadas a forma como eu me vejo, que seria como tentar roubar a essência de alguém. Mas se quiserem tentar, boa sorte.
Vocês vão precisar.
Links adicionais:
• Lésbica.
• Identidades controversas, reacionarismos, e atrações múltiplas.
• Sobre discursos contra lésbicas multi.
• Lésbiques mono, não há nada o que temer. ← (inglês)
• Masterdoc lésbico bi/gay bi. ← (inglês)
• A tag #explanation de @bi-lesbian no Tumblr. ← (inglês)
• Fontes sobre a identidade lésbica/gay multi. ← (inglês)
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Pessoas não-binárias e a alienação da diamoricidade
Ressalvas
Existem dois problemas em tentar restringir os termos que outras pessoas usam:
- É impossível realmente proibir alguém de usar certa palavra. Por exemplo, não importa o quanto pessoas anticapacitistas continuem falando que é para parar de usar o conceito de inteligência tanto em geral quanto em relação a descrever suas atrações (1) (2) (3) (4) (5) (6), ou o quanto pessoas relatam experiências negativas com pessoas sápio que com certeza não aderem aos preceitos usados para defender a identidade, de que "só porque alguém diz sentir atração por inteligência, não significa que essas pessoas estão definindo inteligência de formas restritas" (1) (2) (3), a orientação sapiossexual provavelmente é uma das orientações não listadas explicitamente na sigla LGBTQIAPN+ mais discutidas e conhecidas.
- Cada pessoa tem uma experiência de vida (e jornada identitária) única, e, portanto, qualquer "regra imposta" não será universalmente aplicável. Por exemplo, se uma pessoa só diz que é transmasculina e agênero, que só sente atração por mulheres e que quer um termo que expresse sua orientação, eu dificilmente sugeriria lésbique como um termo aplicável; porém, eu não diria que uma pessoa que se descreve mais de forma similar a alguém que poderia se dizer librafemil do que como pessoa sem qualquer ligação com gênero e que tem décadas de experiências em comunidades lésbicas deveria parar de se dizer lésbica por não ter gênero e/ou não se dizer mulher.
Além disso, existe a questão de que, em geral, existem problemas maiores do que um termo que uma pessoa usa. Se uma pessoa usa um termo que acredito que compactua com discriminação, e não estou em uma posição onde faz sentido eu conversar com a pessoa sobre tal questão, posso só evitar tal pessoa e, no máximo, falar de forma geral sobre a questão. A mesma coisa acontece se alguém estiver usando um termo de uma forma que considero incorreta: como algumas pessoas aleatórias usam termos não muda como grupos existentes definem suas identidades, como diretórios onde pessoas caem ao pesquisar termos os definem, e por assim vai.
(Isso também significa que pode ser difícil mudar a ideia geral do que significa um termo, por bem ou por mal.)
Este texto tem o objetivo de levantar a possibilidade de queermisia internalizada resultar em pessoas preferindo termos com conotações binárias — geralmente hétero, gay e/ou lésbique — do que termos cunhados por e para pessoas não-binárias.
Ainda que o texto não seja contra o uso de mais de um entre os termos com os quais uma pessoa sente afinidade, acho fundamental apontar que minha posição não é a de atacar pessoas cisdissidentes por usar ou não usar determinados termos. Aqui está uma citação minha sobre o assunto, de janeiro deste ano:
Dito isso: eu nunca recomendo chegar em alguém que usa algum termo que possa parecer contraditório e falar que a pessoa tem alguma opressão internalizada por se chamar daquilo ou falar que a pessoa não deveria estar usando um dos termos por “não fazer sentido”. Como coloquei acima, há múltiplos fatores que podem levar alguém a se dizer tanto agênero como gay, e uma pessoa assim não tem a obrigação de usar mais termos para justificar tal escolha, assim como também está livre para acumular quantos termos quiser para especificar sua identidade.
Um mini glossário de termos que mencionam pessoas não-binárias
Minha intenção aqui é a de focar em termos que serão relevantes ao texto, além de fornecer alguns exemplos de que termos existem para pessoas não-binárias que não se encaixam bem nas orientações mais comuns disponíveis independentemente da identidade de gênero, como arromântique ou polissexual. Existem muites outres orientações e termos juvélicos disponíveis para pessoas de identidades de gênero diversas e para quem se atrai por elas, e tais termos não são menos importantes ou úteis por não estarem listados aqui.
Diamórique: Alguém não-binárie que se atrai por e/ou se relaciona com outras pessoas, mas que considera a própria identidade não-binária como relevante, da mesma forma que algumas orientações não mencionam simplesmente por quem se atraem mas também informam algo sobre a identidade de gênero da pessoa que sente a atração. Relacionamentos envolvendo pessoas não-binárias podem ser chamados de diamóricos independentemente das outras identidades de gênero envolvidas. Termos que envolvem atração de forma que inclui explicitamente a atração de pessoas não-binárias são ocasionalmente chamados de orientações diamóricas.
Méstrique: Descreve algume atração, orientação ou relacionamento que envolve ao menos uma pessoa não-binária. Ao contrário de diamórique, este termo também pode ser utilizado para descrever pessoas binárias que sentem atração por pessoas não-binárias.
Dórique: Alguém não-binárie que se atrai por e/ou se relaciona com homens, exclusivamente ou não. Um relacionamento entre alguém não-binárie e ume homem pode ser chamado de dórico.
Enebeane: Alguém não-binárie que se atrai por e/ou se relaciona com outras pessoas não-binárias, exclusivamente ou não. Um relacionamento entre duas pessoas não-binárias pode ser chamado de enebeano.
Trízique: Alguém não-binárie que se atrai por e/ou se relaciona com mulheres, exclusivamente ou não. Um relacionamento entre alguém não-binárie e ume mulher pode ser chamado de trízico.
Feminamórique: Alguém não-binárie que se atrai apenas por mulheres. O prefixo femina também pode ser usado de formas mais específicas, como feminarromântique para alguém que se atrai romanticamente apenas por mulheres ou feminassexual para alguém que se atrai sexualmente apenas por mulheres.
Viramórique: Alguém não-binárie que se atrai apenas por homens.
Tóren: Alguém (de qualquer identidade de gênero) que sente atração apenas por homens e por pessoas não-binárias. Não existem limitações em relação a quantas ou quais identidades não-binárias alguém tóren sente atração: uma pessoa atraída por todes menos mulheres bináries pode se dizer tóren, e uma pessoa atraída somente por homens e por homens não-bináries também. É possível usar o termo como prefixo, como em torensexual ou torenalternative.
Tríxen: Alguém (de qualquer identidade de gênero) que sente atração apenas por mulheres e por pessoas não-binárias. Não existem limitações em relação a quantas ou quais identidades não-binárias alguém tríxen sente atração: uma pessoa atraída por todes que não sejam homens pode se dizer tríxen, e uma pessoa atraída somente por mulheres, por pessoas gênero neutro e por pessoas entre tais gêneros também pode se dizer tríxen. É possível usar o termo como prefixo, como em trixensexual ou trixenalternative.
Apego à multidão
Se cada pessoa que desistisse de se dizer viramórica ou feminamórica porque "ninguém conhece esses termos" os adotasse e tomasse medidas para divulgar o que tais termos significam, poderíamos até ter, no mínimo, grupos de socialização para pessoas com tais identidades.
Porém, muita gente prefere o suposto conforto de usar termos considerando o gênero imposto ao nascer ao invés de suas verdadeiras identidades de gênero, ou preferem se definir em termos de serem "gays por homens" ou "lésbiques por mulheres" mesmo que não tenham nenhuma relação com os gêneros homem e mulher, respectivamente. Eu falo de um suposto conforto porque raramente vejo pessoas verdadeiramente satisfeitas em tais identidades ou comunidades: há diversos relatos de conflito dentro de um relacionamento com alguém cis da mesma orientação quando a pessoa não-binária quer afirmar sua cisdissidência por meio de um conjunto de linguagem pessoal diferente e/ou por ir atrás de hormônios ou cirurgias que mudarão seus corpos, ou de ter amizades/ir em encontros onde o grupo é de pessoas da mesma orientação e as pessoas fazem comentários excludentes contra a identidade da pessoa não-binária.
A questão não é que toda pessoa hétero, gay ou lésbica seja inerentemente despreparada para lidar com pessoas não-binárias, ou que pessoas de alguma orientação específica vão inerentemente ser completamente inclusivas de todas as facetas da não-binaridade e da cisdissidência, mas sim que não só o argumento de uma pessoa ser "melhor entendida" ou "mais em contato com a realidade" por rejeitar quaisquer orientações incomuns é falho, como também a existência de espaços diamóricos poderia ter oferecido redes de apoio melhores para pessoas não-binárias buscando relacionamentos com mulheres ou homens do que espaços sáficos ou aquileanos, onde a não-binaridade é mais rara, mais apagada e nunca vai ser centralizada (sendo que, em até certo ponto, isto é compreensível).
Não quero apagar a questão de existirem pessoas não-binárias satisfeitas em enfatizar algum lado mulher e/ou homem de sua identidade acima da experiência não-binária: entendo que uma pessoa bigênero homem/mulher pode se sentir mais afirmada se dizendo lesboy do que feminamórica caso sinta atração apenas por mulheres, por exemplo. Também existem pessoas que, ainda que não tenham conexão com a binaridade, se sentem satisfeitas em comunidades associadas com mulheres ou com homens. Porém, que fique o convite: todas as pessoas fora do binário mulher/homem podem utilizar termos diamóricos (ainda que o termo "não-binárie" tenha a tendência de ser utilizado por questões práticas) e, quem sabe, ajudar a construir tais espaços, sem que isso precise significar um abandono dos termos utilizados ou espaços frequentados no presente.
Retórica reducionista
O outro problema que uma pessoa não-binária pode enfrentar é o exorsexismo que permeia vários espaços heterodissidentes. Estes podem ditar que os termos corretos a ser usados dependem de um "alinhamento de gênero" imposto por como a sociedade maldenomina cada pessoa, e que termos feitos por e para pessoas não-binárias são apenas fantasias problemáticas que validam a homomisia internalizada daquelus que não querem se dizer lésbiques ou gays e/ou a "invasão" de pessoas "(essencialmente) hétero" (ainda que pessoas não-binárias não sejam validadas na heteronorma).
E, se essas pessoas aceitam que pessoas não-binárias são não-binárias e não deveriam ser jogadas para termos definidos em torno da binaridade ou da ausência de atração, elas impõem que então quem é não-binárie é pan e só deve namorar quem é pan. Não pôli, ainda que seja um termo que implicita em sua definição a existência de mais de duas identidades de gênero; não bi, ainda que ativistas bi em geral reinvindiquem a possibilidade de atração por pessoas não-binárias; mas só pan, porque é como se só fosse possível reconhecer atração que envolve não-binaridade se ela existir independentemente da identidade de gênero.
(Pan não se limita a atração independente de gênero, mas é assim que o termo tende a ser percebido por quem quer forçá-lo em quem é ou que se atrai por gente não-binária. Caso alguém tenha interesse em saber a diferença entre bi, pan, pôli e outras orientações, este texto se aprofunda nisso.)
Também quero ressaltar o quão absurda é a proposição de que alguém é "só algo": de que alguém fortitudiane é "só gay" ou de que uma pessoa heteroflexível é "só bi" ou "só hétero". Nenhuma orientação precisa ser reduzida a só um termo: uma pessoa pode tanto usar o termo fortitudiane quanto os termos gay, medisso e enebeane. Uma pessoa hétero será também duárica, e, dependendo do resto de suas experiências, pode ser ante, julietiana, romérica, campiona ou afins.
Como falei , só porque alguém prefere um termo, não significa que a pessoa está contra outros termos. Termos não são times em confronto, são descrições. Isso significa que alguém pode usar termos diferentes dependendo do contexto, ou usar vários termos de uma vez só para explicar facetas de sua identidade: por exemplo, ume mulher não-binárie atraíde por mulheres não-bináries e outres mulheres pode se dizer lésbique, feminaflexível, tríxen e/ou ogli, isso sem contar termos juvélicos como enlune, sáfique e equárique.
Porém, existe essa ridicularização de termos que são mais específicos, ou mesmo que oferecem possibilidades que pessoas binárias não gostam de considerar, como a questão de alguém poder se atrair pela não-binaridade de alguém e não pela expressão de gênero ou corporalidade.
Uma anedota sobre a percepção da não-binaridade em questões de atração em espaços online
Eu entendo que os espaços que passei foram limitados, e que talvez não exista relação entre estes eventos ou grande repercussão deles. Porém, minha perspectiva é que discussões online acontecendo onde há uma centralização grande de gente NHINCQ+, especialmente pessoas dentro de comunidades que ainda não eram/são tão descentralizadas, tendem a pesar nas produções feitas pela própria comunidade de formas que são capazes de afetar a comunidade como um todo, dentro de certa medida. Enfim:
No início da década de 2010, houve uma onda forte de transmedicalismo no Tumblr, onde quaisquer pessoas não-binárias ou homens/mulheres trans fora de certos padrões de gênero eram ridicularizades tanto por (em geral) homens trans brancos que acusavam essas pessoas de prejudicar a percepção das pessoas trans. Este era o ponto de contato mais perto de ser intracomunitário, porque obviamente também existiam mulheres cis se dizendo feministas que falavam sobre o quanto essas pessoas estavam se rendendo a acreditar em padrões de gênero e pessoas "contra justiça social" que mais pra frente se tornariam "alt-right" e fãs de influencers que flertam com pensamentos nazistas.
Nesta época, não haviam muitas discussões sobre as atrações de pessoas não-binárias. Possivelmente porque as (comparativamente) poucas pessoas não-binárias tinham a tendência de ser múlti e/ou a-espectrais: o termo cétero tinha sido cunhado, mas era majoritariamente teórico, ao mesmo tempo que alguns termos surgiram para incentivar outres a evitar a conotação dos prefixos gine e andro mas, novamente, geralmente não tinham uso suficiente para ser espalhados.
Embora o ódio contra pessoas não-binárias nunca tenha sumido completamente, falar sobre o mesmo assunto acaba sendo redundante até para grupos de ódio, os quais passaram a focar mais em pessoas múlti, e, eventualmente, foram desenvolvendo também argumentações nocivas contra pessoas assexuais, arromânticas, aplatônicas e variorientadas (geralmente focando em pessoas assexuais e demissexuais). O ódio geral contra pessoas bi tinha a tendência de vir de lésbicas cis, mas algumas pessoas trans, bi, pan e/ou não-binárias eventualmente compraram as argumentações quando o assunto passou a ser pessoas a-espectrais.
Estas argumentações, em geral, tinham a base em definir "LGBT" por meio de "atração pelo mesmo gênero" ou "pessoas que sofrem com homomisia ou transmisia", com a inclusão de pessoas bi e trans muitas vezes sendo reduzida a consequências secundárias do ódio contra a atração pelo mesmo gênero. Também era esse o tipo de pessoa que dividia todas as pessoas não-binárias em alinhamentos binários com base em passabilidade para argumentar que gay, lésbique e bi eram as únicas orientações reais, com o resto "não sendo orientações" ou sendo caracterizadas como "apenas ódio internalizado causado por pessoas hétero confundindo adolescentes para invadir a comunidade" (no caso, pessoas oferencendo outros termos como opções).
Com isso, pessoas construindo solidariedade contra esses discursos de ódio (ou, em certos casos, querendo abrir portas para pessoas terem seu contato com ideologia reacionária de forma amigável) começaram a falar sobre homens que sentem atração por homens e mulheres que sentem atração por mulheres, fazendo blogs e comunidades em torno disso ao invés de orientações específicas. Pessoas não-binárias eram muitas vezes aceitas, mas apenas sob a ideia de que tais pessoas teriam alguma conexão com um desses gêneros, mesmo que de formas mais legítimas do que discurso reducionista da passabilidade.
Foi nesse contexto onde finalmente houve um empurrão mais forte para a cunhagem de diamórique e de termos específicos dentro da mesma ideologia: a de que pessoas não-binárias merecem a existência de termos que falam de identidades não-binárias de forma explícita. Essas discussões foram compartilhadas em palcos maiores do que cunhagens novas geralmente eram (ou hoje em dia são), de forma que ao menos alguns blogs foram criados a respeito desses assuntos.
Também surgiram vários outros termos menos espalhados, mas todos dentro deste contexto de descrever experiências não contempladas explicitamente por termos usados principalmente por pessoas binárias. E, enquanto isso, sempre houveram pessoas reacionárias reclamando sobre quaisquer termos "supérfluos" enquanto também criavam barreiras em torno de quem poderia se dizer o quê.
Com o passar do tempo, porém, algumas pessoas adultas com mais experiência em espaços NHINCQ+ começaram a bater de frente contra a ideia de que termos como femme, butch, lésbique e gay eram tão exclusivos quanto algumas pessoas afirmavam ser. Isso fez com que algumas pessoas começassem a se assumir como lésbiques/gays múlti, grupo que virou o alvo de ódio principal depois das pessoas a-espectrais.
Em 2020, dados do Gender Census apontam um pico - especialmente entre aquelus com menos de 30 anos - de pessoas fora do binário de gênero respondendo que são lésbiques, femme e/ou butch como identidades de gênero. Em 2021, tanto gay quanto lésbique em relação a identidade de gênero foram opções marcadas por algo entre 10% e 20% des respondentes, sendo gay mais popular ainda que tenha sido lésbique que causou a aparição de tal termo na lista em primeiro lugar.
Obviamente, tais dados não são sobre orientações, e sim sobre identidades de gênero. Mas não posso deixar de notar que tal onda ocorreu justamente quando houveram mais discussões online defendendo usos bem mais abrangentes de termos como lésbique e gay do que geralmente eram vistos há 10 anos atrás. E que tal onda também corresponde com o declínio de discussões sobre ser diamórique, enebeane, dórique ou trízique.
Minha intenção aqui não é a de acusar alguém ou algum grupo de prejudicar pessoas não-binárias por meio de defender enebês que se sentem confortáveis se colocando como lésbiques, gays, aquileanes, sáfiques ou afins. Porém, eu acredito que possa haver um meio termo entre os extremos de pessoas não-binárias só poderem existir completamente alheias a tais identidades e de redefinir atrações por mulheres ou homens dentro da comunidade não-binária como sempre inerentemente lésbicas ou gays.
Minhas sugestões para o futuro
(AC: segunda pessoa)
Normalização é importante. Ao fazer listas de ou gráficos sobre orientações e/ou termos juvélicos, é importante contemplar também termos que incluem a não-binaridade de forma explícita. Por que ainda tem gente tratando termos que centralizam os gêneros mulher e homem como fundamentais para o entendimento da heterodissidência, enquanto termos que mencionam a não-binaridade, mesmo que sejam abrangentes e/ou diretos, são vistos como nichados ou inúteis? Existem mais de duas identidades de gênero, e a grande maioria delas está sendo desconsiderada e desvalorizada em materiais supostamente inclusivos de qualquer forma de atração. Isso é exorsexismo.
Sente-se isolade em relacionamentos com pessoas binárias? Vá atrás de um grupo. É possível chamar pessoas em redes sociais ou grupos não-binários já existentes para participar de um grupo sobre ser diamórique/dórique/trízique. É possível perguntar sobre a existência de tais grupos. É possível levantar esse assunto dentro de grupos mais gerais para pessoas não-binárias.
Relatos são importantes. Tem algo a falar sobre experiências de atração por pessoas não-binárias? Você está se envolvendo com questões de atração e relacionamentos sendo uma pessoa não-binária? Você se assume como pessoa não-binária em espaços sáficos, aquileanos ou duáricos? Fale sobre suas experiências em um site ou blog, para que outras pessoas possam aprender sobre o assunto.
E, finalmente, não tenha medo de adotar termos adequados para determinada situação. Não há a necessidade de se abrir para todo mundo ou de adotar ativamente todos os termos que possam contemplar sua identidade, mas não faz sentido uma pessoa não-binária ter receio de se dizer viramórica em um espaço não-binário, ou não querer se afirmar como trízica ou dórica para não afastar pessoas binárias frágeis que podem se aterrorizar ao entrar em contato com algum termo que desconhecem. Sua identidade de gênero merece respeito, mesmo dentro (ou talvez especialmente dentro) de um relacionamento, e com isso podem vir particularidades como os termos que vão definir uma atração ou um relacionamento de forma mais precisa.
What Does Sapiosexual Mean? This Is Why The Term's Use Can Be Controversial
Over the past few years, one particular identifier has been gaining recognition and controversy: sapiosexuality. The term is in the spotlight again after French minister Marlène Schiappa recently stated that she is sapiosexual in an interview. So,…Niellah Arboine (Bustle)
#Trump reposted a fake video showing former President Barack #Obama being arrested in the Oval Office, as Trump admin officials continue to accuse Obama of trying to harm Trump’s campaign during the 2016 election, & Trump seeks to redirect conversation from the #JeffreyEpstein files.
Sensitive content
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"Pay us what you owe us!"
"When you sink it when you throw it."
Venus Williams wins a doubles match at Washington in her first tournament in more than a year
https://apnews.com/article/venus-williams-doubles-dc-open-washington-addb90d0695f5caf672261b634ca19ed?utm_source=flipboard&utm_medium=activitypub
Posted into Sports @sports-AssociatedPress
@baskin
Το χειρότερο είναι η προμήθεια από τράπεζα σε άλλη τράπεζα εγχώρια και οι δύο.
Η κλεψιά
Της Κλεψιας
Τη κλεψιά
Ω κλεψιά
Το μέγεθος της καταστροφής & οι φρικαλεότητες που διαπράττει ο πιο δειλός & ανήθικος στρατός με την υποστήριξη της Ευρώπης & της Αμερικής, θα φτάνει πάντα στον “ελεύθερο” κόσμο
"It clearly reflects a deliberate intention to silence the truth and obscure the suffering of an entire people enduring one of the worst health and humanitarian disasters."
middleeasteye.net/news/israeli…
Israeli special forces abduct director of hospital in Gaza
Israeli special forces have abducted Dr Marwan al-Hams, director of Abu Youssef al-Najjar Hospital and spokesperson for the Palestinian health ministry in Gaza, outside the International Committee of the Red Cross (ICRC) field hospital in the souther…Alex MacDonald (Middle East Eye)
"Powell may crash US economy" Top Economist Warns Trump - Prof Steve Keen
Tom Grzybow likes this.
Μλκ τι παίζει με την ζέστη??? , άραξα μόνη μου σ' ένα μπαράκι για ένα παγωμένο campari soda και στο πρώτο τσιγάρο συνειδητοποιώ ότι όλοι πλακώνονται!
Το πίνω στα γρήγορα και έφυγα για Βραδυνή αυτοκινητάδα παρέα με
962.gr/
#Interlaken #BernerOberland #Switzerland
yr.no/en/forecast/daily-table/…
> Psalms 36:5-8 📖
Your loving kindness, Yahweh, is in the heavens.
Your faithfulness reaches to the skies.
Your righteousness is like the mountains of God.
Your judgments are like a great deep.
Yahweh, you preserve man and animal.
How precious is your loving kindness, God!
The children of men take refuge under the shadow of your wings.
They shall be abundantly satisfied with the abundance of your house.
You will make them drink of the river of your pleasures.
Midwest Prison Censorship Update 2025: Exposing the IDOC Mail Scanning Scam
unsalted.noblogs.org/post/2025…
"Originally published on chicagoantireport.noblogs.org/… View the zine: Screen PDF – Printable PDF View the Prison Censorship Survey results Individual articles: “Stop Mail Scanning in Illinois” by
Microsoft only continues to exist because people are forced to use much of its software. If people had real choices, it would be no more.
It is by far the least competent of tech giants, and that's what makes it so dangerous.
aljazeera.com/economy/2025/7/2…
Microsoft cyberattack hits 100 organisations, security firms say
The Shadowserver Foundation and Eye Security would not disclose which firms were affected.Al Jazeera
Vaccine or therapeutic implications? (And fascinating just on its own.)
medicalxpress.com/news/2025-07…
Scientists capture HIV-1 viral cores entering the nucleus in unprecedented detail
In a recent landmark study, scientists have unveiled how HIV-1 penetrates the cell's nuclear barrier—a discovery that could reshape antiviral strategies.Diamond Light Source (Medical Xpress)
Ukraine Proxy-War: Trump Picks Up Where Biden Left Off
Despite promises to end foreign entanglements, the Trump administration has intensified the U.S. proxy war in Ukraine as part of a broader strategy toБрайан Берлетик (New Eastern Outlook)
Global hack on Microsoft Sharepoint hits U.S., state agencies, researchers say
Link: washingtonpost.com/technology/…
Discussion: news.ycombinator.com/item?id=4…
(5) Pétition contre la loi Duplomb : MACRON DOIT FAIRE REVOTER LE PARLEMENT - Pol Express
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“Desperate people are the most dangerous.” #podcast #politics #theteawithmyriamfrancois
Pentagon withdraws 700 Marines from Los Angeles
https://apnews.com/article/los-angeles-marines-immigration-protests-3119cb5c59f4a8d9a8937d90b9ae1224?utm_source=flipboard&utm_medium=activitypub
Posted into U.S. News @u-s-news-AssociatedPress
Some fat whore is recording herself working out at the gym...
Fucking end me dude
Jqfmt like gofmt, but for jq
Link: github.com/noperator/jqfmt
Discussion: news.ycombinator.com/item?id=4…
GitHub - noperator/jqfmt: like gofmt, but for jq
like gofmt, but for jq. Contribute to noperator/jqfmt development by creating an account on GitHub.GitHub
🔴🇧🇪🇮🇱La Belgique a arrêté 2 soldats israéliens, présents au festival Tomorrowland en #Belgique, accusés de crimes de guerre à #Gaza
« Ces plaintes concernent de graves violations du droit international humanitaire commises dans la bande de Gaza. »
La police belge a arrêté et interrogé 2 soldats israéliens lors du festival de musique Tomorrowland, suite à une plainte déposée par la Fondation #HindRajab et le GLAN. Les 2 hommes ont été libérés, mais une enquête criminelle est en cours.
« Pour la première fois en Europe, des suspects israéliens liés à des crimes à Gaza ont été formellement arrêtés et interrogés », ont déclaré les organisations. « Nous pensons que quelque chose d'important a commencé. »
Les 2 militaires israéliens appartiendraient à la brigade #Givati de l'armée israélienne et auraient été directement engagés dans des offensives ciblant délibérément des zones civiles, ainsi que dans des actes de torture et le déplacement forcé de la population à Gaza
leparisien.fr/faits-divers/deu…
Deux Israéliens entendus par la police belge pour soupçons de crimes de guerre à Gaza
Deux présumés soldats israéliens, qui étaient ce week-end en Belgique pour assister au festival de musique électro Tomorrowland, ont été entendus par la justice belge.Ronan Tésorière (Le Parisien)
jamais+37 phil likes this.
karnage
in reply to Robert R. • • •No.
She believes the vote itself is not relevant.
She DESERVES to be President.
Period.